OPINIÃO

O Memorial da OAB/PE Presidente Fernando Coelho: conhecer, preservar, proteger

Tribuno dos direitos humanos, paraibano de nascimento, pernambucano por adoção, Fernando Coelho é para a advocacia democrática deste nosso Estado berço de fundação dos primeiros cursos jurídicos.

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Gustavo Henrique de Brito Alves Freire

Publicado em 05/09/2023 às 0:00 | Atualizado em 05/09/2023 às 15:50
- Vivian Ramos

No ensejo das muitas comemorações pelo mês da advocacia (agosto), foi inaugurado no térreo do prédio histórico que abriga a sede da OAB/PE um espaço memorial, que retrata a linha do tempo visual das pouco mais de nove décadas de existência da entidade.

Não é apenas um lugar para pesquisas ou visitação rápida, mas para reflexões. Aliás, Cícero, na antiguidade ocidental, dizia que a história é testemunha do passado, luz da verdade, vida da memória, mestra da vida, anunciadora dos tempos antigos. Logo, é muito mais previsível errar e reincidir no erro quando se despreza ou se é indiferente aos ensinamentos do passado.

A preservação do conhecimento nos define enquanto sociedade e justifica a própria civilização. Não sem razão, Lucien Febvre (1878/1956) sustentava a impossibilidade de fazer a História sem documentos escritos, enquanto Charles Samaran (1879/1982) afirmava que sequer haveria História sem eles.

Consciente disso, a direção da OAB/PE concebeu e levou adiante a feliz ideia de um espaço permanente capaz de fazer chegar ao conjunto dos pernambucanos e para muito além das fronteiras estaduais o quanto a entidade é muito mais do que aparenta aos leigos, não se limitando a um cartório ou a uma repartição que expede e arquiva documentos de natureza identificadora.

O Memorial que agora se aglutina à sede da OAB/PE carrega o nome do ex-Presidente Fernando Coelho (1932/2019), que conduziu com insuspeito espírito democrático os rumos da Casa no biênio 1985/1987, exatamente quando o Brasil se libertava das garras amoladas da ditadura. Foi, também, Deputado Federal e Coordenador-Geral da Comissão Estadual da Memória e Verdade Dom Hélder Câmara. Dar o nome a um ambiente tão marcante de alguém assim é, sem dúvida, ratificar a transcendência da OAB. Fernando Coelho, por sinal, também intitula o Memorial da Democracia de Pernambuco, no Sítio da Trindade, bairro de Casa Amarela, ambiente inteiramente dedicado à memória dos que combateram a ditadura, acabando mortos ou desaparecidos durante aquele período de trevas e escuridão.

Tribuno dos direitos humanos, paraibano de nascimento, pernambucano por adoção, Fernando Coelho é para a advocacia democrática deste nosso Estado berço de fundação dos primeiros cursos jurídicos, ao lado de outras figuras, o que nacionalmente representaram e ainda representam personagens como Raimundo Faoro e José Cavalcanti Neves, entre outros. Biografias consequenciais que, sempre lidas juntas, compõem o mosaico daquilo que a advocacia é efetivamente e nasceu para ser.

Nessa viagem pelo tempo que se inicia em 1932, recordo meu avô Antônio e meu tio Roque, seu irmão, o primeiro sendo nome de medalha que a OAB/PE instituiu em 2018, o segundo presença assídua na casa em palestras incontáveis, dois símbolos-faróis, assim como Fernando Coelho foi e é, de ética, altivez e espírito solidário, para que jamais se perca de mira a certeza de que, para se enxergar mais longe, deve-se preferir sempre os ombros dos gigantes.

Parabenizando os idealizadores e executores desse projeto, despeço-me citando o advogado Marcelo Santa Cruz, em artigo de homenagem a Fernando Coelho, publicado em 25/4/2019, quando, ao defini-lo, se socorreu de um episódio que diz mais que qualquer elogio: “Em 1974, Fernando era candidato a Deputado Federal, plena ditadura, nesta oportunidade, por iniciativa própria, mamãe Elzita Santa Cruz bate no final da tarde nas portas da residência de Fernando Coelho, que atenciosamente atende e segue para gravar o seu Guia Eleitoral, foi pela primeira vez que, burlando a censura, foi tornado público que meu irmão Fernando Santa Cruz e o seu companheiro de lutas, Eduardo Collier Filho, foram sequestrados em 23/02/1974, desaparecidos políticos, assassinados sob torturas. Assim era Fernando Coelho, corajoso, destemido, aquela sua atitude em ter desafiado a censura lhe custou não mais se apresentar no Guia Eleitoral”. Homens assim não morrem. São atemporais. Estão sempre presentes. Que as atuais e futuras gerações, inclusive, na advocacia, se mirem no exemplo desses personagens maiúsculos, escrevendo um futuro promissor.

Gustavo Henrique de Brito Alves Freire, advogado

 

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