Caso Beatriz: SDS pede demissão de perito denunciado por pais de menina morta em Petrolina
Profissional que fez perícias para ajudar nas investigações também elaborou plano de segurança particular para o colégio onde menina foi assassinada a facadas
Após quase dois anos e meio de uma denúncia feita pelos pais da menina Beatriz Angélica Mota, de 7 anos, a Corregedoria da Secretaria de Defesa Social (SDS) concluiu as investigações. Portaria assinada pelo secretário Humberto Freire, e publicada nesse sábado (18), sugere ao governo de Pernambuco a demissão do perito criminal Diego Leonel Costa, que atuou na perícia sobre o assassinato da menina, no colégio Nossa Senhora Auxiliadora, em Petrolina, no Sertão do Estado. O caso, sem solução, completou seis anos no último dia 10.
De acordo com as investigações da Corregedoria, Diego participou da criação de um plano de segurança para o colégio, na condição de sócio cotista da Empresa Master Vision. No dia 14 de janeiro de 2016, ou seja, um mês após a morte de Beatriz, ele esteve na instituição de ensino e fez filmagens e fotografias por meio de um drone. Mesmo assim, segundo a Corregedoria, o mesmo perito fez parte, posteriormente, da equipe de trabalho de investigação responsável pela apuração do homicídio.
Diego é um dos mais importantes peritos criminais do Estado, atualmente. Nos últimos anos, atuou como chefe do Núcleo de Perícias do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), órgão subordinado à Polícia Científica de Pernambuco, sob o comando da também perita criminal Sandra Santos.
O profissional, inclusive, chegou a assinar, como perito revisor, um laudo em 2019 para contribuir com as investigações da polícia no Caso Beatriz. A portaria da SDS aponta que esse fato "situação que causou estranhamento pelo fato deste mesmo perito já ter prestado serviços particulares ao referido colégio e que teve repercussão na mídia, o que acarretou questionamentos acerca da lisura e imparcialidade das investigações policiais do caso em tela, trazendo flagrante prejuízo ao andamento das investigações".
A SDS ainda pontua que Diego é presidente da Cooperativa de Peritos Assistentes Técnicos e Pareceristas, cooperativa que objetiva fazer a intermediação entre peritos e o Poder Judiciário com a finalidade de tais peritos prestarem serviços particulares à Justiça. Além disso, ainda seria sócio de outra empresa, a GD Perícia, Consultoria e Engenharia Ambiental LTDA, onde atuaria como perito particular.
No parecer, sugerindo a demissão do profissional, o secretário Humberto freire destaca que ele "feriu a moralidade administrativa e negligenciou o cumprimento de seus deveres em três ocasiões distintas, em especial ao exercer atividades incompatíveis com a função policial civil, ao desrespeitar a hierarquia e a disciplina, ao não zelar pela dignidade da função policial e ao não observar normas legais e regulamentares".
A decisão final sobre a demissão caberá ao governador Paulo Câmara. Mas a expectativa é de que ele irá seguir a mesma linha do secretário de Defesa Social.
A denúncia dos pais de Beatriz consta em um dossiê feito por eles para contribuir com as investigações da Polícia Civil, que não avançaram para prender o assassino da menina. No documento ainda consta nomes de outros profissionais de perícia e da própria Polícia Civil que teriam atrapalhado as investigações, a exemplo de outro perito que teria ficado, durante meses, com um HD com imagens do colégio e, depois, afirmado que não havia como recuperar o conteúdo.
A coluna Ronda JC tentou contato com Diego. Se houver um pronunciamento dele sobre o caso, essa publicação será atualizada.
CAMINHADA PELO ESTADO
Sem resposta da polícia, desde o último dia 5 de dezembro Sandro Romildo e Lucinha Mota, pais de Beatriz, fazem caminhada pelo Estado para cobrar justiça. A saída ocorreu em Petrolina e seguirá até o Recife. Eles devem chegar até o final do mês, levando em consideração uma média de 30 a 40 quilômetros de caminhada diários. Vídeos postados todos os dias na internet, pelas cidades onde o casal passa, mostram uma legião de pessoas apoiando a luta dos pais de Beatriz.
No dia que chegar ao Centro do Recife, o grupo irá à sede do Ministério Público de Pernambuco (MPPE), onde farão um ato, e ao Palácio do Campo das Princesas, sede do governo do Estado, onde pedirão uma audiência com o governador Paulo Câmara. "Se ele não nos receber, voltarei para casa, em Petrolina. Mas, depois de uns dias, vou voltar ao Recife e acampar na porta do Palácio até ser recebida", conta a mãe de Beatriz.
A INVESTIGAÇÃO
Desde que Beatriz foi morta no tradicional Colégio Nossa Senhora Auxiliadora, vários delegados designados pela Polícia Civil comandaram as investigações do caso. E não conseguiram chegar ao assassino, nem à motivação do crime. Até uma força-tarefa, que chegou a contar com cinco promotores de Justiça, foi criada pelo Ministério Público de Pernambuco (MPPE).
No começo de 2021, no entanto, o grupo foi desfeito. Apenas um promotor acompanha o andamento do inquérito, que soma milhares de páginas, centenas de depoimentos e dezenas de exames de DNA.
Uma das linhas de investigação, em 2016, apontava para uma possível motivação religiosa, ou seja, o mentor do assassinato teria interesse, na verdade, em atingir a tradicional escola. Mas essa linha, apesar de ventilada pelo promotor de Justiça Carlan Carlo da Silva, nunca foi confirmada pela polícia.
Em 2017, a Polícia Civil chegou a divulgar a imagem de um suspeito que possivelmente entrou no colégio durante a festa. Uma câmera flagrou o rapaz do lado de fora, mas nenhuma imagem do lado de dentro teria registrado a dinâmica do crime. A imagem do suspeito, vale destacar, era pouco nítida. Foi oferecida até recompensa de R$ 10 mil, por meio do Disque-Denúncia, mas o criminoso não foi encontrado.
Testemunhas contaram à polícia, na época, que o suspeito teria sido visto tentando se aproximar de outras crianças antes de chegar até Beatriz. Mas ninguém, até então, havia desconfiado de nada.
Nessa mesma época, os pais da menina morta enviaram uma carta ao papa Francisco, que respondeu, estimulando a família a insistir pela justiça.
Anos se passaram, delegados foram substituídos, protestos foram realizados, mas a família de Beatriz ficou sem respostas. E com o sentimento cada vez mais forte e duro da impunidade. Os pais decidiram até fazer uma investigação paralela para juntar pistas.
"Apesar da promessa do governo do Estado, tivemos pouco acesso à investigação da Polícia Civil, alguns relatórios apenas. Já solicitei acesso às imagens de câmeras de segurança e outros detalhes, mas não fui autorizada. Tenho coisas a compartilhar com a Polícia Civil, mas não sinto mais segurança. Acredito que, lá no começo, a investigação não foi bem feita. Houve prejuízos ao caso, por isso ninguém consegue resolver", declara Lucinha.
PEDIDO DE FEDERALIZAÇÃO
Nos últimos anos, os pais de Beatriz pediram insistentemente para que a Polícia Federal assumisse as investigações, o que não ocorreu. Também pedem ao governo do Estado que autorize a cooperação de uma instituição norte-americana no caso - a Criminal Investigations Training Group, que conta, inclusive, com a intermediação do Consulado Americano. Mas não há resposta.