Literatura

André Dahmer aborda suas memórias através da poesia em 'Impressão Sua'

Terceiro livro de poemas do escritor, quadrinista e artista visual é lançado pela Companhia das Letras

Cadastrado por

Márcio Bastos

Publicado em 12/05/2021 às 14:16 | Atualizado em 13/01/2023 às 9:39
André Dahmer investiga amores, medos e o estado no mundo em seu novo livro - DIVULGAÇÃO

Em Impressão Sua (Companhia das Letras, 120 páginas, R$ 59,90), André Dahmer faz uma autobiografia poética, abordando diferentes momentos de sua trajetória, da infância ao presente, e o impacto desses acontecimentos na construção de sua subjetividade. O livro é o terceiro de poemas do carioca, que também é conhecido por seus trabalhos como desenhista e artista visual. Dividido em cinco partes, o trabalho é marcado pelo desnudamento emocional proposto pelo autor, cuja escrita é intimista e pungente.

A primeira delas, voltadas para seus primeiros anos de vida, em Botafogo (RJ), carrega uma beleza melancólica da descoberta do mundo, o fascínio com as nuances do entorno e de si. Fatos como sua tentativa de se encaixar em grupos, da primeira idade ao início da vida adulta, em um certo deslocamento no mundo; os pequenos prazeres da existência, o primeiro contato com a morte, as descobertas sexuais, se misturam sem hierarquia, como na própria vida.

Uma franqueza por vezes desconcertante marca a escrita do autor e revela uma coragem em tocar em questões espinhosas, como problemas familiares,
amorosos (das paixões juvenis à dinâmica do casamento, seus altos e baixos), metafísicos. “A vida é tão boa pensei hoje mesmo/ enquanto ajudava meu pai a tomar banho e urinar”, relata na quarta parte do livro, intitulada Língua Braço Armado do Coração.

A passagem do tempo, o amadurecimento e as mudanças (e permanências, evidenciadas também em um uso astuto da repetição) de perspectivas ao longo da
vida também são temáticas caras a Dahmer. “Minha avó luise sempre dizia/ não é bom mudar as plantas de lugar/ botar no sol botar na sombra/ girar o vasinho/ mudar o rumo das coisas/ até porque as coisas acontecem sozinhas/ querendo você ou não/ tudo passa”, escreve, em uma reflexão que costura passado, presente e a própria ideia de futuro, perspectiva que atravessa todo o livro.

Como explicou em entrevistas, na obra, André Dahmer está menos preocupado em rememorar com exatidão os fatos de sua vida do que em imaginar possibilidades a partir das reverberações que os eventos e sensações (reais ou projetados) narrados podem provocar. Há angústia, esperança, revolta, resignação, desejo, pulsão de vida e morte em sua escrita, fascinante da primeira à última página.

Dahmer imprime em seus poemas um olhar astuto, marcado por um humor com toques de ironia, mas sem escárnio. Por mais sombrias que algumas passagens possam soar, não há niilismo. Pelo contrário: parece haver um enorme amor pelas minúcias da vida, apesar de tudo.

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