Para os deputados e senadores o nome é incentivo fiscal. Para o governo é desoneração de impostos. Para os técnicos da Receita Federal o nome é Gastos Tributários.
Eles representarão, em 2023, exatamente R$ 456 bilhões correspondente a quase 20% de toda a arrecadação (19,76%) ou 4,29% do PIB estimado para o ano.
Ou seja, de cada R$ 5 que o governo arrecada, R$ 1 deixa de receber porque, no Congresso - ao longo do anos - foram aprovadas leis que, de alguma forma, se justificaram para que uma atividade econômica possa ser mais competitiva se pagasse menos impostos. Ao menos esse é o discurso que os parlamentares usaram.
E se entre a idéia, a proposta, a tramitação e a colocação no Orçamento Geral da União (OGU) leva tempo e muita articulação, a tentativa de redução ou eliminação desses benefícios mexe como dezenas de deputados e senadores. Até porqueessas desonerações se constituem argumentos de captação de votos nas suas bases e de colaborações de instituições e entidades.
Portanto, esse é o cenário que a equipe econômica do Governo Lula terá que trabalhar se quiser aumentar a arrecadação sem aumentar impostos. Sabendo que não vai ser fácil.
Um bom exemplo da dificuldade de o governo mudar a legislação e cortar benefícios foi o caso da desoneração concedida no Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse) responsável pela primeira derrota do Governo Lula, na Câmara Federal.
O Ministério da Fazenda queria o encurtamento do programa de desoneração prevista para acabar apenas em 2026 e que poderia segundo o ministro Fernando Haddad garantir uma arrecadação adicional de R$ 31,86 bilhões este ano e R$ 57,9 bilhões para 2024.
Os números do ministro parecem inflados já que para Receita Federal os gastos tributários em 2023 estão estimados em apenas R$ 4, 03 bilhões.
Aprovada depois de um acordo no Congresso a Lei nº 14.148, de 3 de maio de 2021, o beneficio fiscal reduz para 0% (zero por cento), pelo prazo de 60 (sessenta) meses, as alíquotas das contribuições PIS, COFINS e CSLL e do IRPJ das pessoas jurídicas pertencentes ao setor de eventos.
Aos deputados da base aliada o líder do bloco liderado pelo presidente da Câmara, Arthur Lira, o pernambucano Felipe Carreira (PSB) foi direto: “Esquece. Nosso acordo é para preservar a intenção do Congresso ao criar o Perse e manter o benefício por cinco anos, limitando o número de atividades aquelas realmente voltado ao turismo e eventos”. O projeto vai para o Senado com chances próximas de zero de não ser referendado.
O PERSE é apenas um caso. Hoje, segundo a Receita Federal, a União concede benefícios fiscais a 57 setores liderados pela isenção de tributos do Simples Nacional que custa R$ 88,53 bilhões ou quase 20% de todas renúncias fiscais do Brasil (19,41%).
O governo Lula não pensa em mexer nisso - pelo menos até agora - embora exista um debate que pede a ampliação dos tetos que uma empresa pode ser classificada no programa. Porque com o limite de faturamento de R$ 4,8 milhões por ano, centenas de empresários saem criando dezenas de empresas cujo faturamento não passa desse valor num fenômeno chamado de Síndrome de Peter Pan. Dobrar o teto de faturamento de uma empresa para a Receita Federal quer dizer perder arrecadação pois hoje ela está dentro da chamada tributação normal.
Outro ponto que o Governo Lula sequer pensa em mudar são as isenções da Zona Franca de Manaus e Áreas de Livre Comércio para quem a União abre mão de R$ 55,26 bilhões em impostos.
O lobby da dos deputados não se restringem apenas os eleitos pelo Amazonas. Na verdade, os deputados de São Paulo Minas Gerais e Rio Grande do Sul - onde estão as sedes das empresas internacionais que gozam do beneficio no Amazonas –atuam muitos mais para manter esses benefícios que os da bancada votada em Manaus.
O ministro Fernando Haddad tem uma atenção especial no que a Receita Federal chama de “Rendimentos Isentos e Não Tributáveis – Imposto de Renda da Pessoa Física”, estimados em R$ 45,26 bilhões em 2023.
Dentro desse pacote estão, por exemplo, as isenções sobre os lucros e dividendos de quem tem empresas que pagam Imposto de Renda assim como os rendimentos dos juros sobre capital próprio que é um ganho pelo fato de a empresa usar o dinheiro do acionista para pagar despesas sem precisar ir aos bancos e pagar as taxas de mercado.
Ontem, num debate no Senado, Fernando Haddad voltou a dizer que “A maneira que nós escolhemos de fazer o ajuste foi abrindo a caixa preta das renúncias fiscais” e criar condições a investidores estrangeiros e brasileiros acreditarem na economia do País.
Pode ser. Ano passado, o então ministro da Economia, Paulo Guedes tentou uma cartada arrojada ao falar de limitar os gastos tributários com as despesas médicas pagos pelo contribuinte que, em 2023, serão de R$ 24,50 bilhões. O projeto sequer foi apresentado devido as advertências dos deputados de que ele seria derrotado por unanimidade.
Curiosamente, tem desonerações bem discutíveis. A poderosa indústria automotiva deixa de pagar R$ quase R$ 10 bilhões (R$ 9,98 bilhões) ao Fisco. Mais até que a tributação da Folha de Salários (R$9,35 bilhões) que o Congresso deseja ampliar ainda este ano.
Pouca gente sabe, mas o Governo abre mão de R$ 2 bilhões para os clubes de futebol. Ou R$ 308 milhões as empresas exploradoras de água mineral. Ou de R$ 134 milhões para a produção de biodiesel que hoje está nas mãos de grandes processadoras.
Isso se nos falar R$ 5,75 bilhões de benefícios fiscais dados ao setor de embarcações e aeronaves que tinha o foco para aviões comerciais e navios, mas que permite que aviões executivos e lanchas e iates possam deixar de pagar impostos.