Ogum é o orixá responsável por ensinar aos homens a caça, o trabalho com o ferro e as artes da forja e da guerra. Também é o orixá do músico pernambucano Maciel Salú, que buscou materializar o significado dessa entidade na faixa que dá título ao seu novo disco, "Ogum".
Cinco anos após o disco manifesto "Liberdade", o indicado ao Grammy Latino retorna com um trabalho ainda mais fincado nas tradições de terreio, com fortes referências da cultura popular e religiões afro-indígenas - flertando ainda com cumbia e afrobeat.
Assim, o artista segue mesclando melodias ancestrais e referências nordestinas com a sua pesquisa na música contemporânea pernambucana - com timbre vocal grave e reconhecida experiência na rabeca.
"Em Ogum, a gente traz um pouco mais das peles, do Ilú, das congas, da alfaia. Na música-título, uma guitarra e um baixo fazem parte do arranjo, que traz elementos de terreiro, mas com outra roupagem. Os arranjos são construídos por mim e pelos integrantes da banda", explica Maciel.
O título do disco foi escolhido para homenagear o seu orixá, que se materializar justamente através da música.
A história da construção da faixa, inclusive, guarda um fato curioso. O músico escreveu a primeira parte no dia 23 de abril de 2022, data em que se celebra o Dia de São Jorge, que é associado a Ogum no sincretismo afro-brasileiro. A outra parte da faixa, no entanto, só foi feita na mesma data do ano seguinte, quando Maciel retornou à letra para concluí-la.
"No meu trabalho de palco, trago a rabeca, um instrumento de origem árabe, que é popularizada no cavalo marinho; trago o bombinho, que está no caboclinho, que está no coco; trago também a alfaia, que está no maracatu de baque virado, no coco; o ilú, que está no terreiro de candomblé, no terreiro de jurema e outros, que junto com bateria, guitarra, baixo e, numa delas, teclado. Tudo isso vou vivenciando. A gente pode ir experienciando a novidade, mas sem perder a minha identidade, a origem do meu trabalho", pontua o artista.
Antes de homenagear o orixá, Maciel ainda faz referência às suas vivências no Maracatu Rural em "Os Caboclos no Terreio", que abre o disco.
A faixa apresenta uma necessária reflexão sobre a valorização dos mestres e mestras, como também dos outros folgazões, considerando todo o cenário das sambadas de maracatu no interior do Estado de Pernambuco.
"A cultura popular é minha vida, não sei viver sem ela, é ela que me dá inspiração para tudo o que sou hoje. Escuto também outras culturas, mas maracatu rural, ciranda, cavalo marinho, coco, a cultura dos Povos Originários, além de música caribenha - gosto muito de Ibrahim Ferrer e Bob Marley - música africana, frevo e forró, gosto muito de escutar", diz o artista, que lidera o Movimento Azougue, que busca o reconhecimento da cultura popular e tem raízes na Mata Norte.
Dando continuidade ao roteiro sono, "Ciranda da Saudade" versa sobre uma história de amor de uma pessoa que se entrega a um relacionamento, mas sofre com a partida da pessoa amada e se pega constantemente revisitando as lembranças de tudo o que já viveram juntos.
A temática romântica também está presente em "La Cumbia Morena", porém com versos que exploram os imaginários da típica gafieira. A canção Baila, por sua vez, intensifica o mergulho de Maciel Salú nos ritmos afro-caribenhos com uma cumbia que convida todos e todas para dançar.
Salú já foi indicado ao Grammy Latino na categoria Melhor Álbum Regional de Música Brasileira com um de seus projetos paralelos, a Orquestra Contemporânea de Olinda; e com o projeto Orchestra Santa Massa ganhou reconhecimento através do BBC Awards, do Prêmio Tim (melhor álbum) e do Prêmio Multicultural Estadão. Em cinco representativas faixas, "Ogum" é mais uma oportunidade para conhecer o artista.