"Aumentar imposto não vai gerar emprego", diz Luiza Trajano, do Magazine Luiza

A empresária foi entrevistada pela Rádio Jornal e falou sobre empreendedorismo e a carga tributária no Brasil
Gabriela Carvalho
Publicado em 24/07/2020 às 9:17
A presidente do Conselho do Magazine Luiza, Luiza Trajano, participou no programa passando a limpo nesta sexta-feira (24) Foto: REPRODUÇÃO/FACEBOOK


Em entrevista ao programa Passando a Limpo, da Rádio Jornal, nesta sexta-feira (24), Luiza Trajano, presidente do Conselho do Magazine Luiza e do Grupo Mulheres do Brasil, falou sobre o empreendedorismo na pandemia e o peso da carga tributária no País. De acordo com Luiza, mesmo com o aumento de tributos sendo pauta de discussão atualmente, é pouco provável que aconteça neste momento. 
Confira a entrevista da empresária:
 
Como empresária, você já ouviu muitas reclamações de empreendedores no Brasil a respeito do peso da carga tributária neste País. Como a senhora avalia essa realidade tributária no Brasil?

O que eu posso dizer é que a burocracia do País gasta de 3% a 10%, conforme o segmento, só que não vai para lado nenhum. Não vai para o governo, não vai para o povo e não vai para a empresa. Não dá pra você ter uma carga de burocracia que está atrapalhando de gerar emprego. Se vai virar um imposto único ou não, o que eu digo é para esquecer. Agora não vai ter aumento tributário. Não tem mais aonde passar aumento.
Desde o que eu me entendo por gente eu participo de comitê de reforma tributária. Precisa digitalizar o imposto no Brasil, precisa ser pago por digitalização. Nós temos que fazer uma grande corrente do nesse país para digitalizar o Brasil e combater a desigualdade social. Aumentar imposto não vai gerar emprego. Então esquece o aumento de imposto, ninguém vai deixar, não tem mais aonde fazer. Agora que tem que simplificar, tem. 
 
Você também descarta a CPMF?
Se a CPMF for para baixar imposto e para simplificar... Eu não quero entender se ela é uma CPMF. Eu parto de um único princípio que é simplificar por que a burocracia está grande demais. Eu não quero saber o que vai ser, eu quero simplificação e não aumento de imposto. Não importa o nome que ela vai ter, é importante que digitalize. 
Eu sempre trabalhei com a pequena e média empresa e sempre falei para procurarem o Sebrae, para se formalizar, por que senão não há vantagem. A formalização também outra coisa que precisa entrar no país.
 
Muitos empreendedores ainda estão tentando se adaptar a essas novidades tecnológicas para sobreviver nesse momento de pandemia. O que você pode dizer para esses empreendedores?

Duas coisas vão fazer diferença: atendimento e inovação. Hoje a inovação é tão forte todos os dias e você tem que ficar sempre atualizado. O Magazine Luiza sempre teve na veia a inovação e o atendimento. É uma característica nossa que não deixamos morrer. Tinha uma Rádio na cidade, em 1957, e a minha tia comprou essa loja chamada A Cristaleira, mas ela queria mudar o nome da loja. Então ela fez um concurso com os ouvintes na Rádio para poder escolher o nome. Eu tenho uma ligação com rádio por que sempre deu tão certo. A gente sempre foi inovador mesmo quando não tinha dinheiro, quando só tinha dinheiro para pagar as prestações.
E nós não esperamos chegar um momento certo para inovar.É isso o que eu acho que a epidemia pode trazer para muita gente. É o momento de ver porque eu estava sem fundo de caixa, por que eu estava longe do digital. É um momento também de você rever aquilo que você poderia ter feito e não fez, o que você fez e não deveria ter feito e o que deveria continuar fazendo.
 
A sua empresa se destaca pela implementação de um modelo humanitário de gestão. A gente vive um estado de exceção no meio de uma pandemia. Nesse momento, o que é que você aprendeu de mais importante?

O que eu aprendi de novo foi essa conexão digital. O Zoom já existia. Tanta coisa já existia, não é? É importante perceber que muita coisa ainda passa despercebido pela vida da gente, então eu acho que o que mais aprendi foi sobre a conexão digital. Não acho que ela vai ficar em pé sozinha, porque eu acho que o espaço físico é o que dá cultura, que dá a cola para gente, mas é impressionante como a gente custou para descobrir que a conexão digital era tão boa.

Sobre o sistema ganha-ganha, eu nunca tive dúvida disso. É muito mais difícil de ser implantado, mas é a única forma que você tem de consolidar e de sustentar um processo. Porque se você ganha e o outro perde, se o seu fornecedor perde, um dia você também vai perder. É nas relações de marido e mulher, é nas relações de todo mundo.
O que também fortaleceu muito para mim nessa pandemia foi o "ser" para poder "ter". A gente estava numa corrida desenfreada de ter. Muitas vezes, pelo poder e pelo dinheiro, as pessoas abriam mão do seu "ser". A gente com mais idade agora percebe que por mais dinheiro que as pessoas tenham, quando eles perdem a sua essência, elas perdem algo que as deixam muito mal. Isso é uma coisa que eu sempre lutei muito e lutar numa sociedade capitalista em que você precisa ter para depois ser, é difícil. Eu nunca abri mão do meu jeito do interior, nunca abri mão de ser mulher, nunca abri mão de chorar numa reunião e dizer que eu não sabia. isso muitas vezes assustava as pessoas. E isso é difícil numa sociedade competitiva. 

Outra coisa que eu acho que também me fortaleceu muito, foi pensar como a gente tem um espírito de colonizado no Brasil. Eu sou muito brasileira, o Magazine Luiza também. Esse tristeza toda nesse momento abriu uma fresta para as pessoas para de ser colonizada. Nós fomos (colonizados) por Portugal, depois veio os Estados Unidos, China e parece que tudo que está acontecendo abre uma fresta para o brasileiro assumir mais seu País, se sentir dono, valorizar o que nós temos.
Nós tivemos uma campanha de "Não demita", no qual eu entrei como convidada junto com mais 10 mil lojas. Eu fiquei impressionada como o brasileiro deu valor a isso. Então, depois dessa epidemia, as coisas que vão ficar para valer mesmo são coisas que já vinham acontecendo, como é o caso do digital.
 
Vinte e nove milhões dos lares brasileiros estão dependendo do auxílio emergencial. Estamos falando de 105 milhões de pessoas que estão diretamente dependendo do dinheiro do Governo. Como empresária, qual é o sentimento que isso passa? Quais são as ferramentas que os empresários podem utilizar para mudar esta situação?

Um país em desenvolvimento vive da renda e do crédito. A renda só é dada em um país como o nosso, que não tem poupança, através do emprego. Não tem outra forma de fazer isso se não for geração de emprego.
Eu sempre fui a favor da renda básica, do Bolsa Família, porque com fome a gente não vai fazer nada. Eu não sei como esse auxílio vai ficar, mas o que eu sou totalmente a favor e a minha família nasceu para isso, é gerar emprego. Eu lutei muito nessa pandemia para que medidas emergenciais saíssem logo. No momento de calamidade, a União tem que pôr dinheiro, por que senão o PIB é pior e o déficit é pior. A gente sabe que as pequenas e médias empresas são responsáveis por 85% dos empregos no país. Se não tiver emprego, volta a miséria. 
A gente tem que lutar para desburocratizar o país, para as leis trabalhistas serem mais fáceis, para que se possa gerar emprego. Eu não vejo outra forma. A minha luta foi para não demitir, [foi para] gerar emprego. As medidas [emergenciais] do governo foram boas, mas demoraram pra chegar.
Nós temos uma indústria que não é sucateada, como é o caso da Argentina. E agora começou a ser visto que o Brasil precisa começar a fabricar coisas também. A China tinha de tudo. Como ela poderia dar para outros quando se tem 1 bilhão de habitantes. Aí o mundo inteiro não tinha máscara, não tinha respirador.
 
Você participou do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social no governo Lula. Uma das primeiras medidas tomadas pelo governo do presidente Jair Bolsonaro foi extinguir o conselho. Você acha que, com a extinção do conselho, romperam-se as pontes entre o setor empresarial e o Palácio do Planalto?

Ainda estive no governo Dilma e no de Michel Temer. No último ano do governo Temer, a Patricia Audi, que tomava conta de conselho, fez uma dinâmica muito interessante. Deu condição da sociedade toda participar, tinha gente de todos os segmentos. Era uma forma de dialogar com a sociedade e deu condições de ser bem objetivo e de produzir bastante. Mas eu respeito cada dinâmica. Por exemplo, quando o Marcelo Silva assumiu meu lugar como CEO da companhia, eu respeitei a dinâmica que ele tinha, o que não podia perder era cultura da empresa. O meu filho Frederico, que assumiu agora, também tem uma dinâmica de trabalho. Eu respeito as dinâmicas de trabalho dos presidentes e não posso criticar. Agora eu acho que o diálogo e a troca faz muito bem.
Eu ainda tenho muito contato com as secretarias, com alguns ministros e até então eu acho que eles estão sempre escutando, especialmente agora durante a pandemia. Eu não sei como está sendo, sei que ele (Bolsonaro) recebe alguns empresários lá, mas é muito importante o diálogo e escutar todo mundo num processo democrático.
 
Fale um pouco sobre os avanços contra a desigualdade de gênero e sobre esse comportamento feminino que você disse ser imprescindível durante a pandemia.

Em 2013 a gente resolveu montar um grupo que começou com empresárias, o Mulheres do Brasil. Hoje nós temos muitos 19 causas, estamos em mais de 70 cidades e 15 países.O que eu mais escutei nas minhas lives eram pedidos para que eu me candidatasse à presidência, mas eu nunca me filiei a nenhum partido político. Não sou contra partidos, mas se vocês analisarem as grandes transformações dos países foram feitas através da sociedade civil. A gente quer ser o maior grupo político apartidário no Brasil, acredito até que já somos. Nós temos muitos segmentos como educação, saúde, cultura.

Eu sempre fui muito a favor da união do feminino com o masculino. Mas é fato que a mulher ainda ganha menos só pelo fato de ser mulher. É uma questão de caneta isso. Eu sempre falo para os homens: 'como é que uma filha/neta de vocês deve ganhar menos só por ser mulher?'. Ainda temos poucas mulheres nas diretorias, mas já tivemos um crescimento. Principalmente nos conselhos, que hoje temos 7% de mulheres formando conselhos em empresas.Vai levar 120 anos para se ter 20%. Então o Mulheres do Brasil entrou nessa cota. A cota é um processo transitório para se consertar desigualdades em qualquer nível. 
Vamos trabalhar pelo Brasil. Há três anos, por exemplo, nós já sabíamos que o SUS era o melhor sistema de saúde do mundo e, de repente, a epidemia trouxe isso. O Mulheres do Brasil agora está articulando, conversando com políticos. Por que não fazer uma gestão profissionalizante para que o SUS funcione e digitalizar esse SUS? 

Confira a entrevista na íntegra

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