Os Estados Unidos alertaram, nesta sexta-feira (27), que a ameaça de atentados persiste em Cabul após o ataque mortal do Estado Islâmico, enquanto mais de 5.000 pessoas continuam dentro do aeroporto esperando para serem retiradas.
Pelo menos 72 civis e 13 soldados americanos faleceram no atentado, de acordo com diferentes autoridades. Algumas informações dos Estados Unidos sugerem que o balanço real poderia ser o dobro do esperado, mas as autoridades em Cabul não responderam aos pedidos de comentários feitos pela AFP.
Apesar da tragédia, as operações de retirada de estrangeiros e afegãos foram retomadas nesta sexta no aeroporto da capital afegã, embora vários países anunciaram que concluíram suas operações, entre eles Espanha, Itália, Noruega, França e Suíça. O Reino Unido terminará "em poucas horas".
Com isso, os Estados Unidos assumem praticamente sozinhos a tensa missão de concluir a maior operação de retirada da história até 31 de agosto, prazo estabelecido pelo presidente Joe Biden para encerrar os 20 anos de presença militar no país.
"Ainda acreditamos que há ameaças específicas e credíveis", disse o porta-voz do Departamento de Defesa americano, John Kirby. Apesar de tudo, os Estados Unidos acreditam que poderão retirar as pessoas "até o último momento".
"Vamos completar a missão", garantiu nesta sexta-feira o presidente Joe Biden, que lida com fortes críticas da oposição republicana por sua gestão da saída do Afeganistão.
Dentro do aeroporto há 5.400 pessoas, informou o Pentágono. Nas últimas 24 horas, apesar do ataque, conseguiu retirar 12.500 pessoas em um total de 89 voos americanos e da coalizão internacional.
Um porta-voz talibã, Bilal Karimi, afirmou pelo Twitter que os combatentes tomaram o controle de parte do aeroporto de Cabul, uma afirmação posteriormente negada pelo Pentágono, que garantiu que o local seguia "sob controle militar dos Estados Unidos".
O Pentágono revelou também que houve apenas um homem-bomba no "complexo" atentado de quinta-feira, e que não houve duas explosões separadas, como acreditou inicialmente.
'Pior dos cenários'
Cerca de 110.000 pessoas conseguiram sair do país através desta ponte aérea iniciada em 14 de agosto, um dia antes dos talibãs tomarem a capital, de acordo com o governo americano.
Vários países admitiram não ter conseguido retirar todos os afegãos que colaboraram com as forças internacionais nas últimas duas décadas de conflito e que podem se tornar alvos de represálias dos talibãs.
A França, que iniciou conversas com os talibãs na quinta-feira no Catar, informou que irá propor operações humanitárias com outros países para retirar de lá esses milhares de afegãos que ainda não foram resgatados.
"Continuaremos nossos trabalhos com os líderes talibãs para que não haja empecilhos", afirmaram em comunicado os ministros das Forças Armadas e das Relações Exteriores.
O chefe da diplomacia dos Estados Unidos, Antony Blinken, afirmou durante a semana que os talibãs se comprometeram a permitir que americanos e afegãos sob sua proteção deixem o país depois 31 de agosto.
Embora o vai e vem de aviões continuou nesta sexta-feira, a Casa Branca admitiu que houve menos voos do que em dias anteriores. Nas pistas do aeroporto foi possível ver muita gente amontoada esperando um avião.
A ONU afirmou nesta sexta que se preparava para "o pior dos cenários", com a possibilidade de haver cerca de meio milhão de refugiados afegãos adicionais até o fim do ano.
"Queria partir, como todo mundo"
O Talibã prometeu um regime menos rígido do que o imposto entre 1996 e 2001, baseado em uma interpretação fundamentalista da lei islâmica que é especialmente severa para as mulheres, que não podiam trabalhar, estudar ou sair de casa sem um acompanhante masculino.
As mulheres "podem trabalhar, podem estudar, podem participar na política e podem fazer negócios", afirmou Sher Mohammad Abbas Stanikzai, ex-negociador do Talibã nas fracassadas negociações de paz de Doha, em entrevista coletiva nesta sexta-feira.
As mulheres têm "um direito inato" de trabalhar, insistiu o líder, que também prometeu deixar os afegãos que trabalharam para a coalizão ocidental deixar o país.
Esse movimento islâmico permitiu que forças estrangeiras assumissem o controle do aeroporto de Cabul enquanto finalizavam a formação de um novo governo, que deve ser anunciado logo após a saída das tropas americanas.
Os talibãs também condenaram o atentado do EI-K (Estado Islâmico Khorasan), braço do grupo no Afeganistão e no Paquistão, por quem mantém um ódio visceral apesar de ambos serem grupos sunitas radicais.
A ameaça segue latente e os próximos dias "serão o período mais perigoso até o prazo", afirmou a porta-voz da Casa Branca, Jen Psaki.
O ataque da véspera semeou o pânico e o desespero. Nesta sexta-feira famílias ainda procuravam por seus conhecidos nos hospitais.
"Ele queria ir embora para o exterior. Não sei se conseguiu entrar no aeroporto, ou não, porque os americanos bloqueiam o acesso", contou Abdul Majid, em referência ao irmão, do qual não tem notícias desde quinta-feira.
"Era estudante, tinha talento, mas, devido à situação do país, ele queria ir embora, como todo mundo", acrescentou.