Desafios do Recife: maior participação na gestão e ampliação das Faixas Azuis para os ônibus são desafios do transporte público
Corredores exclusivos de ônibus não avançam no Recife e prefeitura ainda não se envolve como deveria no Consórcio de Transporte da RMR
Os desafios do transporte público coletivo no Recife são muitos para o futuro prefeito da cidade. Mas dois pontos merecem destaque pela urgência: uma efetiva participação da gestão municipal no Consórcio Grande Recife de Transporte Metropolitano, do qual o Recife faz parte, e a ampliação das Faixas Azuis, que dão prioridade viária aos ônibus no trânsito da cidade.
No caso da ampliação das Faixas Azuis, já são três anos sem que o Recife anuncie novas faixas exclusivas na cidade. Símbolo da gestão focada no transporte público coletivo do PSB, as faixas exclusivas deixaram de ser implantadas nos corredores da cidade, apesar do impacto positivo dos equipamentos para a operação dos ônibus.
Por isso, o novo prefeito da capital terá que atuar nessa área. As faixas promovem ganhos de velocidade superiores a 100% em alguns dos 11 corredores implantados desde 2013. E sem falar que a adoção das Faixas Azuis, modelo copiado do Sistema BRS (Bus Rapid Service) do Rio de Janeiro, virou símbolo recifense da mobilidade urbana sustentável. Da prioridade viária do transporte coletivo sobre o individual.
ENTENDA AS FAIXAS AZUIS DE ÔNIBUS
Para quem não lembra mais, as Faixas Azuis são faixas onde os ônibus têm prioridade de circulação. Funcionam apenas durante os dias úteis e, diferentemente dos corredores exclusivos (implantados junto ao canteiro central das avenidas), podem ser utilizadas pontualmente pelos veículos particulares para acessar ruas e imóveis.
O Recife avançou muito e até provocou outras cidades da Região Metropolitana a adotar o modelo, como Jaboatão dos Guararapes e, agora, Olinda (previsto no Programa Novo Caminho, que está em execução na cidade), mas parou no tempo. Desde 2021, com a criação da Faixa Azul da Avenida Agamenon Magalhães, na área central da cidade (esperada por mais de três anos), e da Faixa Azul da Avenida Visconde de Jequitinhonha, em Boa Viagem, na Zona Sul, nada mais foi feito.
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E, ao contrário, os equipamentos não têm recebido, sequer, a manutenção da sinalização horizontal que a define.
Quem usa o transporte público lamenta a paralisação do projeto e destaca os ganhos no dia a dia. “Espero, de coração, que o novo prefeito amplie esse projeto porque ele é muito bom para o passageiro. Ganhamos muito tempo no deslocamento diário, faz toda a diferença quando o ônibus pode trafegar com prioridade”, diz o universitário Carlos Eduardo Silva, que todos os dias usa o ônibus para ir e voltar da UFPE, na Zona Oeste da cidade.
E quem, mesmo sem ser passageiro dos ônibus, é beneficiado pelas faixas exclusivas também reclama. É o caso dos taxistas, por exemplo, que têm permissão para circular com passageiros nas Faixas Azuis.
“O Recife parou no tempo, de fato. Houve um avanço na implantação das Faixas Azuis, mas nunca mais vimos a ampliação do equipamento. Ao contrário, tudo só piora. Poucas faixas exclusivas têm câmeras de fiscalização, o que estimula a invasão por motoristas. Além disso, a pintura está velha, apagada. Por isso, todos invadem”, critica o presidente da Associação dos Taxistas Permissionários e Auxiliares do Estado de Pernambuco (ATPAPE), Lúcio Mauro.
Das 11 Faixas Azuis existentes, apenas cinco têm câmeras de fiscalização. E, mesmo assim, desde o fim de 2023 o Recife está com a fiscalização eletrônica desativada em toda a cidade. O desrespeito às faixas exclusivas e corredores de transporte segue em alta.
Dados do Detran-PE mostram que as invasões das Faixas Azuis lideraram as infrações em maio deste ano - 9.794 registros -, superando até mesmo o excesso de velocidade (superior à máxima em até 20%, com 8.158 registros), o estacionamento proibido (5.905 registros), e o avanço de semáforo vermelho (2.535 notificações).
AS FAIXAS AZUIS DO RECIFE
A capital possui, atualmente, 11 equipamentos em toda a cidade, implantados entre 2013 e 2021, que totalizam 51 quilômetros de extensão. Somados aos 20 quilômetros já existentes, o Recife conta atualmente com 71 quilômetros de prioridade viária aos ônibus.
Em junho de 2020, depois de três anos de promessas e um intervalo de dois anos e meio desde a última implantação, a Avenida Agamenon Magalhães, primeira perimetral do Recife e eixo de conexão com a área central da cidade, ganhou uma Faixa Azul de quatro quilômetros de extensão (dois de cada lado). Um ano depois, o equipamento foi ampliado em 3,2 quilômetros, chegando próximo ao limite com Olinda.
Em setembro de 2021, a última Faixa Azul do Recife foi implantada na Avenida Visconde de Jequitinhonha, em Boa Viagem, na Zona Sul do Recife. A região já conta com três corredores com exclusividade ao transporte coletivo: Avenidas Domingos Ferreira, Conselheiro Aguiar, Herculano Bandeira e Mascarenhas de Moraes - o primeiro equipamento da cidade.
GANHOS DAS FAIXAS AZUIS SÃO ENORMES PARA O TRANSPORTE PÚBLICO
São muitas as vantagens da priorização viária para o transporte coletivo. Há Faixas Azuis, como a da Avenida Domingos Ferreira, que tem conexão com a da Avenida Antônio de Góes, nos bairros do Pina e de Boa Viagem, na Zona Sul da cidade, que tiveram ganhos de 118% na velocidade dos coletivos.
Os dados são de antes da pandemia. Até mesmo os trechos mais pequenos do equipamento – há faixas com apenas 580 metros, como a da Antônio de Góes, ou com 1,5 quilômetro como as da Rua Cosme Viana, em Afogados, e Real da Torre, na Torre e Madalena – têm resultados positivos que alcançaram de 20% a 30% de aumento de velocidade. E, quanto mais rápido o ônibus anda, mais ágil é a viagem.
Dados da Prefeitura do Recife, divulgados em 2021, mostravam que o equipamento da Agamenon Magalhães, por exemplo, proporcionou um ganho de 53,7% na velocidade média dos coletivos no trecho entre o Terminal Integrado Joana Bezerra e a Universidade de Pernambuco (UPE), em Santo Amaro.
No sentido contrário, o ganho era de 25,4%. São 69 linhas circulando na avenida, operadas por 600 coletivos e transportando 250 mil passageiros diariamente.
RECIFE PRECISA PARTICIPAR EFETIVAMENTE DA GESTÃO DO TRANSPORTE PÚBLICO
Outro desafio do futuro prefeito do Recife, apontado por especialistas do setor de transporte público, é assumir, efetivamente, a participação na gestão do sistema. Ou seja, entender, na prática, que o transporte coletivo é um problema de todos os gestores públicos, especialmente da Prefeitura do Recife.
“É preciso compartilhar responsabilidades, inclusive e, principalmente, financeiras. Assim, o transporte terá uma capacidade maior de conquistar recursos e financiamentos”, defende o consultor de transportes Germano Travassos, profundo conhecedor do sistema metropolitano.
A participação de outros municípios da RMR no consórcio também é importante, mas não se compara ao efetivo envolvimento do Recife. “As outras cidades têm um número pequeno de linhas metropolitanas, ou seja, geridas pelo Estado. A maioria tem sistemas municipais. É o caso de Jaboatão dos Guararapes e Paulista, por exemplo, que nunca aderiram ao Consórcio”, explica Germano Travassos.