Interromper o isolamento social antes da hora poderá resultar em efeito pior para a economia do que a inevitável recessão causada pelo distanciamento. Pernambuco está em plena aceleração da covid-19 e, na direção contrária, as pessoas afrouxaram na recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS) de ficar em casa. Nesta quinta-feira (16) o Estado registrou mais 199 casos e 17 mortes, totalizando 1.683 notificações e 160 óbitos. As autoridades de saúde alertam que se o aumento de casos andar mais rápido do que a capacidade de criação de leitos, a saúde poderá entrar em colapso e, provavelmente, o sistema funerário também.
Estudo recente de três pesquisadores do Federal Reserve (FED) - o Banco Central dos Estados Unidos - aponta que a opção por medidas restritivas são mais eficientes para a recuperação econômica. Baseado na Gripe Espanhola de 1918, o trabalho mostra que as cidades norte-americanas que apostaram no isolamento social na época se recuperaram mais rapidamente no pós-crise. Um dos aspectos analisados pelo estudo do FED é a velocidade da retomada do emprego após a pandemia. Uma cidade que realizou quarentena de 50 dias, registrou um aumento de 6,5% nos postos de trabalho no ano seguinte à Gripe Espanhola, em 1919.
O economista e professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), André Magalhães, diz que não se trata de defender o isolamento social e esperar que a economia se acabe, mas que também não é possível todo mundo abandonar o isolamento social e sobrecarregar o sistema de saúde. “Se todo mundo sair da quarentena, de uma forma ou de outra a economia vai parar porque as pessoas ficarão doentes. Nos últimos dias o movimento nas ruas tem aumentado. É natural que depois de um mês em casa e com a falta de perspectiva de quando isso vai terminar as pessoas queiram sair, mas do ponto de vista da saúde é preciso evitar mortes desnecessárias. Sabemos alguns vão morrer porque a doença é séria, mas não dá pra sobrecarregar o sistema”, observa.
Do lado econômico, o Fundo Monetário Internacional (FMI) já projetou uma recessão mundial para este ano e uma quebra da expectativa do PIB brasileiro de 2,2% no início do ano para uma queda de 5,3%. Em Pernambuco não cessão as pressões de diversos setores pedindo a retomada das atividades, alegando demissões, assim como fez a construção civil esta semana.
Especialistas defendem que a situação do Brasil no enfrentamento ao novo coronavírus se agrava porque o tratamento do governo tem sido diferente em relação a outros países. Enquanto as grandes nações anunciam investimentos de trilhões de dólares para manter os empregos e a saúde financeira das empresas, por aqui o governo fala em um pacote de apoio a estado e municípios de R$ 127,3 bilhões e apoios às empresas que, em muitos casos, não se concretizaram.
“Este dilema de ter que optar entre o risco de pegar a covid-19 e ficar sem renda por causa do colapso econômico é provocado pela inexistência de ações do governo federal. O governo é o único ente da Federação com capacidade para, ao ampliar seu nível de endividamento, criar liquidez e injetar dinheiro direto para as famílias (com prioridade para as mais desassistidas) poderem ao mesmo tempo continuar a consumir o necessário para sobreviver e, neste consumo, manterem funcionando pelo menos as cadeias produtivo-industriais mais básicas, o que minimizaria um pouco a desaceleração econômica”, afirma Sidartha Soria e Silva, sociólogo econômico e professor da UFPE.
Autor de dissertação Recife, uma cidade doente: a Gripe Espanhola no Espaço Urbano recifense, o historiador Alexandre Caetano, diz que um dos pontos de preocupação com pandemia seja há 102 anos ou agora é a desigualdade social, que torna algumas populações mais vulneráveis. “Em 1918 Recife passava por um processo de urbanização e as populações foram sendo empurradas para os Coelhos e outras áreas. As pessoas eram desassistidas na questão social e de moradia. Viviam nos chamados pardieiros e foram atingidas pela doença. Agora se tem o mesmo receio de que o coronavírus chegue e avance na periferia”, compara.