Em termos oficiais, o Brasil teve o 19 de abril instituído como o "Dia do Índio" em 2 de junho de 1943, por articulação da lei nº 5.540, durante gestão presidencial de Getúlio Vargas. A data foi escolhida por ter sido, três anos antes, a mesma em que aconteceu o Primeiro Congresso Indigenista Interamericano, no México.
A ideia é que, como demais datas dedicadas a populações historicamente marginalizadas em solo brasileiro, seja momento de relembrar - e combater - os cenários de injustiças e perseguições que comunidades indígenas sofrem desde os primeiros momentos das invasões e colonizações das Américas. E, por consequência, a luta que muitas destas pessoas e seus descendentes precisaram e ainda precisam travar diariamente pelo direito de sobrevivência, dignidade e manutenção de suas culturas, narrativas históricas e construções sociais.
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Fato é, porém, que a realidade ligada ao 19 de abril ainda é rodeada de estigmatização e conceitos pré-estabelecidos, que acabam por massificar e despolitizar a causa indígena. A começar pelo uso do termo "índio", considerado por estudiosos, a exemplo do doutor em educação pela Universidade de São Paulo e pós-doutor em linguística pela Universidade Federal de São Carlos, Daniel Munduruku, como remetente a uma ideia folclórica, no pior sentido da palavra. Este ano, inclusive, muitas pessoas têm usado nas redes sociais a nomenclatura "Dia da Resistência Indígena" para se referir à data.
Fundamentais na construção do que se chama Brasil em inúmeros aspectos, das artes a costumes alimentares, as mais de 300 etnias indígenas existentes somente em nosso País são muito mais plurais do que o senso comum costuma imaginar, e existem para além das comunidades aldeadas, marcando presença também em contextos urbanos. Por isso, o Jornal do Commercio indica cinco artistas brasileiros, de ascendência indígena, para começar a ouvir já. Também indicamos onde acompanhar os trabalhos de cada um. Confira abaixo.
QUEM OUVIR?
BRISA FLOW (MG/SP)
Filha de imigrantes chilenos, a mineira Brisa de La Cordillera, ou somente Brisa Flow, tem ascendência da etnia Mapuche, povo originário que habita também o território argentino. Newen, título de seu álbum de estreia, lançado em 2016, significa força, na língua mapudungun, nativa mapuche. A música, sobretudo o rap, é solo onde a artista fala principalmente sobre feminismo, lutas indígenas e opressões de classe, mas também sobre amor e resgate pessoal. Seu lançamento mais recente é a faixa Jogadora Rara, disponível em plataformas de streaming. No Instagram: @brisaflow.
COCO DE TORÉ PANDEIRO DO MESTRE (PE)
O Coco de Toré Pandeiro do Mestre tem mais de duas décadas de história, fazendo música que une elementos de origem afrobrasileira e indígena, com representações ritualísticas e fortemente presentes no interior do Estado - Zona da Mata, Agreste e Sertão. O álbum Coco de Toré (2014) foi gravado em parceria com o Grupo Fehtxa e indígenas da etnia Pankararu. O coletivo tem à frente o músico, cantor, compositor, arranjador e produtor Nilton Júnior, recentemente convidado pela revista Outros Críticos a apresentar o show-oficina Coco de Toré – O mistério da dança circular anti-horária, no lançamento da edição #16 da publicação, sob o tema Tradição sem invenção não é rio. No Instagram: @pandeirodomestre_oficial.
KUNUMÍ MC (SP)
Aos 17 anos, Kunumi MC, alcunha artística de Werá Jeguaka Mirim, já gravava o primeiro álbum, o EP Meu Sangue É Vermelho, cujas seis faixas versam sobre a realidade dos indígenas brasileiros e pautas como demarcação de terras, com foco nos guarani, etnia da qual faz parte. Kunumi nasceu e foi criado na Aldeia Krukutu, localizada entre o município de São Bernardo do Campo e a capital paulista. É hoje, aos 21 anos, um dos principais nomes do rap nacional, chamando atenção, inclusive, da mídia internacional: ano passado, foi personagem de perfil publicado pelo jornal britânico The Guardian. Kunumi também é escritor, com dois livros publicados. Pudera, o jovem é filho do escritor, filósofo e palestrante Olívio Jekupé. No Instagram: @kunumi.mc.
KATÚ MIRIM (SP)
Katú Mirim é rapper, atriz e militante pela causa LGBT entre povos nativos. Filha de mãe negra e pai indígena, foi criada no bairro do Campo Limpo, periferia de São Paulo, por uma família branca e evangélica. Somente na escola teve contato com músicas não-cristãs, a partir de onde conheceu o rap, a princípio, em batalhas de freestyle. Em entrevista ao portal Universa Uol, no ano passado, contou que já teve contratante se negando a pagar cachê por ela ser mulher indígena: "Acham que estão fazendo um favor", contou. Katú é lésbica, mãe de uma menina e faz questão de sublinhar o caráter político destas vivências. A música Indígena Futurista é seu lançamento mais recente e pode ser ouvida no streaming e através do YouTube. No Instagram: @katumirim.
SOUTO MC (SP)
Caroline Souto, a Souto MC, é um dos nomes mais brilhantes da atual cena hip hop brasileira. É exímia compositora e dona de um flow cortante - isso desde o início de suas aparições no meio. Nascida na periferia paulistana, é filha de pai indígena e tem se dedicado, nos últimos anos, a um processo de resgate de sua identidade como mulher indígena urbana. Esse é, aliás, o tema que atravessa do início ao fim o disco Ritual, debut lançado em dezembro de 2019, com apoio do edital Natura Musical. No documentário Meu Verso é Rezo - Bastidores de Ritual, disponível no YouTube, ela conta os detalhes do processo de criação do disco. Souto também compõe e canta sambas, paixão que alimenta desde a infância. No Instagram: @soutomc.