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UBER E 99 MOTO: as lições que o Brasil precisa aprender com a reação de SÃO PAULO e RIO DE JANEIRO ao serviço

A Uber chegou a lançar o serviço de Uber Moto no Rio de Janeiro e em São Paulo em janeiro de 2023, gerando de imediato reação dos prefeitos, que avisaram: "Não vamos permitir e iremos brigar judicialmente contra o serviço"

Roberta Soares
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Roberta Soares
Publicado em 01/02/2023 às 13:11 | Atualizado em 01/02/2023 às 16:41
GUGA MATOS/JC IMAGEM
Recife e muitas outras cidades assistem ao avanço do serviço sem esboçar reações. A capital pernambucana diz estar de mãos atadas devido à uma ação judicial que beneficiou o serviço de carro da 99 - FOTO: GUGA MATOS/JC IMAGEM

As reações que as Prefeituras de São Paulo e Rio de Janeiro - as duas maiores capitais brasileiras - tiveram à tentativa de implantação do Uber Moto e do 99 Moto, o serviço de transporte de passageiros por motocicletas que virou febre nas cidades, principalmente do Nordeste, devem servir de exemplo para todas as gestões públicas do País.

Na visão de especialistas ouvidos pela Coluna Mobilidade, principalmente da área de saúde, o ataque lançado pelos prefeitos Ricardo Nunes, de São Paulo, e Eduardo Paes, do Rio de Janeiro, com certeza embasados por suas equipes de mobilidade urbana e saúde, será algo que a população de suas cidades irá agradecer no futuro, quando não ver o número de feridos e mortos por motocicletas aumentar - principalmente de passageiros, que em sua maioria são pessoas que não têm habilidade para estar na garupa de uma moto.

A Uber chegou a lançar o serviço de Uber Moto no Rio de Janeiro e em São Paulo em janeiro de 2023, gerando de imediato reação dos prefeitos, que avisaram: “Não vamos permitir e iremos brigar judicialmente contra o serviço”. Nesta segunda-feira (30/01), a Uber suspendeu o serviço de carona por motocicleta em São Paulo, alegando estar em comum acordo com a prefeitura.

O recuo da Uber aconteceu um dia antes da data prevista para o lançamento do mesmo serviço oferecido pela 99. No dia 27/01, a plataforma anunciou que o 99 Moto chegaria à Grande São Paulo e ao Rio de Janeiro com início previsto para o dia 31 de janeiro. A decisão da Uber em relação a São Paulo, no entanto, não foi a mesma para o Rio de Janeiro, que segundo a plataforma segue com o serviço funcionando, embora tenha sofrido a mesma resistência por parte do poder público local.

Atualmente, o Uber Moto é oferecido pelo aplicativo Uber em 170 cidades no Brasil. Já o 99 Moto funciona em mais de 3 mil municípios e é utilizado por 1,3 milhão de pessoas, de acordo com a 99. A plataforma também suspendeu o início do serviço em São Paulo, mas manteve no Rio de Janeiro.

RISCOS DO SERVIÇO DE UBER E 99 MOTO

Alysson Coimbra, diretor científico da Associação Mineira de Medicina do Tráfego (Ammetra), lembra que os sinistros de trânsito (não é mais acidente de trânsito que se diz. Entenda a razão) envolvendo motocicletas matam, por quilômetro rodado, 16 vezes mais do que os outros modais. Por isso o uso de motos para transportar passageiros é tão perigoso.

FOTOS: BRUNO CAMPOS/JC IMAGEM
Atualmente, o Uber Moto é oferecido pelo aplicativo Uber em 170 cidades no Brasil. Já o 99 Moto funciona em mais de 3 mil municípios e é utilizado por 1,3 milhão de pessoas, de acordo com a 99 - FOTOS: BRUNO CAMPOS/JC IMAGEM

“Historicamente, mais de 70% das indenizações por invalidez permanente do DPVAT foram pagas a motociclistas, o que dá a dimensão do problema para o Brasil. O desemprego e o empobrecimento da população estão levando os brasileiros a se arriscarem sob duas rodas para garantir uma renda mínima ou para economizar nos deslocamentos e o resultado disso pode ser desastroso”, explica Coimbra.
“Não podemos prestigiar um transporte que, sob a justificativa de menor custo, coloca em risco usuários e coletividade, além do aumento dos gastos em atendimentos hospitalares para acidentados, que será cobrado de toda a população através de impostos”, segue.

REGULAMENTAÇÃO DO UBER E 99 MOTO É O MÍNIMO

Menos radical, o engenheiro Sérgio Ejzenberg, mestre em Engenharia de Transportes pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP), afirmou ao Uol que a decisão da Uber de não ofertar mais o Moto Uber é "sensata e responsável" e que a empresa pode ajudar, ao lado da Prefeitura de São Paulo, na regulamentação do serviço de transporte de passageiros por motos.

CONFIRA a série sobre o Uber e 99 Moto:

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"O mototáxi já funciona nas periferias de um modo selvagem. Já que não se pode proibir, é necessário regulamentar. É necessário que a Uber se junte com o poder público para fazer uma regulamentação para maximizar a segurança de um tipo de transporte que é intrinsecamente perigoso", afirmou ao Uol.

O médico do tráfego faz mais pontuações sobre a regulamentação: ”O já complicado trânsito brasileiro vem sofrendo a cada dia com o aumento do número de veículos e a falta de políticas de mobilidade urbana, e nessa briga por espaços com os demais veículos, a motocicleta é sempre a mais vulnerável. Precisamos de maior clareza, informações, regras, contrapartidas e adequações antes da permissão de livre funcionamento desse serviço”, resume Coimbra.

RECIFE DIZ ESTAR DE MÃOS ATADAS

O Recife, assim como Belo Horizonte, são capitais onde o transporte de passageiros via aplicativo e por motos segue irregular, sem que as prefeituras façam nada. Nenhuma reação sequer semelhante a dos prefeitos de São Paulo e Rio de Janeiro foi esboçada.

Na capital pernambucana, o Uber Moto e o 99 Moto operam sem qualquer obstáculo há pelo menos dois anos. Em abril de 2021, a Prefeitura do Recife, via Autarquia de Trânsito e Transporte Urbano (CTTU), foi enfática em afirmar à Coluna Mobilidade que o Uber Moto, serviço de transporte remunerado de passageiros por aplicativo operado com motocicletas, seria ilegal na cidade.

Passível, inclusive, de autuação pela prática de transporte irregular (clandestino), que tem multa atualmente no valor de quase R$ 4 mil - implantada ainda na época da retirada das antigas Kombis que faziam lotação na cidade.

A Prefeitura do Recife via o Uber Moto como uma espécie de mototáxi. O argumento era de que o serviço não poderia operar porque o transporte remunerado individual privado de passageiros é vetado às motocicletas na capital pernambucana. Mesmo sendo por aplicativo.

GUGA MATOS/JC IMAGEM
Na visão de especialistas ouvidos pela Coluna Mobilidade, principalmente da área de saúde, o ataque lançado pelos prefeitos Ricardo Nunes, de São Paulo, e Eduardo Paes, do Rio de Janeiro, com certeza embasados por suas equipes de mobilidade urbana, será algo que a população de suas cidades irá agradecer no futuro - GUGA MATOS/JC IMAGEM

Agora, explica que está de mãos atadas por uma decisão da Justiça de Pernambuco que beneficiou o serviço de carros da empresa 99 ainda para o Carnaval de 2020.

“A CTTU informa que aguarda decisão da Justiça a respeito da constitucionalidade da Lei Municipal 18.828/2018. Enquanto o processo tramita, o poder público segue impedido de fiscalizar os transportes por aplicativo. A CTTU já apresentou recurso e aguarda o julgamento”.

O que diz a Uber

A Uber, como esperado, questiona a ilegalidade do serviço - alegada em muitas cidades - e diz que o País precisa lidar com a coexistência de novas opções de mobilidade. Sobre os critérios de segurança exigidos para os motociclistas parceiros, questionados pela reportagem, não se posicionou ainda. Confira:

“A Uber segue a Lei Federal 13.640/2018, que regulamentou a atividade de aplicativos de tecnologia e dos motoristas parceiros que fazem o transporte individual privado de passageiros. Regras em desacordo com a legislação esbarram na decisão do Supremo Tribunal Federal, que tem repercussão geral e que estabeleceu limites aos municípios que optarem por criar regulamentações para a atividade.

Prefeituras não podem impor requisitos que excedam os limites da legislação federal, como proibir a atividade. A Uber cumpre a Lei, defende a coexistência de novas opções de mobilidade trazidas pela tecnologia para o benefício de todos e segue à total disposição da prefeitura para debater, dialogar e contribuir para a construção de um eventual marco regulatório para essa modalidade.

De modo geral, regulamentações municipais modernas favorecem ambientes de inovação e garantem aos cidadãos o direito de escolha sobre como se movimentar ou como gerar renda. A Uber está disposta a cumprir os itens da Lei Federal que regulamenta o transporte remunerado privado individual de passageiros”.

Veja o posicionamento oficial da 99:

“A 99, em contato com a prefeitura, na segunda-feira (30/01), informou sua decisão de não ativação do serviço do 99 Moto na cidade de São Paulo neste momento. A empresa segue comprometida em contribuir com o grupo de trabalho do município para garantir ainda mais segurança através de tecnologia e parcerias com o poder público – além de continuar oferecendo opções acessíveis de locomoção e oportunidade de ganhos para cada vez mais pessoas.

A 99 reafirma que a modalidade de transporte individual privado por motocicletas e sua intermediação por aplicativos são atividades legais, de acordo com a Política Nacional de Mobilidade Urbana. E que os limites da regulamentação do transporte de passageiros são definidos exclusivamente na esfera federal. A 99 reforça que atenderá ao pedido da Prefeitura por mais dados para que possa demonstrar a importância do serviço para a população, especialmente nas periferias da cidade”.

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