POR ROBERTA SOARES, DA COLUNA MOBILIDADE
Embora as primeiras investigações administrativas sobre a colisão entre dois trens do Metrô do Recife - realizada internamente pela Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) no Recife e divulgadas na quarta-feira (6/5) pela TV Globo como sendo oficial - tenham apontado falha humana de uma maquinista, metroviários argumentam que a principal causa do acidente são as falhas do sistema de sinalização do sistema metroferroviário, que sofre um processo de sucateamento e descomando histórico. E que essa informação não foi considerada intencionalmente no relatório. Não que a maquinista esteja isenta de responsabilidade, mas ela teria sido levada ao erro devido aos problemas técnicos que, mais uma vez, estariam sendo abafados para não comprometer ainda mais a imagem de degradação do sistema, que vive à míngua de recursos e ignorado pelo orçamento federal. Ou seja, antes da falha humana, teria havido a falha técnica.
Para quem não recorda, o acidente entre os dois trens do Metrô do Recife aconteceu no dia 18 de fevereiro de 2020, na Estação Ipiranga, na Linha Centro, a maior e mais movimentada da rede, responsável por transportar 250 mil dos 400 mil passageiros diários do serviço metropolitano. Setenta pessoas, em média, saíram feridas na colisão e, por muita sorte, não houve mortes. Foi o primeiro acidente do tipo nos 35 anos de operação do metrô. Antes mesmo da conclusão do relatório já se especulava que a investigação culparia apenas a maquinista. Segundo metroviários, tendo à frente o sindicato da categoria - que por medo de possíveis represálias é o único que pode se posicionar publicamente -, há duas informações que precisam ser consideradas e que, pelo menos aparentemente, não foram levadas em conta pela equipe que fez a investigação interna sobre o acidente.
Nunca antes na história do Metrô do Recife
DENÚNCIA DE PROBLEMAS NO SISTEMA FEITA POR MAQUINISTAS
No documento, inclusive, são citados alguns episódios ocorridos recentemente e provocados por "falsas" informações. Situações em que o controlador (CCO) autorizou o maquinista a seguir velocidade restrita e havia um trem alinhado na plataforma que não foi visto pelo Centro de Controle. “São problemas resultantes da ausência de investimento no sistema. O Metrô do Recife vive nessas condições e não é de hoje. É muito fácil apenas responsabilizar a maquinista, como se houve todas as condições corretas - não falo nem de ideais - para um sistema metroviário operar. O passageiro do metrô sabe do que eu estou falando. Dos longos intervalos, atrasos e lentidões verificadas em muitos trechos do sistema. Isso é resultante das falhas no sistema de sinalização”, alerta o presidente do Sindicato dos Metroviários de Pernambuco (SindMetro), Adalberto Ferreira. No relatório divulgado pela TV Globo é dito que a investigação constatou que o sistema de sinalização estava funcionando normalmente.
PRESENÇA DE PESSOAS NA CABINE DO METRÔ
Outra informação da investigação que está sendo questionada é o fato de haver uma segunda pessoa na cabine do metrô, ao lado da maquinista, o que seria proibido. A maquinista pode, sim, ter se distraído com outro maquinista que estava no ambiente, mas é falsa a informação de que é proibido. Segundo o Procedimento de Operação Padrão (POP), número 073, de setembro de 2017 - o último a vigorar -, o acesso à cabine é restrito a alguns profissionais do sistema, entre eles o superintendente, gerentes, coordenadores e supervisores da operação, além de "empregados operativos do movimento durante o horário de trabalho e no percurso do trabalho (indo ou vindo)". Ou seja, maquinistas como a profissional que acompanhava a condutora no trem que colidiu com o que estava parado na Estação Ipiranga. “Por tudo isso vamos questionar oficialmente esse relatório. Aliás, ele nem deveria ter sido divulgado porque a maquinista envolvida sequer foi ouvida”, argumenta o presidente do SindMetro.
DOCUMENTOS QUE REGEM O ACESSO À CABINE DO METRÔ
COMO O ACIDENTE TERIA ACONTECIDO
O resultado oficial da investigação interna da CBTU está para ser divulgado na segunda-feira (11/5), segundo informações do novo superintendente do Metrô do Recife, Carlos Fernando Ferreira. No entanto, a TV Globo teria tido acesso ao relatório. “Nem eu mesmo ainda tive acesso ao relatório, Por isso, não posso reconhecer as informações repassadas na reportagem”, afirmou. A investigação deverá resultar na abertura de um inquérito administrativo.
No documento de 22 páginas, segundo a emissora, é concluído que o erro teria sido apenas humano - da maquinista -, quando um trem bateu na traseira de outro que estava parado na Estação Ipiranga. A base da investigação são imagens das câmeras de segurança das estações e dos trens, além dos registros dos sistemas automáticos que controlam o metrô. A maquinista não foi ouvida nessa fase.
O documento apontaria que o trem 27 saiu da Estação Mangueira às 5h27, em direção à Estação Ipiranga. Assim que chegou à plataforma ficou parado porque havia um aviso no sistema de que outro trem estaria parado logo à frente. Às 5h32, o trem 30 - conduzido pela maquinista - saiu da Estação Mangueira em direção à Ipiranga. Como o trem 27 estava parado na plataforma, o sistema automático do metrô indicou que a maquinista deveria reduzir a velocidade para até 17 km/h, mas a condutora não teria obedecido - por estar distraída com uma outra maquinista que viajava na cabine ao seu lado.
A maquinista, então, teria mudado a chave de velocidade do trem para uma posição que permite que ele ande em até 40 km/h. E, segundo o laudo, teria feito a mudança sem comunicar ao CCO. A investigação aponta, ainda, que a maquinista demorou a apertar o freio de emergência, embora tivesse visibilidade para ver o segundo trem parado na estação. O freio só teria sido acionado quatro segundo antes do acidente, a uma distância de 34 metros da Estação Ipiranga.
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