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Vídeo: Armas são guardadas pela polícia em contêiner prestes a desabar, em Olinda

Imagens mostram que armas de fogo recolhidas pela polícia estão em um espaço improvisado e precário no Comando de Operações Especiais (Core)

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Raphael Guerra

Publicado em 24/05/2022 às 8:00 | Atualizado em 25/05/2022 às 19:42
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Armas de fogo apreendidas pela polícia - e que são necessárias para investigações de crimes - estão sendo guardadas em um espaço improvisado e precário no Comando de Operações Especiais (Core), em Olinda. Imagens recebidas pela coluna Ronda JC mostram um contêiner, prestes a desabar, onde há várias sacolas com as armas.

O espaço mais lembra um depósito velho e abandonado, diferentemente do que deveria ser na prática. Afinal, foi pela falta de segurança e controle que centenas de armas e milhares de munições foram desviadas da antiga sede do Core, na área central do Recife, e foram vendidas para facções criminosas. O caso, descoberto no começo de 2021, levou à prisão de policiais civis. 

Mesmo em um novo endereço, inaugurado há poucos meses, a falta de estrutura para garantir a segurança das armas de fogo permanece. Na semana passada, um policial civil, que trabalha no Core, gravou um vídeo para mostrar aos seus superiores a situação do contêiner onde estão as armas.

"Essa prateleira todinha está caindo. O que está segurando é a porta. Tá muito arriscado. Tá caindo mesmo", diz em um dos trechos do vídeo, recebido anonimamente pela coluna. Veja o vídeo:

Diante da gravidade da situação, uma outra policial civil enviou comunicado interno ao gestor do Core, o delegado Gilberto Loyo, pedindo providências. 

A coluna teve acesso à íntegra do texto. A policial cita que "os armamentos são pesados e a capacidade de suporte de algumas das estruturas feitas em madeira é baixa". E que "estas estruturas não passam por manutenção". 

Ela solicita, no documento, que seja encaminhado "um marceneiro para realizar o conserto e reforço das estruturas deste contêiner".

Diz ainda que, por medida de segurança, o espaço foi interditado, "dificultando organização, restituição de armas, solicitações para testes no IC (Instituto de Criminalística), separação de armas para destruição, entre outras demandas".

No dia seguinte, em outra comunicação interna, o delegado Diogo Faria de Almeida, assessor do Core, pede à chefia direta, em caráter de urgência, a reforma do espaço.

Ele cita a importância da reforma "visando evitar acidentes, e como forma de não parar os recolhimentos de armas de fogo apreendidas nos Institutos de Criminalística do Estado, para dar cumprimento ao cronograma estabelecido junto a Chefia de Polícia e a Secretaria de Defesa Social".

O QUE DIZ A POLÍCIA CIVIL

Procurada pela coluna, a assessoria da Polícia Civil afirmou que o Core "passou recentemente por uma mudança de sede com estrutura mais moderna e adaptada à realidade atual da atividade policial e, em função deste fato, houve transferência do acervo geral do Recife para Olinda".

Sobre a situação precária, a assessoria alegou que durante o transporte de um espaço para outro houve dano em um contêiner. "A Diretoria de Administração Geral (DIAG) foi acionada e o problema já foi solucionado", afirma a nota.

A coluna também questionou a Polícia Civil sobre o motivo de armas de fogo estarem sendo guardadas em contêineres, mas não houve resposta.

A assessoria alegou que "informações referentes às armas de fogo são sensíveis, possuindo a classificação como sigilosas, definida pela Agência Central de Inteligência do Estado". 

DESVIO E VENDA DE ARMAS DO CORE

A falta de cuidado com armas de fogo não tem sido um caso isolado em Pernambuco. Em janeiro de 2021, a Polícia Civil começou a investigar o sumiço de mais de 300 armas de fogo e mais de 3 mil munições que estavam sob a responsabilidade do Core.

Das 326 armas, 120 pistolas de calibre ponto 40 de fabricação da marca Taurus pertenciam à Guarda Municipal de Ipojuca e haviam sido doadas pela Polícia Rodoviária Federal (PRF), em maio de 2020.

Na época, o secretário de Defesa Social do município, Osvaldo Morais, tomou a decisão de encaminhá-las à Core porque acreditava-se que seria mais seguro enquanto os profissionais da Guarda seriam treinados. Menos de um ano depois, o gestor foi surpreendido com a informação de que as armas haviam sido desviadas por policiais lotados no Core.

Interceptações telefônicas apontaram que algumas dessas armas desviadas foram comercializadas para as facções criminosas por valores que variavam de R$ 6,3 mil a 6,5 mil, cada uma. Não há informações sobre a quantidade exata e os tipos das armas que cada grupo adquiriu.

Vinte pessoas - incluindo cinco policiais civis (um deles veio a falecer) - foram denunciadas pelo Ministério Público à Justiça por crimes como organização criminosa, comércio ilegal de armas de fogo, peculato, lavagem de dinheiro e corrupção ativa e passiva. O processo está sob sigilo.

No inquérito policial, os delegados Cláudio Castro e Guilherme Caraciolo classificaram o esquema como uma “Black Friday”.

“O que podemos denotar é que ao longo de anos, em virtude da falta de controle e um software onde todo o acervo bélico da polícia pudesse ser relacionado, policiais que trabalhavam diretamente com o acervo, se aproveitaram da facilidade de acesso e falhas na segurança, e passaram a desviar armas, munições e acessórios, revendendo esse material de maneira indiscriminada para todo e qualquer tipo de criminoso, integrante ou não de organizações criminosas. Uma verdadeira ‘Black Friday’ de armas, munições e acessórios. Houve criminoso que comprou e houve criminoso que intermediou a venda, e assim os valores da comercialização foram sendo majorados e se disseminando a oferta e a procura”, descreveram em relatório.

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