Ao fazer o balanço do Carnaval de 2023, as prefeituras do Recife e de Olinda estimaram as presenças de 6,7 milhões de pessoas que teriam participado da festa nas duas cidades.
São números impactantes. Até porque, no domingo, os dirigentes do Galo da Madrugada haviam afirmado que o maior clube de carnaval do mundo havia levado às ruas do Recife, na manhã de sábado, não menos que 2,5 milhões de foliões.
Uma agremiação como o Galo da Madrugada afirmar que recebeu tanta gente no percurso de quatro quilômetros é uma coisa. Ela está apenas divulgando um dado promocional, embora possa ser questionada pelas leis da física, que dizem que dois corpos não podem ocupar o mesmo espaço.
Como ninguém vai propor contar ou apresentar uma justificativa plausível para tamanha especulação, o número fica naquele espaço das brincadeiras de Carnaval.
Outra coisa, completamente diferente, é um prefeito eleito e com contas a prestar ao cidadão, eleitor e carnavalesco. Precisa ter cuidado com o que fala para não ser levado ao ridículo pelo excesso de otimismo.
Animado com o que no passado chamávamos de “Eflúvios de Momo”, o prefeito de Olinda, Professor Lupércio, cravou a marca de 4 milhões de visitantes no Carnaval de sua cidade.
Considerando que, segundo o IBGE, a população de Olinda tem 350 mil residentes, sua excelência estima um contingente correspondente a 11 vezes e meia toda a população do município.
É gente demais e otimismo demais até porque, ainda segundo o IBGE, a área urbana total de Olinda tem 36 quilômetros quadrados. E porque o entorno do seu Sitio Histórico tem 7,8 quilômetros quadrados. Isso quer dizer que para receber tamanho contingente de foliões algumas leis da física teriam que ser revogadas. Lupércio que, originalmente, foi professor de matemática, certamente deve saber da aberração espacial que está divulgando.
Não menos descuidado é o prefeito do Recife, João Campos que estimou em 2,7 milhões o número de foliões nos 44 polos de animação. Quem circulou por Recife, especialmente nas tardes e noite no Marco Zero, pode constatar o sucesso do Carnaval de 2023. Mas para um engenheiro de formação, como João Campos, é preocupante que como gestor ( assim como Lupércio) assuma tal categórica informação.
Prefeitos de Recife e Olinda estão no papel de divulgar o sucesso de suas administrações na festa de Carnaval. Está incluído no valor de seus subsídios como gestores. Mas o bom senso recomenda que os dois tomem um pouco mais de cuidado com as informações que difundem, até porque a partir daí passam a ter fé de ofício.
Esse parece ser um comportamento bem pernambucano. Não há nas redes sociais nenhuma declaração dos prefeitos do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, e de São Paulo, Ricardo Nunes, afirmando quem suas cidades receberam tantos milhões de turistas e foliões.
Imagina se Paes se metesse a contar os números gerias de seus blocos, festas de rua, ou se Nunes se empenhasse a usar os mesmos critérios de Lupércio e Campos para estimar as multidões que a TV mostrou?
Entretanto, uma pesquisa rápida nos arquivos de TV permite se encontrar a origem da busca de tantos participantes no Carnaval. Ela começou com dois ícones do jornalismo do Nordeste: Francisco José (Recife) e José Raimundo (Salvador).
Na década de 80, Chico, com o Galo da Madrugada, e Raimundo, com os trios de Dodô e Osmar, começaram uma disputa pela maior multidão presente aos desfiles de sábado. Que em menos de uma década chegou a 2 milhões de foliões exibidos no Jornal Nacional.
Curiosamente essa é uma marca de Pernambuco.
O mesmo estado cujo prefeito Augusto Lucena cunhou a célebre frase “A maior Avenida em Linha reta da América do Sul” e a de que o rio Beberibe (que nasce e desemboca em Olinda) se junta com o Capibaribe para formar o oceano Atlântico.
Ou mais recentemente a frase do poeta Cícero Dias, autor da tela que originou a nossa praça do Marco Zero, cuja descrição é “Eu vi o mundo e ele começava no Recife".