Ficou pronto a edição 2023 do Anuário de Mercados Ilícitos Transnacionais, estudo produzido pelo Observatório de Mercados Ilícitos da Federação das Indústrias de São Paulo - Fiesp que desde 2016 classifica informações sobre o assunto e que hoje é considerado uma das referências, nacional e internacional, sobre a evolução e os impactos da atividade criminal sobre o setor produtivo no Brasil.
Este ano o estudo deu um atenção sobre as chamadas redes criminais com um tipo de organização “horizontal”, baseadas em conexões não hierárquicas entre quadrilhas ou indivíduos especialistas em uma atividade criminal, em que a liderança hierárquica é substituída pelo network e empreendedorismo criminal de roubadores, contrabandistas, agentes públicos corruptos.
O trabalho monitorou a evolução de nove mercados ilícitos que afetam os setores da indústria de São Paulo, entre eles: tabaco, eletrônicos, vestuário, químicos, automotivo, alimentos, higiene, brinquedos e medicamentos, que funcionam como uma aproximação de todos os mercados ilícitos transnacionais que operam naquele estado.
Empregos formais
Segundo o estudo, em 2022 a estimativa é de que nos nove mercados ilícitos da indústria apenas em São Paulo paulista essas atividades movimentaram em torno de R$23,36 bilhões no estado.
Isso quer dizer que apenas em São Paulo deixaram de ser gerados 169.624 empregos formais por mês, tendo como consequência o não recolhimento de R$5,77 bilhões em impostos federais.
Num exercício de perspectiva a Fiesp estima que com esse dinheiro seria suficiente se comprar o Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras, que é considerado a principal solução do Governo Federal para a segurança das fronteiras, através do Exército Brasileiro.
Ah, ao menos R$5,76 bilhões em salários deixaram de ser gerados no período. O relatório diz que dentre os mercados atingidos pelo problema da contrafação e descaminho, o setor vestuário é o mais atingido. Primeiro pela própria centralidade de São Paulo nessa cadeia produtiva, mas pelo espalhamento de prejuízos que isso provoca a nível nacional.
Iilícitos transnacionais
Mas o texto do Anuário de Mercados Ilícitos Transnacionais chama atenção para uma coisa bem interessante: As organizações criminosas que operam neste mercado estão cada vez mais sofisticadas, terceirizando e segmentando as linhas de produção, com a qual gera alta lucratividade, advinda da falsificação de grifes, atuando como fábricas ilegais.
Trata-se de um mercado transnacional vasto e dinâmico, no qual a China e o Paraguai destacam-se como principais fornecedores externos dos operadores ilícitos de todos os tipos.
No caso do setor de vestuário isso está relacionado a peças de roupa íntima, roupas profissionais e casuais (camisas, camisetas, bermudas, calças, meias, jalecos, vestidos, saias, etc.), e acessórios (bolsas, bolsas esportivas, chapéus, carteiras, bonés, etc.). E é claro há as imitações de marcas consagradas.
Apenas nesse segmento deixaram de ser gerados em renda para os trabalhadores pelo mercado ilícito de vestuário com a perda de 491.589 empregos perdidos. O trabalho estima que, no ano passado, apenas o mercado ilícito de vestuário operou negócios de R$1,9 bilhão, dinheiro suficiente para bancar a construção de 256 hospitais.
Debate na sede da Fiesp
O encontro foi realizado na sede da Fiesp, que é presidida pelo empresário Josué Alencar, que foi contratado pela asiática Shein para ser seu primeiro parceiro na área de fabricação de produtos da marca no Brasil.
O evento contou a presença de representantes de diversas entidades estiveram presentes entre elas o CEO e presidente honorário do Conselho de Administração da Associação Brasileira da Indústrias Têxtil (Abit) que representa um dos mais importantes da indústria nacional, Fernando Pimentel que vem sendo a voz do setor na busca de soluções para a questão da tributação das plataformas.
Ele revelou que a estimativa entre 14 setores mais afetados houve uma perda de 280 bilhões em faturamento provocando uma perda entre perdas setoriais e sonegação de R$410 bilhões, o que seria algo próximo a 2% do PIB.
No caso do setor de vestuário as perdas foram de R$84 bilhões, bem maiores que as perdas com bebidas alcoólicas (72,2 bilhões) combustíveis (R$28 bilhões) justificadas pelo tamanho e extensão da cadeia produtiva do setor têxtil.
Crise sem dados do governo
Ele listou entre outros problemas especialmente no comércio eletrônico os produtos ilegais (piratas e até roupas usadas) o não pagamento do Imposto de Importação e de ICMS, além de não cumprimento de recursos técnicos (regras da ABNT) e revelou uma enorme falta de dados estatísticos públicos sobre a questão.
Como as plataformas estão em São Paulo, os números da Elisão fiscal servem para balizar a questão a nível nacional sobre a questão do comércio eletrônico (cross border) relacionado com a questão das remessas internacionais que cresceram entre 2018 de 70, 4 milhões para 176,2 milhões ano passado chegando a 1 milhão de remessas por dia.
Ele mostrou que antes da instituição do programa Remessa Conforme as empresas de comércio eletrônico declararam 2% das declarações de importação. Ano passado esse número subiu para 30% devendo chegar a 100% em 2023.
Pimentel reconhece que a posição da indústria em combater o crescimento da ação das plataformas é difícil, pois o consumidor não aceita que os preços das mercadorias que compra sejam taxados, o que provocaria aumento dos preços.
Consumidor nas rede sociais
Essa é uma batalha que podemos ver a forte reação nas redes sociais. O consumidor não está preocupado com o emprego ou o recolhimento de impostos, ele deseja pagar menos por aquela mercadoria que vai usar, reconhece.
Segundo Pimentel, a Abit reconhece a importância da adesão das plataformas ao Remessa conforme como positiva, mas critica a revogação da portaria 612 do ministério da Fazenda que baixou para zero as importações de produtos com valor declarado de até US$50.
E reconheceu que essa não é uma questão que envolve apenas o Brasil, lembrando que as autoridades dos Estados Unidos e da União Européia estão analisando esse fenômeno que essencialmente provoca perdas aos países. Nos Estados Unidos a nova legislação obriga que as plataformas verifiquem a situação de vendedores de grande quantidade de produtos enquanto na União Europeia que agora exige a declaração formal da alfândega para produtos acima de 22 euros.
Menor custo na Importação
Enquanto o governo não consegue definir uma nova abordagem sobre a evasão de receitas, a adesão das plataformas asiáticas ao Remessa Conforme revela a condição que o governo deu é muito melhor que o não recolhimento de imposto de importação.
Com os maiores terminais alfandegados da Receita Federal estão em Curitiba, no Paraná a adesão ao programa não precisa mais sair do Porto de Santos, ir para Curitiba de onde eram distribuídos pelos Correios. Já que por meio do Remessa Conforme, as mercadorias que antes eram levadas de Guarulhos para o para Curitiba agora vão para o Centro Internacional dos Correios (Ceint), na capital paulista.
Na matriz de custos da empresa, ao evitar esse passeio até o Paraná, a empresa pode deduzir o custo do frete do preço da mercadoria diminuindo ainda mais o impacto da cobrança de ICMS de 17%.