Superlotação, violência e pouca água: TJPE vê cenário de caos no Presídio de Igarassu

Denúncias de corrupção envolvendo agentes públicos e de abusos praticados por presos foram colhidas na unidade, que se tornou a pior de Pernambuco

Publicado em 19/08/2024 às 10:46 | Atualizado em 19/08/2024 às 10:50

O Presídio de Igarassu, localizado no Grande Recife, continua somando graves denúncias - e sem que ao menos alguns dos problemas sejam resolvidos a curto ou médio prazo. Dessa vez, um relatório produzido por uma equipe do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) reforçou que os presos vivem em condições desumanas e degradantes. 

A inspeção foi realizada pelo Conselho da Comunidade da 1ª Vara Regional de Execução Penal do Estado. A primeira constatação foi de superlotação - a maioria do sistema prisional pernambucano atualmente. O presídio de conta com pouco mais de 5,4 mil detentos, mas tem capacidade para até 1,2 mil.

A coluna Segurança teve acesso à íntegra do relatório, que detalhou o cenário de caos. 

"Dentre as principais violações, foram constatadas a limitação do acesso à água, que é liberada somente duas vezes ao dia, por cerca de dois minutos; pessoas dormindo no chão, amontoadas; agressões e violências físicas constantes cometidas pelas próprias pessoas privadas de liberdade que são indicadas como responsáveis por atividades de gestão, como 'chaveiros', 'gatos', 'auxiliares de chaveiros'", destacou o documento. 

Também foram ouvidas denúncias de uso abusivo de medidas de isolamento.

"No dia da inspeção, a equipe se deparou com a informação de que, momentos antes, o pavilhão do castigo estava com cerca de 50 pessoas, tendo 41 pessoas sido removidas e transferidas para outros locais da unidade, com a finalidade aparente de ocultar as violações da inspeção", indicou o relatório.

REPRODUÇÃO
Sem espaço, detentos estão dormindo em locais onde estão sendo construídos banheiros para visitas - REPRODUÇÃO

Apesar do pouco espaço na unidade - com parte expressiva dos detentos dormindo no chão do pátio - eles contaram que são proibidos de usarem os colchões durante o dia.

Com pouco espaço, o local onde estão sendo construídos banheiros para visitas estava sendo usado pelos presos para dormir. 

ALIMENTAÇÃO PRECÁRIA

O relatório da 1ª Vara Regional de Execução Penal do Estado apontou ainda problemas com a alimentação no Presídio de Igarassu. Na inspeção, foram visitadas a cozinha e padaria. 

REPRODUÇÃO
Péssimas condições da cozinha onde são feitas as refeições dos detentos do Presídio de Igarassu - REPRODUÇÃO

"Foi verificado durante a inspeção condições impróprias para manuseio, preparo e estocagem dos alimentos na cozinha, a exemplo de frangos descongelando em cima de pallets sujos. As pessoas privadas de liberdade relataram de forma unânime as condições impróprias da alimentação servida, além da falta de acesso à água própria para consumo", destacou o documento.

PAVILHÃO LGBTQIA+

O Presídio de Igarassu conta com um pavilhão exclusivo para o público LGBTQIA+. Mas o espaço também está superlotado e com condições de infraestrutura inadequadas. No dia da visita, o espaço contava com 69 pessoas no local. 

O relatório indicou que o pavilhão "necessita de uma reforma urgente para dar condições mínimas de sobrevivência desse público privado de liberdade", pois os presos "são submetidos a condições insalubres e degradantes de sobrevivência e chegam a dormir dez no corredor permanentemente molhado". 

A inspeção observou que, logo na entrada do pavilhão, há esgoto a céu aberto e espaços pequenos onde dormem três pessoas. 

"No banheiro existem apenas dois sanitários, ambos entupidos e sujos. Além disso, também foi constatada instalação elétrica exposta e podendo ocasionar acidentes."

Os detentos ainda relataram que são proibidos de circular nos outros pavilhões da unidade prisional. 

DENÚNCIAS DE CORRUPÇÃO E CHAVEIROS

Por causa da superlotação no Presídio de Igarassu e, consequentemente, falta de controle do Estado, as denúncias de corrupção envolvendo servidores públicos e de presos dando ordens também foram colhidas durante a inspeção. 

"A superlotação da unidade gera, além das condições insalubres e degradantes já relatadas, ambiente propício para práticas sistemáticas de violência e corrupção. São diversos relatos encontrados apontando corrupção de agentes públicos na unidade e ações abusivas por parte dos próprios presos na condição de 'chaveiros' ou 'representantes de pavilhão'", afirmou o documento. 

REUNIÃO DISCUTIU SITUAÇÃO DO PRESÍDIO

A inspeção, ocorrida em 16 de maio, resultou no relatório concluído em julho. No começo deste mês, o TJPE promoveu uma reunião onde foi discutida a situação do Presídio de Igarassu. 

Estavam presentes representantes do Ministério Público, da Defensoria Pública, do Conselho Regional da 1ª Vara de Execução Penal, da Assembleia Legislativa de Pernambuco e do Conselho Nacional de Justiça.

Na ocasião, foram cobradas ações, como apoio jurídico aos presos e fiscalizações de rotina para acompanhamento de possíveis melhorias. 

O QUE DIZ O GOVERNO DE PERNAMBUCO?

Por meio de nota, a Secretaria de Administração Penitenciária e Ressocialização (SEAP) informou que medidas estão sendo tomadas para reduzir o número de presos no Presídio de Igarassu. Uma delas é a entrega da nova unidade do Complexo Prisional do Curado, na Zona Oeste do Recife, prevista para setembro, com 954 vagas.

"Mais 814 vagas serão entregues, até novembro deste ano, no lote 1 do Complexo Penitenciário de Araçoiaba. Ao todo, o governo de Pernambuco pretende entregar até o final desta gestão 7.950 novas vagas e implantar sete unidades fabris no sistema prisional do Estado", disse a pasta estadual. 

Com relação à água, a SEAP alegou que o abastecimento no presídio ocorre três vezes por semana, por cerca de uma hora e meia por pavilhão. "Está em andamento a implementação do sistema de caixa d'água, com testes já realizados em dois pavilhões", pontuou.

Sobre a segurança, a SEAP disse que foram nomeados 240 policiais penais em junho deste ano.

"O governo do Estado já havia nomeado 421 profissionais, somando 661. Esse número corresponde a mais de três vezes o quantitativo de profissionais previstos no edital do último concurso, realizado em 2021", afirmou. 

Tags

Autor