O presidente da Ucrânia, Volodimir Zelensky, convocou seus compatriotas, na noite desta sexta-feira (26), a defender Kiev, a capital, de um ataque iminente das tropas russas que invadiram o país. Civis alistados nas brigadas de "defesa do território", instituição criada em 2015 para reforçar o exército regular, são onipresentes em toda a cidade. Enquanto isso, os países ocidentais adotaram uma série de sanções contra entidades, empresas e autoridades russas, entre elas o presidente Vladmir Putin, em resposta à invasão.
Atualmente, basta ter entre 18 e 60 anos e passaporte para servir. O voluntário Roman Bondertsev, que decidiu lutar "para não ficar parado em casa" enquanto a Rússia invadia seu país, diz estar pronto para defender sua cidade metro a metro, seja qual for o cenário. Mas ele também não tem muitas esperanças.
"Eu nunca segurei uma arma em minhas mãos até hoje. O que você quer? Vamos tentar o nosso melhor", ele afirma, o semblante claramente abatido.
"E se eles me matarem, haverá outros dois prontos para tomar o meu lugar", promete.
"Eles distribuíram rifles, carregaram para nós e aqui estamos", diz Yuri Kortshemni, que nunca havia segurado uma arma nas mãos antes de se juntar a um batalhão de civis pronto para defender Kiev metro a metro do inimigo russo.
Em plena invasão de seu país, quando as primeiras forças russas precisaram de menos de 48 horas para se infiltrar na capital, o historiador de 35 anos não hesitou.
Dezenas de homens de seu bairro o acompanharam para receber um fuzil Kalashnikov em um ponto de distribuição, um caminhão militar cheio de caixas de armas, explica.
No Facebook e na mídia, o Ministério da Defesa multiplica os pedidos de alistamento emergencial nas brigadas de "defesa territorial".
Vestindo jeans, roupas esportivas, tênis ou uniformes, os voluntários civis da "defesa territorial" são agora onipresentes na capital, ainda mais visíveis do que os militares regulares.
Para se reconhecerem, eles usam uma pequena braçadeira amarela, às vezes apenas uma fita adesiva, em volta do braço esquerdo.
Em uma cidade praticamente fantasma, seu constante ir e vir é óbvio. O cerco do inimigo se aproxima perigosamente sobre a capital e todos se preparam para um combate sangrento.
Mas, por enquanto, os russos, embora muito presentes nos arredores, só foram vistos em alguns primeiros combates furtivos no bairro de Obolon, nesta sexta-feira, no norte de Kiev.
Os voluntários civis deste distrito encontraram-se, para seu azar, na linha de frente. Seu quartel-general está localizado a poucos metros do local onde um comando de três veículos blindados supostamente russos espalhou o medo, abrindo fogo contra um civil e esmagando um carro.
A vítima ensanguentada ainda está deitada no chão.
Mas os novos recrutas não prestam mais atenção no cadáver: eles estão ocupados recebendo um treinamento militar rudimentar e improvisado no estacionamento adjacente.
"Temos um inimigo muito poderoso à nossa frente", justifica o seu comandante, com o nome de guerra "Bob", um engenheiro informático de 51 anos com um olhar azul penetrante, portando um fuzil de assalto nas mãos.
Este armamento "não é suficiente para deter os helicópteros, nem para lidar com tanques", lamenta, pedindo à comunidade internacional que forneça armas ao seu país.
"Temos que parar Moscou, temos que parar o inimigo", insiste.
Sanções contra a Rússia
União Europeia
A União Europeia (UE) decidiu nesta sexta-feira (25) sancionar, com o congelamento de ativos, o presidente da Rússia, Vladimir Putin, e seu ministro das Relações Exteriores, Serguei Lavrov, pela ofensiva militar russa na Ucrânia.
Os líderes da UE haviam aprovado politicamente um pacote de sanções à Rússia na quinta-feira e nesta sexta os chanceleres europeus concordaram que Putin e Lavrov sejam incluídos na lista de pessoas afetadas.
"O presidente Putin e o ministro das Relações Exteriores Lavrov estão na lista de pessoas sancionadas", disse o chefe da diplomacia europeia, Josep Borrell, ao fim de uma reunião de emergência dos chanceleres. Com a definição dos detalhes das sanções, a UE limitará “significativamente a receita financeira da Rússia”. "Atingimos 70% do sistema bancário russo e empresas estatais", acrescentou.
Borrell ressaltou que as normas a serem aplicadas são as mesmas que para qualquer outra pessoa incluída na lista da UE. "Ou seja, trata-se do congelamento de bens. Haverá todo um trabalho (...) para identificar os bens a serem congelados", explicou.
Borrell acrescentou que no encontro discutiu a situação e a possível sanção de Putin e Lavrov com altos funcionários da China e da Índia, explicando a eles "que não se trata apenas da Ucrânia, mas do respeito às normas internacionais".
Além de Putin e Lavrov, Borrell disse que estão sancionados "os membros restantes da Duma russa (câmara baixa do parlamento) que apoiam essa agressão".
Estados Unidos
O presidente dos EUA, Joe Biden, endureceu as medidas tomadas contra a Rússia nesta sexta-feira, acrescentando Putin e Lavrov à lista de autoridades punidas e proibidas de entrar no país, um ato incomum e com força simbólica.
Os Estados Unidos irão sancionar o "Russian Direct Investment Fund", fundo soberano de Moscou que busca atrair investimentos para a sua economia.
A primeira bateria de medidas afetava quatro bancos russos, entre eles os dois maiores do país (Sberbank e VTB Bank), e suprimia mais da metade das importações tecnológicas. Também proibiu a gigante de energia Gazprom e outras grandes empresas do país do financiamento em mercados ocidentais, medida que já havia sido aplicada contra o governo russo.
Os Estados Unidos também ampliaram a lista de oligarcas russos penalizados e limitaram as exportações para a Rússia de produtos tecnológicos destinados aos setores de defesa e aeronáutica. Além disso, Washington anunciou sanções contra 24 indivíduos e organizações bielorrussas, anunciou o Departamento do Tesouro.
Reino Unido
Londres também congelou os ativos de Putin e Lavrov e fechou seu espaço aéreo a aviões privados de oligarcas russos. Antes, o Reino Unido havia fechado seu espaço aéreo à empresa russa Aeroflot e imposto sanções contra bancos e exportações tecnológicas.
Além dos cinco bancos sancionados na terça-feira, o gigante VTB está na mira e teve seus ativos em solo britânico congelados, assim como a fabricante de armas Rostec.
Canadá
O primeiro-ministro Justin Trudeau anunciou sanções contra Vladimir Putin e Serguei Lavrov, e também contra Belarus. No total, cerca de 60 pessoas ou entidades do círculo de poder russo, incluindo a empresa de segurança privada Wagner, serão punidas.
O Canadá também cancelou licenças de exportação para a Rússia no valor de 550 milhões de dólares em mercadorias, principalmente dos setores aeroespacial, de tecnologia da informação e de mineração.
Asia-Pacífico
A condenação nessa região foi menos unânime. A Índia, que tem relações estreitas com a Rússia, absteve-se de sanções, assim como a China, aliada de Moscou e que diverge de Washington.
Em acordo com seus parceiros do G7, o Japão anunciou nesta sexta-feira sanções adicionais contra Moscou pela invasão da Ucrânia, que afetam o setor financeiro russo e a exportação de componentes eletrônicos para a Rússia.
"As sanções incluem o congelamento de bens e a suspensão da emissão de vistos para indivíduos e organizações russas", declarou o primeiro-ministro Fumio Kishida em entrevista coletiva em Tóquio, após uma reunião virtual com líderes do G7.
Kishida também anunciou sanções "no setor financeiro, como o congelamento de ativos de instituições financeiras russas" e medidas "sobre exportações para organizações russas ligadas às forças armadas" e sobre "bens de uso geral, como semicondutores".
Taiwan também anunciou sua intenção de tomar medidas, mas não divulgou detalhes.
A Austrália reforçou neste sábado suas sanções contra a Rússia, visando oligarcas e membros do Parlamento, e seu governo indicou que prepara medidas para punir diretamente o presidente Vladimir Putin, como fizeram seus aliados.
A ministra das Relações Exteriores, Marise Payne, anunciou à imprensa a imposição de sanções financeiras a oito oligarcas próximos a Putin e 339 parlamentares que facilitaram a invasão da Ucrânia.
O segundo dia de invasão russa
Nesta sexta, as tropas invasoras lançadas pelo presidente russo, Vladimir Putin, chegaram a um bairro ao norte de Kiev, mas logo pareceram perder forças. Pela noite, combates foram registrados em Vasilkov, cerca de 30 km ao sul da capital.
No local, as tropas ucranianas abateram um avião de transporte Il-76 e travavam "combates violentos" contra os russos que "tentam descarregar tropas pelo ar", disse o Ministério da Defesa neste sábado, relatando também a destruição de um helicóptero e um caça no leste do país.
O secretário-geral da Otan, o norueguês Jens Stoltenberg, elogiou a mobilização das forças ucranianas, "que lutam com coragem e mantêm sua capacidade de causar perdas às forças invasoras russas".
A ofensiva russa provocou a fuga de mais de 50.000 ucranianos do país, assim como 100.000 deslocados internos - segundo a ONU - e mais de 100 mortos, de acordo com Kiev.
Vladimir Putin exortou o exército ucraniano a "tomar o poder" e chamou o governo Zelensky de "gangue de viciados em drogas e neonazistas".
Zelensky respondeu com a divulgação de um vídeo gravado em frente ao palácio presidencial. "Estamos todos aqui, nossos militares estão aqui, os cidadãos, a sociedade, estamos todos aqui, defendendo a nossa independência, o nosso Estado", proclamou, ao lado de seus principais colaboradores.