Educação: um barco à deriva

Muito dinheiro já foi investido no novo Ensino Médio. Só do governo federal este investimento já chega a R$ 2,6 bilhões. Mas, considerando o tamanho das redes públicas e os desafios vinculados a esta última etapa da Educação Básica, será preciso investir ainda mais
MOZART NEVES RAMOS
Publicado em 10/10/2022 às 6:11
Provas do Enem foram realizadas em novembro do ano passado Foto: FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM


Cresce a preocupação no meio educacional quanto ao novo Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), pois até aqui – e o ano já está terminando –, as matrizes de referência não foram divulgadas pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) do Ministério da Educação (MEC).

Já deveriam ter sido produzidas há tempo, estão muito atrasadas, e sem elas as instituições e os especialistas não têm como elaborar itens que deverão, por sua vez, compor as provas do Enem.

E sem os itens devidamente testados fica comprometido o modelo da teoria da resposta ao item (TRI), já que tais testagens permitem classificar cada um deles pelo grau de complexidade, estabelecendo níveis de comparabilidade entre as diferentes edições do exame.

As redes e os sistemas de ensino estão oferecendo, conforme manda a legislação, o 1º ano do novo Ensino Médio sem saber se estão ou não no caminho certo, cuja estrutura é constituída de uma parte comum de 1.800 horas para todos os alunos e uma parte flexível de 1.200 horas amparada nas quatro grandes áreas do conhecimento, permitindo assim que o aluno possa optar por aquela que melhor se identifica com o seu projeto de vida.

Em conformidade ainda com a legislação vigente, este novo Ensino Médio deve estar plenamente implantado até 2024 em todas as escolas públicas e particulares do país.

Uma luz de esperança se acendeu com a chegada de um técnico de carreira para presidir o Inep. Carlos Moreno é muito querido e respeitado na área da educação, mas o tempo poderá ser seu grande inimigo no cumprimento da tarefa de ter ainda este ano as tais matrizes de referência.

Produzir e testar itens leva tempo e é caro. A boa notícia é que todas as redes de ensino já homologaram seus novos currículos no âmbito de seus Conselhos Estaduais de Educação.

Muito dinheiro já foi investido no novo Ensino Médio. Só do governo federal este investimento já chega a R$ 2,6 bilhões. Mas, considerando o tamanho das redes públicas e os desafios vinculados a esta última etapa da Educação Básica, será preciso investir ainda mais, especialmente no campo da formação de professores, de tal maneira que eles estejam preparados para trabalhar na parte flexível desse novo Ensino Médio, os chamados itinerários formativos. Isso sem falar no quinto eixo, relativo ao Ensino Técnico Profissionalizante.

A estratégia majoritariamente seguida pelas escolas é trabalhar na parte comum neste primeiro ano e deixar a parte flexível para 2023 e 2024, esperando assim pelas matrizes de referência – a bússola para que elas possam oferecer com segurança o novo Ensino Médio. Um barco sem bússola fica à deriva – e é o que está acontecendo agora como o novo Ensino Médio.

Segundo a presidente do Conselho Nacional de Educação (CNE), Maria Helena Castro, as mudanças em curso não vão apenas impactar positivamente a vida dos estudantes, mas também servem de estímulo para que as próprias universidades mudem as suas estruturas curriculares.

Mozart Neves Ramos, titular da Cátedra Sérgio Henrique Ferreira da USP de Ribeirão Preto e professor emérito da UFPE

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