"Morder a realidade como um cão danado que descobriu que viu a vida". A frase é de José Cláudio, pintor que também foi grande crítico de arte e escritor, em texto crítico sobre uma mostra de Maurício Arraes. Na ocasião, o artista vivia os seus dos primeiros anos da inserção no campo das artes.
Tratava-se de uma mostra no lobby do icônico Hotel Nacional, no Rio de Janeiro, em 1981. Após o falecimento de Cláudio em dezembro, o trecho foi resgatado para dar nome à nova exposição de Arraes, em cartaz na Arte Plural Galeria (APG), no Bairro do Recife, a partir da quinta-feira (4).
"Não se trata de uma homenagem a José Cláudio, mas de uma atualização, também, da verve da escrita crítica do artista recém falecido", diz a curadora e pesquisadora Joana D'Arc Lima.
"Para Maurício Arraes, a frase que dá nome à exposição faz referência a maneira crua e de perto ou de dentro como a realidade é apreendida e pintada", continua. O funcionamento da galeria é de segunda a sexta-feira, das 9h às 18h; e no sábado das 14h às 18h.
Obras
Na mostra, a frase é usada para atualizar um conjunto de trabalhos que transpassam a complexidade, o imponderável e a simplicidade da vida. São 36 trabalhos em telas e pinturas em papel, inclusive um trabalho desenvolvido quando Maurício estava na Argélia - país em que seu pai, Miguel Arraes, foi exilado durante parte do regime militar.
Outras obras foram produzidas quando o artista morou em Paris. As telas transportam o visitante por um passeio por ruas, praças, bares, botecos e outros espaço tanto públicos como privados, onde o artista andou ou imaginou os recriando.
Processo de criação
As telas carregam uma certa atmosfera do sensível, inspirando a criação de muitas histórias. "O corpo é colocado o tempo todo dentro da narrativa visual, seja numa escala menor, em último plano, quando na paisagem um objeto encena a cena (bicicleta), ou quando o assume o protagonismo da cena, adentrando de corpo todo o plano principal da narrativa histórica", diz D'Arc.
Outro ponto que ela ressalta é o processo de criação do artista. "É cinematográfico. Ele capta imagens de suas experiências de deambulações por espaços públicos, recorta existências, por meio de cenas/flagrantes de uma condição humana banal, ordinária, às vezes imperceptível aos nossos olhos, sendo, portanto, reconhecíveis por nós quando se tornam imagens pictórica", completa.
Cidades invisíveis
"Podemos afirmar que estamos diante de raridades no conjunto da obra deste artista", diz a curadora, ressaltando que cada visitante, a seu modo, pode participar das cenas como um possível voyeur nessas "cidades invisíveis".
"José Cláudio, poeticamente nos dá a ver o que talvez seja uma grande permanência no modo de ver e transver o mundo de Maurício Arraes", finaliza.
Com uma trajetória de mais de 40 anos dedicados à arte, expôs e participou de salões e coletivas regularmente em várias cidades do Brasil. Produziu também vários trabalhos gráficos e cenários para o teatro e cinema.
SERVIÇO
Exposição "Morder a realidade como um cão danado que descobriu que viu a vida", de Maurício Arraes
Quando: visitação ao público a partir do dia 14.03.2024, no horário de funcionamento - segunda a sexta-feira, das 9h às 18h, e aos sábados, das 14h às 18h
Onde: Arte Plural Galeria (rua da Moeda, 140, Bairro do Recife)
Quanto: Gratuito