Há 5 meses, o Instituto Vizinhos Solidários precisou substituir por soja, a carne bovina e o frango nas suas quentinhas. Responsável por doar alimentação para 8 mil pessoas por mês, a instituição também teve que 'inventar' novas receitas para reaproveitar ingredientes. Tudo isso para minimizar o impacto da inflação, que vem atingindo em cheio projetos de distribuição de alimentos no Brasil. Se de um lado os produtos estão cada vez mais caros, do outro aumenta o número de famílias buscando ajuda para não passar fome.
Na quarta-feira (11), o IBGE divulgou que a inflação oficial de abril atingiu 12,13% nos últimos 12 meses. É o maior patamar desde 2003, em um intervalo de quase 20 anos. No mês analisado, os principais impactos vieram de alimentação e bebidas (2,06%), com destaque para produtos essenciais ao dia a dia das famílias, como leite longa vida (alta de 10,31%), batata inglesa (18,28%), tomate (10,18%), óleo de soja (8,24%), pão francês (4,52%) e carnes (1,02%).
O encolhimento da renda das famílias e o avanço do desemprego empurrou mais pessoas para a extrema pobreza, provocando um aumento da demanda por doações. Na outra ponta, quem doa tem enfrentado a redução das contribuições aos projetos e o aumento nos preços dos alimentos. Hoje com R$ 100 no supermercado se compra bem menos do que em anos anteriores.
Com o aumento nos preços da carne e do frango, o consumo caiu nos últimos 3 anos e, em muitos casos, deixou de fazer parte do cardápio das famílias com renda menor. A situação se estendeu às iniciativas de doação de alimentos, que precisaram ser criativas e resilientes para manter um trabalho fundamental, sobretudo em um momento de pós-pandemia e de alto índice de desocupação no País. O jeito foi diminuir a quantidade de frango no sopão, como fez o Sopa Solidária, ou mesmo substituir a proteína, como decidiu os Vizinhos Solidários.
"As pessoas estão desesperadas. Recebo ligações até de madrugada de gente pedindo para conseguir um pacote de macarrão, uma cesta básica. A inflação foi muito impactante e nos obrigou a fazer mudanças. Passamos a usar soja de frango e de carne no lugar da carne e aprendemos a aproveitar e reaproveitar ingredientes. Hoje, por exemplo, fazemos brigadeiro de chuchu para oferecer de sobremesa e hambúrger de feijão. Além disso vamos substituindo outros ingredientes quando estão muito caros. O tomate e a cenoura são itens de riqueza", pontua a empreendedora social e fundadora do Instituto Vizinhos Solidários, Maria Eduarda Fernandes.
O Vizinhos Solidários surgiu como uma associação, em 2020, com o propósito de doar alimentos a pessoas em situação de vulnerabilidade durante a pandemia da covid-19. Começou atendendo a comunidade Sítio Cardoso, na Madalena (zona oeste do Recife) e hoje já são 18 localidades. Este ano foi transformada em Instituto para se habilitar à captação de recursos em editais.
Com sede no Pina, a instituição atua em três frentes: distribuição de marmitas nas ruas, mercado solidário e distribuição de cestas básicas. Atualmente o Vizinhos Solidários conta com 60 empresas parceiras e entre 200 e 250 doadores pessoa física. Um grupo de 32 voluntários dão conta de preparar as marmitas e as cestas, distribuir, cadastrar pessoas e fazer atendimento em geral. O Instituto recebe doações que vão de R$ 1,25 até R$ 5 mil, mas o valor médio é de R$ 50.
"Nós doamos 200 quentinhas por dia, distribuímos 1,3 mil cestas básicas por mês (com entregas diárias) e temos 611 pessoas abaixo da linha da pobreza cadastradas no mercado solidário", detalha Eduarda. Ela conta que antes eram necessários R$ 45 para custear uma cesta básica, mas que esse valor saltou para R$ 60.
A empreendedora social explica que para conseguir um preço melhor é preciso conhecer os meandros do setor de alimentos. Uma cesta básica tem prazo de validade médio de 30 a 60 dias, mas se as cestas estiverem em prazo final de validade de 15 a 20 dias é possível comprar por um preço melhor, porque os vendedores não querem perder a mercadoria. Como o consumo, no caso das doações, é imediato, diante da emergência de quem tem fome e está com os armários vazios, vale a pena adquirir nessa condição.
Ajude o Instituto Vizinhos Solidários a ajudar quem precisa
Site: vizinhossolidarios.org.br
PIX: 39.988.775.0001-52 (CNPJ do Instituto)
A alta nos preços dos produtos alimentares está obrigando iniciativas de doação de alimentos a reduzir o número de refeições oferecidas e a improvisar no preparo. A ordem é se virar com o que tem e manter os projetos ativos. Esta é a realidade do Sopão Solidário, projeto criado há 5 anos, que começou oferecendo refeições a moradores de rua e hoje atende a acompanhantes de pacientes internados em hospitais públicos de Pernambuco.
Fundador do Sopão Solidário, o vigilante e bombeiro civil, Joas Felipe de Oliveira, conta que antes da escalada nos preços dos alimentos, o sopão era distribuído com 400 pessoas. Atualmente o número foi reduzido a 300. "As pessoas foram perdendo a capacidade de doar. Tínhamos parceiros que nos entregavam 20 quilos de frango e hoje só nos entregam cinco quilos. Outro que doava cinco quilos de cenoura e reduziu para um. Até o número de voluntários passou de 150 para os atuais 108", compara. O malabarismo para fazer a sopa render é da esposa do fundador, Emanuele, que tem experiência na cozinha.
Diante da situação, o sopão é preparado com o que tem. Se antes eram utilizados 20 quilos de frango, agora são 15 quilos. A cenoura também escasseou diante da alta do preço no mercado. Além do Sopão, o grupo também doa kits de higiene. "Uma vez estivemos no Hospital da Restauração e a acompanhante de um dos pacientes nos relatou que estava há cinco dias sem tomar banho nem trocar de roupa. Conseguimos material de higiene pra ela, que ficou muito grata. São pessoas que vêm do interior, em sua maioria, e estão com poucos recursos", destaca.
A história do Sopão Solidário começou em 2017, quando Joás confidenciou a um grupo de amigos que não queria fazer festa de aniversário naquele ano. Seu desejo era fazer um sopão para distribuir. Criaram um grupo para doação e a história persistiu até hoje. "Na semana de distribuir o sopão a gente só tinha R$ 300, mas Deus ajudou e fomos angariando mais doações até chegar a R$ 1,2 mil. Com esse valor conseguimos fazer a sopa', recorda Joas.
A doação da sopa aontece mensalmente, em parceria com a Igreja Exército da Salvação, no bairro do Bongi. A Igreja cedeu o espaço para a preparação do sopão, que começa na sexta à noite e é conluída no sábado. O grupo decide os hospitais que vai visitar.
Neste sábado (21), o sopão será oferecido a acompanhantes de pacientes do Procape, Agamenon Magalhães e Getúlio Vargas. Durante a ação, além da sopa são distribuídos pães, garrafas de água mineral, café, leite, suco e kits de material de higiene pessoal.
Pelo Instagram do projeto @sopaosolidario, por meio do whatsapp na rede social