Entrevista: Carlos Lombardi celebra 40 anos de teledramaturgia

Criador de novelas como 'Bebê a Bordo', 'Kubanacan' e 'Pecado Mortal' repassa sua carreira em conversa com o JC
Robson Gomes
Publicado em 05/06/2020 às 6:00
O autor Carlos Lombardi tem quatro décadas de atuação na teledramaturgia Foto: DIVULGAÇÃO


Com 61 anos de idade e 40 de carreira na teledramaturgia, o nome de Carlos Lombardi é um dos mais lembrados e celebrados da área. Autor de novelas e séries marcantes, o dramaturgo paulista, nascido em 1958, é professor universitário, formado em Rádio e TV. Estreou na televisão aos 19 anos, redigindo o Telecurso 2º Grau, na TV Cultura de São Paulo.

>> Com 'A Favorita' em HD, Globoplay libera mais novelas clássicas no catálogo

>> Entrevista: Manuela Dias comemora os 100 capítulos de 'Amor de Mãe'

>> Walcyr Carrasco: 'Existem muitas Josianes e os pais não percebem'


Sua estreia nas novelas aconteceu em 1979, ainda na extinta TV Tupi. Aos 20 anos, dividiu a autoria de Como Salvar Meu Casamento, com Edy Lima e Ney Marcondes. Folhetim, inclusive, inacabado, devido à falência da emissora.

Dois anos depois, atuava na Globo como colaborador informal de Silvio de Abreu, em Jogo da Vida, e de Cassiano Gabus Mendes, em Elas por Elas. Em 1983, já era creditado como colaborador de Silvio em Guerra dos Sexos, novela que revolucionou o horário das sete da Globo. E foi com a supervisão do mesmo Silvio de Abreu que ele assinou, em 1984, sua primeira novela solo, Vereda Tropical, bastante elogiada na época.

Todavia, foi em Bebê a Bordo, de 1988, que Carlos Lombardi mostrou seu estilo próprio: uma linguagem que mesclava ação, humor e diálogos sarcásticos. Receita esta que foi vista em suas obras (e sucessos) posteriores como Perigosas Peruas (1992), Quatro por Quatro (1994), além das inesquecíveis Uga Uga (2000) e  Kubanacan (2003).

Nesse meio tempo, entre autorias, colaborações e supervisões, também escreveu filmes e séries. Mas em 2012, após mais de 30 anos, o autor se desligou da TV Globo e assinou contrato com a Record TV, onde fez a sua última novela exibida: Pecado Mortal (2013).

Diante desta longa trajetória, em entrevista ao Jornal do Commercio, Carlos Lombardi repassa um pouco desse caminho e expõe o seu olhar para o futuro da teledramaturgia. Confira.

ENTREVISTA // CARLOS LOMBARDI


JORNAL DO COMMERCIO – Carlos, ano passado completou-se 40 anos de sua estreia em novelas. Como você avalia estas suas quatro décadas de trabalho na teledramaturgia?

CARLOS LOMBARDI – Com orgulho. Trabalhei muito, fiz sucessos, coisas menos bem sucedidas, mas sempre trabalhei com gosto e vontade.



JC – Recentemente, duas efemérides ligadas a você agitaram o público nas redes sociais. A primeira foram os 17 anos da estreia de Kubanacan. Te surpreende esse carinho por aquele universo completamente paralelo? O que poucos sabem sobre essa novela que vale ser dito agora?
CARLOS – Como Kubanacan é uma alegoria, como a grande Que Rei Sou Eu? (1989), de Cassiano (Gabus Mendes), acredito que seja dos meus trabalhos um dos que menos ficou datado. Honestamente, não sei indicar um fator para que ela seja tão lembrada — Claro, a escalação foi ótima, a direção geral do Wolf (Maya) também, tudo isso conta. Mas fico feliz em ver gente com vontade de revê-la e muito agradecido pelo carinho que recebo dos fãs.

JC – A segunda lembrança do público foram os 20 anos da estreia de Uga-Uga. Inclusive, lembraram que o capítulo 52 da trama falava de “quarentena” e um “novo vírus”. Te chocou essa coincidência com a nossa realidade duas décadas depois?
CARLOS – Não tenho ideia de onde veio esse “momento Nostradamus”, mas gostei muito de fazer Uga-Uga. Foi uma novela que deu muita audiência e resistiu a ser tão longa com dignidade. Sei que, nos anos seguintes, ela não podia ser reexibida por questões de censura de uma autoridade judicial do Rio de Janeiro. Não sei se isso vale ou o pessoal da Globo de hoje sabe que esse foi o motivo dela não ir para o Vale a Pena Ver de Novo.

JC – Sua última novela foi Pecado Mortal, em 2013, que marcou sua estreia e única trama na Record TV. O folhetim não teve uma audiência expressiva, mas grande aceitação da crítica. Foi uma experiência positiva para você no fim das contas?
CARLOS – Adorei fazer. Montei 70% do elenco, se não me engano, com contratados da Record, mostrando que valeu a pena assistir tantas obras da dramaturgia da Record para acompanhar o crescimento dos atores. Foi uma escalação muito boa e a novela apareceu em várias listas de Melhor ou Melhores do Ano. Não deu a audiência que merecia (sem ser pedante) entre outras coisas por conta da alteração da grade da Globo. Os capítulos da novela das nove antes se encerravam mais ou menos às 22h15, 22h20 no máximo. Era aí que começavam as novelas do horário nobre da Record naquela época. A estratégia da Globo de atrasar a programação e fazer capítulos gigantes da novela do Walcyr (Carrasco) - Amor à Vida - que estava no ar funcionou. Se a Record entrava com a novela no horário certo, a gente encarava meia hora de novela das 9 já na metade, fazendo sucesso. Se a Record atrasasse e esperasse a novela da Globo acabar, eram quase 23 horas, muito tarde para o telespectador começar a ver. Depois a Record mudou a novela de horário, o que geralmente não funciona. Mas não reclamo. Fui muito bem tratado pela direção artística, principalmente por Marcelo Silva, que nunca pressionou pra revirar a novela. Ele elogiava a qualidade dela. Me disse que Carlão (Fernando Pavão) e Patrícia (Simone Spoladore) foi o melhor casal romântico que a Record já tinha tido. Tanto que depois da novela seguinte, a Record abriu o horário de novela das 20h30, onde a novela passava a ser uma alternativa para o Jornal Nacional. Deu certo, como provou a audiência de Os Dez Mandamentos (2015, de Vivian de Oliveira). Foi uma ótima experiência e um trabalho do qual me orgulho.



JC – Você também possui algumas séries no currículo, e hoje estamos na era dos streamings. Você acredita que essa é a linguagem do futuro ou a novela seguirá tendo seu espaço cativo no Brasil?
CARLOS – Folhetim, a meu ver, vai durar ainda muito tempo. Se diário, semanal, tanto faz. As séries e novelas convergiram um pouco. Lost era de certa maneira uma novela semanal. As novelas ganharam mais ritmo. Acredito que o próximo passo seja fazer novelas como as da faixa nobre da Televisa — algumas na Netflix — de 70 episódios e com menos tramas paralelas.

JC – Você sente falta de ter alguma obra sua no ar? Temos alguma previsão de seu retorno às telinhas em algum formato?
CARLOS – Minha volta não depende de mim. Escrevi o seriado Mamonas Assassinas que parou por questões de produção. Depois Walquíria Barbosa assumiu o projeto e seu Marcelo (Silva, da Record TV) pediu para que ela me chamasse para realizar as alterações necessárias para a produção, quando eu já estava fora. Estamos acabando essas alterações agora. Ao mesmo tempo, desenvolvi três projetos de séries e uma de novela. As séries estavam sendo apresentadas a potenciais compradores quando veio a pandemia, o que faz tudo andar mais devagar.

JC – Dizem que autores de novelas tem uma “fórmula” pré-pronta para suas obras. A sua seria algo no estilo “comédia, ação e homens descamisados”. Isso ainda faz sentido para você hoje em dia?
CARLOS – Não me incomodo com rótulos, só acho que essa descrita reduz trabalhos que vão além disso. Sempre misturei comédia e drama. O que mudava em cada história era a proporção desses dois ingredientes. Mas não gostava de fazer núcleos só de drama ou só de comédia. Seguindo a linha de Geraldo Vietri e de Cassiano (Gabus Mendes), o mesmo personagem que faz comédia faz drama — em quantidades diferentes, claro. Mas tento sempre humanizar as figuras mesmo que comecem como mero motivo de risos ou de choro no início da trama.



JC – Com exceção das reprises em virtude da pandemia, alguma obra na teledramaturgia chamou sua atenção positivamente nesses últimos anos? O que Carlos Lombardi tem assistido?
CARLOS – Muitas séries. Assisti e estou assistindo várias. Meu gosto é eclético, gosto tanto de Battlestar Galactica como de Downtown Abbey. No geral, gosto mais do estilo das séries inglesas, mas Fauda me fez me interessar mais pela TV israelense.

JC – Como você tem lidado com esse isolamento social? Segue trabalhando em algo ou não tem clima para isso?
CARLOS – Depende do dia. É muito difícil viver em quarentena.

JC – Caso você pudesse escolher uma novela sua para ser reexibida agora durante a quarentena, qual seria e porquê?
CARLOS – Na Record seria, obviamente, Pecado Mortal. Na Globo, Uga Uga ou Kubanacan, que nunca foram reexibidas. Mas gostei de ver na chamada do Globoplay que Quatro por Quatro (1994) vai para o streaming em breve.

TAGS
cultura televisão Novela
Veja também
últimas
Mais Lidas
Webstory