A França, entre os países com mais dias de escolas abertas durante a pandemia, viveu nesta quinta-feira (13) uma importante greve de professores, cansados da gestão governamental da crise sanitária, a três meses das eleições presidenciais.
Cerca de 77.500 pessoas se manifestaram em todo o país, 8.200 delas em Paris, segundo o Ministério do Interior, que registrou 136 protestos em toda a França.
"A raiva está sendo expressa. Há um sentimento real de frustração e o governo tem que perceber isso", alertou à AFP Guislaine David, líder do sindicato de professores da escola primária, Snuipp-FSU.
Desde o retorno às aulas em 3 de janeiro, após o recesso de fim de ano, o governo anunciou até três protocolos diferentes nas escolas, exasperando os professores e atraindo críticas da oposição.
"Estamos no 30º protocolo desde o início da crise sanitária", lamentou Vanessa Cognet, diretora de uma pequena escola rural em Châteldon (centro), denunciando que as novas instruções chegam um dia antes, tarde da noite.
Na segunda-feira, o primeiro-ministro Jean Castex anunciou o protocolo mais recente e um pouco mais flexível para acalmar a tensão. Mas os professores mantiveram a greve, com o ministro da Educação, Jean-Michel Blanquer, na mira.
Quando um caso positivo é detectado numa sala, o restante dos alunos deve realizar até três autotestes em casa para continuar frequentando a escola, sem ter que se submeter a um primeiro teste de antígeno ou PCR como anteriormente.
As medidas anteriores causaram longas filas em frente às farmácias de pais que em muitos casos deixavam o trabalho para apresentar testar os filhos, para que pudessem voltar às aulas no dia seguinte em caso de negativo.
Quase 12 milhões de teste foram realizados assim na semana passada, um aumento de 44%, segundo o Ministério da Saúde.
O aumento mais significativo foi no grupo de menores de 16 anos, que passou de 1 milhão para 3 milhões em média.
A França, país de 67 milhões de habitantes, registra aumento de casos de covid-19 por conta da variante ômicron. O número médio de infecções diárias nos últimos sete dias foi de 287.603, acima da média de 198.200 na semana anterior.
"Famílias perdidas"
Diante da situação, a maioria dos sindicatos apoiou a convocatória do Snuipp-FSU, que estimou em 75% o percentual de professores do ensino fundamental que em greve. O Ministério da Educação anunciou uma adesão de 38,5%.
O primeiro-ministro reuniu-se com os sindicatos à tarde.
Após a reunião, o ministro da Educação anunciou que serão distribuídos “5 milhões de máscaras FFP2” aos professores do ensino básico, sob pedido, e a contratação de “vários milhares” de substitutos “para fazer frente à crise”.
Apesar de a greve implicar que os pais procurem soluções para cuidar dos filhos, recorrendo ao teletrabalho ou babás quando podem, a principal federação de pais de alunos, FCPE, apoia o protesto.
"As famílias estão perdidas (...) Temos a impressão de que o que se busca é uma imunidade coletiva. O protocolo atual não protege as crianças", comentou à AFP Alice Gregorio, responsável da FCPE no noroeste de Paris.
A greve pode afetar a imagem do presidente Emmanuel Macron, que ainda não confirmou sua candidatura às eleições presidenciais de abril e cuja estratégia é manter as escolas abertas durante a pandemia.
De acordo com a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), a França fechou as escolas primárias por 34 dias de janeiro de 2020 a maio de 2021, menos que México (214), Brasil (178), Colômbia (152), Chile (98) ou Espanha (45).
"Podem dizer que as escolas estavam abertas, mas apenas metade das turmas estavam cheias", disse Gregorio, para quem a crise da covid agravou a já persistente falta de recursos humanos e materiais nas salas de aula.
Brice Tenturier, cientista político da Ipsos, comentou à AFP que os franceses têm até agora uma boa imagem da forma como o governo lida com a crise, mas alerta que, se a greve for massiva, "esse equilíbrio pode ser quebrado".
Os eventuais rivais de Macron, da esquerda radical à extrema direita, foram rápidos em denunciar sua gestão, que causou, segundo a direitista Valérie Pécresse, "desordem geral e caos nas escolas".