Policiais acusados de roubo e extorsão a comerciantes no Recife vão usar tornozeleira eletrônica

Investigação apontou que um delegado da Polícia Civil de Pernambuco, atualmente aposentado, comandava a organização criminosa
Raphael Guerra
Publicado em 12/05/2023 às 9:41
Delegado Joaquim Braga Neto, atualmente aposentado, vai usar tornozeleira eletrônica Foto: BRUNO CAMPOS/JC IMAGEM


A Justiça aceitou denúncia do Ministério Público de Pernambuco (MPPE) contra um delegado e mais três policiais civis acusados de perseguir, roubar e extorquir comerciantes do Recife. O esquema estava sendo investigado pela Polícia Civil desde 2016, e resultou, no mês passado, na Operação Espórtula.

De acordo com a denúncia do MPPE, o delegado Joaquim Braga Neto, atualmente aposentado, seria o líder da organização criminosa, que tinha como alvo, principalmente, os comerciantes que vendiam cigarros. Uma das vítimas identificadas pela polícia trabalhava no Mercado de São José, na área central do Recife.

Além do delegado, também foram presos preventivamente na operação os policiais civis Ildeci Amaro da Silva, Silvio Gomes da Silva e Marcelo Ferreira dos Santos. Também foram cumpridos mandados de busca e apreensão nas residências deles. 

Nessa quinta-feira (11), após 16 dias, a Justiça concedeu a revogação das prisões dos acusados, atendendo ao pedido das defesas e com parecer positivo do MPPE. A coluna Segurança teve acesso à decisão. 

Os advogados alegaram que os réus são primários, têm endereços fixos e que não há elementos que indiquem a possibilidade de, em tese, praticarem novos ilícitos penais. 

O promotor de Justiça Humberto Graça, que deu parecer favorável o pedido, reforçou que, como os fatos denunciados ocorreram há sete anos, "não há a necessária contemporaneidade para justificar a custódia cautelar". E sugeriu a aplicação de medidas cautelares. 

A juíza Roberta Nogueira, da 14ª Vara dos Crimes Contra a Administração Pública e a Ordem Tributária, determinou a soltura dos réus, mas com as seguintes medidas:

- Monitoramento eletrônico com prazo de 120 dias, podendo ser revisto e renovado, além da distância de 500 metros das residências de vítimas e testemunhas;

- Comparecimento mensal e periódico ao fórum, até o dia 05 de cada mês, com o fim de informar as suas atividades, endereços e telefones atualizados;

- Proibição de ausentar-se da Comarca em que reside (e sua região metropolitana), sem prévia e expressa autorização do Juízo;

- Recolhimento domiciliar no período noturno, após às 20h nos dias de folga, finais de semana e feriados. 

Conforme revelou a coluna, o delegado estava em uma cela especial do Centro de Observação e Triagem (Cotel), em Abreu e Lima. 

COMO O GRUPO AGIA, SEGUNDO AS INVESTIGAÇÕES

De acordo com as investigações conduzidas pelo Grupo de Operações Especiais (GOE), a organização criminosa perseguia comerciantes, apreendia as cargas de cigarro deles - sob pretexto de serem ilegais - e revendia para outros vendedores do Recife. Além do delegado e de três policiais civis, outros dois militares também foram apontados como integrantes do esquema.

Os PMs estão respondendo a um processo na Vara da Justiça Militar. Também já foram excluídos da corporação. 

A investigação começaram após uma denúncia feita em 2016, com o objetivo de identificar e desarticular o grupo suspeito de roubo, extorsão, concussão (se utilizar do cargo público para exigir vantagem indevida) e abuso de autoridade. 

Na época, o delegado e os policiais civis eram lotados na Delegacia de Águia Fria.

"Começamos a investigar o caso após uma vítima procurar o GOE porque não aguentava mais a situação. Era muito dinheiro que esses agentes de segurança conseguiam. A gente imagina uma média de R$ 30 mil por carga", disse o delegado Jorge Pinto, no dia da operação.

"Os agentes públicos lucravam duas vezes, porque as vítimas posteriormente eram conduzidas às delegacias e eram constrangidas a pagar propina como forma de se evitar uma prisão em flagrante", pontuou.

Vários comerciantes chegaram a se mudar do bairro de Água Fria, na Zona Norte do Recife, porque não aguentavam mais as investidas dos policiais. 

"O modus operandi narrado revela a existência de uma verdadeira organização criminosa, ostentando estrutura e hierarquia, de natureza permanente - ainda que informal –, cujo objetivo é a prática de vários crimes", descreveu o MPPE na denúncia enviada à Justiça. 

"É visível, por sua vez, que Joaquim ocupa posição de maior prestígio e liderança, especialmente considerando que ele comandava muitas das ações praticadas contra os trabalhadores, decidindo seus destinos quando fossem apresentados perante ele na Delegacia de Água Fria. Além disso, subsistem elementos nos autos de que ele angariava considerável benefício econômico em virtude de tais ações delituosas", disse outro trecho da denúncia. 

O QUE DIZ A DEFESA DOS RÉUS?

O advogado Bruno Lacerda, responsável pela defesa do delegado Joaquim Braga, afirmou que ele será inocentado no processo.

"Ele não tem responsabilidade pelos fatos. Ele ingressou na Delegacia de Água Fria em abril de 2016. Há uma testemunha ouvida em janeiro de 2016 que disse que o esquema já existia desde 2015. Como ele pode ser líder de um esquema que ele não conhecia?", argumentou Lacerda.

"Ele só passou seis meses na Delegacia de Água Fria e, mesmo assim, acumulava com a Delegacia do Cordeiro. Não tem qualquer relação com o caso. Sempre foi um delegado muito respeitado. Jamais pesou qualquer acusação, nunca recebeu processo na vida. E a decisão judicial pela liberdade é uma demonstração de que ele não oferece risco ao processo", completou o advogado.

A coluna continua tentando contato com os advogados dos outros réus.  

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