POR ROBERTA SOARES, DA COLUNA MOBILIDADE
A Polícia Federal é quem investiga. Mas será a sociedade quem pagará a conta dos equívocos, erros e possíveis desvios financeiros das obras de restauração do chamado contorno urbano que a BR-101 faz na Região Metropolitana do Recife. São 30 quilômetros, entre Abreu e Lima e Jaboatão dos Guararapes, essenciais para o Grande Recife, que de tão importantes se transformaram praticamente em via urbana das cidades cortadas por eles. A segunda fase da investigação, que mais uma vez ganhou um desses nomes fantásticos que os federais gostam de dar, só confirma o que muitos já vinham alertando: que o projeto da restauração foi, é e será um equívoco. Em poucos anos, essa conta que continua sendo investigada pela PF, chegará em dobro para motoristas e passageiros que dependem do corredor - um dos mais importantes eixos do transporte público metropolitano. Embasado no que dizem técnicos, veremos o pavimento se acabar e a degradação - que tanto transtorno, ferimentos e até vidas tirou - retornar.
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Adiada por pelo menos duas décadas, a restauração do contorno urbano da BR-101 começou estranha, ainda na época em que, sob o argumento de economia, o governo federal, descartou a troca do pavimento por concreto. Optou pelo asfalto. Isso tem mais de dez anos. Alertas foram feitos na época e de nada adiantou. Há três anos, quando as obras começaram de fato, depois de muitas idas e vindas, novos alertas aconteceram - dessa vez ainda mais fortes e embasados. Foram ignorados novamente. Vale lembrar para quem não recorda ou não sabe, que as escolhas técnicas equivocadas dos órgãos envolvidos no processo - propositais ou não - foram o princípio da investigação da PF. Todas, inclusive, denunciadas por entidades de engenharia e a academia desde 2017.
Na época, os técnicos já diziam que, em dez anos, talvez até menos, os pernambucanos estarão trafegando em uma rodovia repleta de problemas e os R$ 192 milhões destinados à obra terão sido desperdiçados. A denúncia, inclusive, também foi validada pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE) e o Tribunal de Contas da União (TCU), que fizeram dois alertas ao governo de Pernambuco, responsável, via Departamento de Estradas de Rodagem (DER-PE) pela execução e supervisão das obras. Mas tudo começou com as denúncias bem embasadas da Associação Brasileira de Engenheiros Civis em Pernambuco (Abenc-PE), da Associação dos Engenheiros de Segurança do Trabalho de Pernambuco (Aespe) e do Sindicato dos Engenheiros de Pernambuco (Senge).
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O pavimento sempre foi o grande alvo dos alertas. Os engenheiros, assim como aconteceu com os professores da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), defendiam que o concreto ou pavimento rígido era a melhor opção para a BR-101. Alegaram que para trocar as 20 mil placas de concreto que compõem o contorno da rodovia, seriam gastos - tendo como base a tabela de preços paga pela Emlurb - R$ 100 milhões. “Ou seja, seria viável recompor o pavimento da forma certa. O modelo que o Dnit escolheu e que o governo de Pernambuco validou não é certo. Deveriam usar a mesma técnica de concretagem utilizada para fazer quase 400 quilômetros da BR-101 Nordeste, inclusive em Pernambuco”, afirmou, na época, Stênio Cuentro, presidente da Abenc-PE.
Uma explicação simples sobre o pavimento, dada na época, era que a técnica adotada na obra se assemelha a uma obturação mal feita de um dente. “Eles quebraram e trituram as placas que estão danificadas e já repletas de asfalto jogado sobre elas por anos. Abriram um buraco na base e o preencheram com o que chamamos de concreto pobre (CCR). Em seguida, colocaram asfalto sobre ele. Isso não vai funcionar. O pavimento flexível tem vida útil limitada porque sofre com os efeitos do clima e do excesso de peso”, explicou Cuentro. O modelo de contratação escolhido (Regime Diferenciado de Contratação Integral RDCI) não foi o adequado, como também alertaram os tribunais e a PF constatou ainda na primeira fase da investigação, em novembro de 2019. Ou seja, a conta está cada vez mais perto.
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