MERCADO IMOBILIÁRIO

Casa própria mais distante: programa habitacional de Bolsonaro afunda e deixa brasileiros sem imóveis baratos

Inviabilidade do Casa Verde e Amarela reduz opções de modelo com subsídios de até 45 mil para compra da casa própria

Lucas Moraes
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Lucas Moraes
Publicado em 19/08/2021 às 13:50
BERG ALVES/JC IMAGEM
HABITAÇÃO A inflação corrói o poder de compra das pessoas e afeta as margens de lucro dos empreendedores, minguando a viabilidade - FOTO: BERG ALVES/JC IMAGEM
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Criado em 2020 com a promessa de alavancar a política habitacional na gestão Bolsonaro, o programa Casa Verde e Amarela tem “morrido aos poucos”. A constatação, agora, não é de grupos sociais que defendem políticas de habitação, mas do próprio mercado, que presencia uma fuga de construtoras do segmento em direção aos financiamentos com recursos da poupança, deixando os clientes sem opções mais baratas de imóveis, já que estão chegando a operar com saldo negativo para entregar obras listadas no programa.

Antes mesmo da criação do Casa Verde e Amarela, o Minha Casa Minha Vida já vivia uma escassez de novas construções nas faixas direcionadas à população de baixa renda. Os imóveis com maior subsídio e pagamentos praticamente simbólicos pelos moradores já não eram encontrados por falta de recursos da União. Agora, mesmo colocando maior carga sobre as costas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), o Casa Verde Amarela acumula também problemas nas faixas comerciais. O custo da construção chegou a níveis recordes, reduziu as margens de lucro das construtoras e tornou os empreendimentos desinteressantes.

“Temos notado que quem atuava no Casa Verde e Amarela está correndo para outros mercados. Não temos um levantamento exato sobre isso, mas pelo menos 50% das construtoras do segmento estão se movimentando nesse sentido. O Casa Verde Amarela está morrendo de ‘morte morrida’, morrendo aos pouquinhos”, diz o presidente da Associação das Empresas do Mercado Imobiliário de Pernambuco (Ademi-PE), Avelar Loureiro.

Atualmente, o Casa Verde e Amarela mantém três faixas de compra. Sem a faixa 1, que mantinha os subsídios com recursos do Orçamento Geral da União, o governo manteve a faixa 1,5, destinada a famílias com renda de até R$ 2 mil e subsídio de até R$ 47.500; a faixa 2, para famílias com renda de até R$ 4 mil e subsídios de até R$ 29 mil, e a faixa 3, destinada a famílias com renda de até R$ 7 mil. Entre as faixas, a taxa de juros varia entre 4,75% e 8,16% no Nordeste.

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Obras do Conjunto Habitacional Encanta Moça I e II - BERG ALVES/JC IMAGEM

A MRV, maior construtora do País que atua no nicho do Casa Verde e Amarela, tem buscado diversificar os segmentos de atuação em virtude das perdas com a atuação apenas no programa. “Ao longo do tempo, a gente percebeu que poderia estender o portfólio para outros segmentos, agora pensamos como plataforma de imóveis, indo desde o super econômico até o limite do Casa Verde Amarela e desenquadramento um pouquinho do programa para conseguir ter margem”, diz o gestor executivo da MRV, Luís Felipe Monteiro.

No Recife, os estoques ainda são predominantemente de imóveis que se enquadram no programa, mas a empresa já tem lançado imóveis na faixa dos R$ 300 mil, em parceria com a Moura Dubeux, e já tem no radar lançamentos na faixa dos R$ 250 mil, atendendo ao público no SBPE.

“Ainda é muito cedo para falar, aumentou- se a quantidade de produtos logo após a faixa do Casa Verde Amarela. Antes o programa era praticamente dominante no portfólio inteiro. Temos saído dessa dependência do FGTS para aproveitar clientes diferentes e produtos diferentes. A ideia não é perder no Casa Verde Amarela e ganhar no SBPE, mas continuar a crescer nos dois segmentos. O cliente que compra o faixa 3 talvez consiga comprar no funding do SBPE. Agora é natural que uma parte dos clientes não consiga comprar mais, por isso é importante que o governo apresente soluções para que as empresas não comecem a ser excludentes”, observa Monteiro.

 

COMPRA DE SEGUNDA MÃO

Com a migração das construtoras, no mercado local o que se tem visto é a oferta de imóveis com nomenclaturas comerciais que vão desde “Casa Verde Amarela luxo” ou “SBPE faixa 1”. As construtoras tentam se adaptar para conseguir orçamento e garantir a entrega da obra, enquanto os clientes tentam se esticar para alcançar o novo patamar de valores.

“Nas operações de mercado (faixa 2 e 3) o subsídio é dado pelo lucro do FGTS, não há o suficiente. Hoje, a gente deve estar com 3 mil habitações por ano (no Grande Recife) entre faixa 2 e faixa 3 , o que representa quase 80%. Faixas 1 (entrega do MCMV) e 1,5 basicamente não existem porque não tem recursos do Orçamento da União”, pondera Loureiro. No Grande Recife, o preço dos imóveis comerciais do Casa Verde Amarela giram em torno dos R$ 180 mil a R$ 190 mil. No SBPE, os apartamentos têm sido comercializados os valores sobem médios estão entre R$ 200 e R$ 400 mil.

“Em alguns casos a margem está até negativa. Quem vendeu há um ano atrás, com preço fixo do dia, levando em conta a inflação, entrega só para honrar o que foi contratado, mas não lança o próximo. Somando Minha Casa Minha Vida e Casa Verde Amarela vamos para 12 anos, quem comprou até 2016 tem vendido o imóvel e passado para um novo no SBPE, esses estão migrando e abrindo imóveis já prontos, isso é o que tem sido absorvido pelas pessoas de baixa renda”, afirma o presidente da Ademi-PE, que também está à frente da construtora ACFL, atuante na baixa renda. Segundo loureiro, 20% dos clientes no SBPE já foram do Casa Verde Amarela, enquanto pelo menos 10% dos que buscam o Casa Verde Amarela estão comprando imóveis usados.

Nos dados da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), o Casa Verde Amarela registrou alta de 17,5% no último trimestre móvel e 46,6% em 2021 (janeiro a maio). O médio e alto padrão cresceu muito mais. A alta foi de 339,4% no último trimestre móvel, chegando a 178,5% no ano.
Para tentar estimular o programa, o governo federal já se prepara para no mês de setembro, segundo o ministro de Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, apresentar mudanças para o Casa Verde Amarela, entre as propostas está o reajuste das taxas de juros e aumento do valor teto cobrado pelo imóveis.

A expectativa é de que a faixa três seja ampliada, aumentando o teto do valor dos imóveis em 10%, o que pode levar o preço no Recife para R$ 209 mil; e no Grande Recife, R$ 198 mil. Além da redução da taxas de juros, de 8,1% para 7,16% na faixa 3 do programa, evitando a saída para o SBPE.

 

FILIPE JORDÃO/JC IMAGEM
Conjunto Habitacional inacabado na Comunidade do Pilar - FILIPE JORDÃO/JC IMAGEM

MUDANÇAS

Procurado, o MDR disse que as questões sobre as mudanças no Programa Casa Verde e Amarela ainda estão em discussão no Conselho Curador do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). “Somente após a aprovação por parte do Conselho é que serão divulgadas as novas regras”.

Sobre as entregas, a pasta indica que 352 mil unidades habitacionais por meio de empréstimos realizados diretamente por pessoas físicas com recurso do FGTS foram entregues, sendo quase 18% realizadas no Nordeste. “Além disso, houve entregas do Faixa 1 que totalizaram mais de 77 mil moradias e outras 218 mil residências do então Programa Minha Casa Minha Vida em todo o território nacional. No caso do Nordeste, a região foi responsável por 43,7% das entregas do Faixa 1 no período”.

Já sobre as contratações de financiamentos para a aquisição de imóveis por meio do Casa Verde e Amarela, o MDR registra um crescimento de 12% nacional e 24% no Nordeste na comparação com o ano passado, período mais intenso da pandemia da covid-19 e que o programa ainda não havia sido criado. A pasta justifica a alta na região pelos juros diferenciados.

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Obras do Conjunto Habitacional Encanta Moça I e II - FOTO:BERG ALVES/JC IMAGEM
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Conjunto Habitacional inacabado na Comunidade do Pilar - FOTO:FILIPE JORDÃO/JC IMAGEM
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habitação entregas no nordeste - FOTO:ARTES JC

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