OPINIÃO

Indústria do forró perdoa DJ Ivis em nome do lucro

Após três meses preso, retorno do cantor e produtor à cena musical tem sido estimulada e apoiada por grandes nomes do ritmo

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Emannuel Bento

Publicado em 07/12/2021 às 18:13 | Atualizado em 08/12/2021 às 16:40
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Em 12 de julho deste ano, os vídeos do cantor e produtor musical DJ Ivis agredindo a então companheira Pamella Holanda chocaram o País. Simultaneamente, naquela época, o paraibano ganhou cerca de 250 mil seguidores e até alguns defensores nas redes sociais. Essa contradição revela algo que vai ficando cada vez mais nítido após a sua saída da prisão: alguns erros podem ser perdoados, a depender de quem cometeu e dos objetivos desse perdão.

Iverson de Souza Araújo se tornou réu por agressões corporais contra Pamella Holanda. O DJ estava preso no Ceará e foi solto no dia 22 de outubro. A liberdade foi concedida após o sétimo pedido de habeas corpus apresentado pela defesa.

No calor do momento da divulgação dos vídeos, pouco se tocou nesse tema, mas o grande dano à imagem pública de DJ Ivis foi um certo baque para o piseiro, vertente do forró que ganhou as plataformas digitais no último ano. Embora estivesse presente na cena do forró há tempos, foi em 2020 que o produtor musical despontou como uma peça bastante importante nas engrenagens do sucesso dessa vertente.

Apesar de ter nascido como um forró mais "simples", que exigia mais teclado, o piseiro se transformou num forró eletrônico com diálogos com o funk e a música pop. As produções de Ivis entregavam justamente isso. Além de assinar composições de sucessos como "Volta comigo BB", de Zé Vaqueiro, a sua imagem entrou em evidência ao assinar como cantor e aparecer em clipes como "Não pode se apaixonar", com Xand Avião e MC Dany; "Esquema Preferido", de Tarcísio do Acordeon, e "Volta bebê, volta neném", com DJ Guuga.

Retorno à cena

Um mês após sua soltura, artistas do forró mostram que as notas de repúdio foram "gestões de crise" e já estimulam o seu retorno ao jogo. Xand Avião, que até publicou um vídeo para se distanciar do parceiro, voltou a seguir o DJ no Instagram. Márcia Fellipe, que postou uma dura nota na época da divulgação dos vídeos das agressões, já está gravando com Ivis.

Dezembro ficou marcado como o mês do seu retorno. No último sábado (4), Iverson foi visto na gravação do Garota VIP São Paulo, de Wesley Safadão. No backstage, foi abraçado por fãs e empresários convidados na área privativa do evento. Vale lembrar que, em novembro, Safadão gravou uma música de Ivis para o DVD "WS On Board".

No último domingo (5), Tarcísio do Acordeão convidou Ivis a subir ao palco do evento Noite de Piseiro, em São Bernardo do Campo (SP). Ele só não se apresentou porque foi amplamente vaiado pelo público. Ivis também já tem até o seu retorno à música programado com uma parceria. O escolhido, no entanto, não foi um grande nome, mas sim um cantor em ascensão: Marcynho Sensação, dono do sucesso "Rolê", produzido pelo paraibano. O novo clipe foi gravado no último dia 3 com um grupo de dançarinas.

Um reforço de peso ao perdão veio ainda neste final de semana, quando João Gomes, fenômeno do momento do piseiro, comentou uma foto com o paraibano com um texto que o pinta como vítima: "Bom curtir perto de você, ver que está bem. Quantos motivos para agradecer já me deu. Que Deus lhe abençoe e cuide de todos os seus planos. Ele tem algo especial reservado em sua vida ainda. Sua música é boa e faz alegria. É o que o povo precisa. Se cuide".

É interessante pensar que o apoio de João Gomes não vem apenas de uma espontaneidade do próprio cantor, mas sim de um aval que envolve diversas instâncias por trás desse jovem de 19 anos, que tem cobrado cachê de R$ 400 mil por show.

Produtor merece "segunda chance"?

Nas redes, muito se fala sobre uma "segunda chance", o que retoma a reflexão sobre os recortes sociais, raciais e econômicos desse perdão. O mesmo ocorreria se ele fosse um anônimo, pobre ou negro? Se não tivesse o apoio de grandes celebridades e empresários de um meio ainda tão machista e dominado por homens que é do forró?

Além disso, o Brasil é um país com índices alarmantes de violência contra a mulher. De acordo com recente pesquisa do Instituto Datafolha encomendada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), uma em cada quatro mulheres afirma ter sofrido algum tipo de violência no último ano no Brasil, durante a pandemia.

E é a naturalização dessa realidade que certamente fará o país continuar ouvindo novas produções de DJ Ivis. Talvez sem vinhetas com o seu nome, mas continuará, o que muito diz sobre a nossa indústria musical, cultura e sociedade.

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