Se a figura de Genivaldo Di Pace, falecido na última quinta-feira (9) aos 83 anos, tem um grande peso para a publicidade local, principalmente em sua atuação no comando da Center Produtora desde 1969, o mesmo pode ser dito sobre sua importância para o cinema. Di Pace, que já colaborava frequentemente com a produção de Fernando Spencer, abraçou os primeiros passos da produção cinematográfica na retomada pernambucana, tanto formando profissionais dentro da Center, mas principalmente dando suporte para o trabalho inicial de nomes como Adelina Pontual, Lírio Ferreira, Cláudio Assis e Kleber Mendonça Filho. Genivaldo sofreu uma parada cardíaca.
Entre as demandas da intensa rotina de campanhas publicitárias, institucionais e políticas, Genivaldo encontrava um jeito de dar suporte para cineastas, muitos deles estreantes, apresentarem suas ideias e receber apoio em forma de equipamentos e técnicos, iniciativa ímpar em um período ainda escasso dos editais oficiais da atualidade. O produtor veterano João Vieira Jr, hoje à frente da Carnaval Filmes, foi uma grande testemunha dessa história, em especial nos anos em que trabalhou como diretor de produção da Center, onde diz ter se qualificado em diversos fatores importantes para o exercício de sua profissão, como lidar com cronogramas, prazos e uma multidão de profissionais.
"O cinema pernambucano, no tamanho que a gente tem hoje, tem algo de embrionário na figura de Genivaldo e na Center. Era uma época que não existia escola de cinema e as pessoas do audiovisual vinham do jornalismo, publicidade e comunicação no geral, em um momento que as faculdades não tinha equipamentos e laboratórios para permitir experimentos. Genivaldo possibilitou isso para a cidade, a construção de um catálogo audiovisual importante. É muito bonito ver hoje um setor inteiro agradecido a Genivaldo", relata João.
Ele lembra que títulos como Baile Perfumado (Lírio Ferreira e Paulo Caldas, 1996), filme-chave na retomada pernambucana, contou com apoio da Center, além de uma profusão de curtas dirigidos por estreantes. Seu trabalho também se abria para outros segmentos da cultura local, a cena teatral utilizava seus estúdios para a produção de comerciais e o nome da Center era vastamente encontrando nos cartazes de shows, peças e saraus.
O diretor Kleber Mendonça Filho foi um deles, contando com apoio da Center ainda no final da faculdade. Como projeto de conclusão de curso, Kleber planejou a realização de dois documentários sobre o ciclo das salas de cinema de rua da cidade e dispunha apenas dos equipamentos de VHS da faculdade, considerados precários por ele. Decidiu levar a ideia para Center e, por intermédio de João Vieira Jr, e acabou conseguindo o apoio da produtora, em especial para a finalização do trabalho.
"Isso que era muito bonito em Genivaldo e na Center, uma época sem edital, CTAv (Centro Técnico do Audiovisual), mas você poderia ir lá na Center, dizer quem era você, o que você estava fazendo e eles poderiam te apoiar. A importância de Genivaldo na produção pernambucana é enorme e reflete esse desejo muito grande que existiu e continua a existir em se fazer cinema aqui. Era tudo na palavra, sem dinheiro envolvido, sem nenhuma obrigação envolvida, uma relação de confiança e de interesse em ajudar, resultando em muitos filmes importantes", conta Kleber. O cineasta ainda contou com equipamentos da Center por um ano na produção do curta Enjaulado (1997) e uma grua da produtora fui utilizada nas gravações de O Som ao Redor.
Enjaulado (Caged In, 1997) from Kleber Mendonça Filho on Vimeo.
A cineasta Adelina Pontual também lembra de como a Center era um ponto de encontro para vários nomes da cena local, garimpando um espaço para poder mostrar suas ideias para Genivaldo. "Ele era uma figura incrível. Era super sério, tinha uma voz grave de locutor de rádio, muitas vezes o pessoal tinha medo. Aí você entrava cheia de dedos na sala dele, um ar-condicionado gelado. Mas quando começava a conversar, era um pai, perguntava o que você precisava e providenciava. Conseguia equipamentos, ilhas de edição e até carro", lembra Adelina, considerando sua figura como a de um verdadeiro mecenas. Seu nome chegou a ser usado como premiação no Cine PE e em 2006 recebeu o título de Cidadão Pernambucano pela Alepe. Certamente, generosidade é o adjetivo que mais circula nas homenagens feitas a Genivaldo.