A semana passada, um juiz foi assassinado com três tiros à queima-roupa em uma movimentada via pública da cidade do Jaboatão dos Guararapes, na grande Recife.
Esta semana, a milícia, em consórcio com o crime organizado, incendiou 35 ônibus e um trem, no Rio de Janeiro, como vingança pela morte de um bandido em confronto com a polícia.
Quase todas as semanas convivemos com notícias cuja manchete aponta violência sem controle.
Os defensores da lei de Talião se agigantam a cada novo caso e se fortalecem para agirem pelas próprias mãos contra a ausência de segurança pública.
Os defensores de projetos sociais inclusivos, instalados nas comunidades dominadas pelo crime organizado, sofrem para defender seus métodos pela incapacidade de transformá-los em ações concretas.
Como lidar com a violência individual e coletiva que cresce exponencialmente na sociedade moderna?
Em 2010, o Rio de Janeiro vivia dias de terror - assassinatos, queima de ônibus, fechamento de vias públicas e áreas liberadas apenas para o crime organizado.
O governo federal, ciente da importância de conter a escalada de barbaridades, propôs ao governo estadual uma operação de garantia da lei e da ordem nos morros do Alemão e da Penha, comunidades da zona Norte da cidade.
As cenas de investimento das forças de segurança sobre os dois complexos rodaram o mundo. A imagem de bandidos amedrontados, fugindo em motos, pick-ups e até a pé trouxe a sensação de que o poder do Estado era mais forte que o das organizações criminosas.
Retomada a região, foi mantida uma estrutura de segurança com uma combinação de forças federais e estaduais por mais de ano.
Em 2011, fui comandante de uma das forças de pacificação naquela área e pude avaliar a evolução da operação.
A população estava feliz, a venda de drogas diminuiu acentuadamente, as escolas e creches voltaram a funcionar, os pais e mães podiam ir trabalhar certos de que voltariam no final da tarde e encontrariam seus entes queridos em seus lares.
Infelizmente, apenas a segurança não resolveu o problema. O Estado, como agente social responsável, não fez o dever de casa após a saída das tropas.
Passados poucos dias da retirada das forças federais, os confrontos entre a polícia e os bandidos voltaram a acontecer nos becos daquelas comunidades.
Meses depois, na comunidade da Maré, outra região do Rio de Janeiro, uma nova operação foi planejada e executada nos mesmos moldes.
O sucesso inicial foi-se esvaindo na medida em que a população percebeu que o envolvimento das autoridades governamentais seria um mero repeteco, quase um copiar e colar, do ocorrido no Alemão e Penha. E assim ocorreu. Tão logo as brigadas do Exército deixaram a região, o crime voltou a dar as cartas.
Os desafios à segurança pública crescem geometricamente, enquanto as soluções avançam em ritmo aritmético.
Enquanto não removermos o fator de multiplicação dos desafios, que é a incapacidade do Estado de promover paz e bem-estar sociais, as comunidades serão afetadas com novas e escabrosas notícias de violência.
Sem a ação do Estado, não há organização. Sem organização, vem a anarquia. Com a anarquia, aflora a bestialidade do crime.
Ao lado dessa incapacidade, caminha a falta de atenção dos governos às demandas profissionais e pessoais das estruturas de segurança pública, que são rotineiramente esquecidas na partição do bolo orçamentário.
É imperativo que a separação do joio do trigo, afastando os maus profissionais da segurança pública, com imediata expulsão daqueles que cometerem crimes, esteja entre os objetivos principais das lideranças políticas.
Rudolph Giuliani, prefeito de Nova Iorque entre 1994 e 2001, diante da escalada de violência que tomou conta da big apple, estabeleceu uma política que ficou conhecida como "tolerância zero". Do crime mais hediondo ao pequeno deslize no trânsito, os culpados sabiam que seriam punidos.
Por aqui, programas de governo, eleição a eleição, apontam o desafio da segurança pública como prioritário. Não raras vezes, quando as crises se instalam, se reúnem atores importantes para discutir o problema. Mas, passados dias, com o desaparecer da barbárie das manchetes, volta-se à estaca zero e ficam apenas as promessas.
Chegamos a um ponto sem retorno?
Se a resposta for afirmativa, en brera (expressão hebraica que significa "não há alternativa"), nos resta enfrentar firmemente o desafio, exigindo ação dos governantes verdadeiramente compromissados.
Otávio Santana do Rêgo Barros, general de Divisão da Reserva