Crianças e adolescentes têm nascido e crescido em um mundo de telas. Os vídeos são quase onipresentes, dos celulares aos pontos publicitários no meio da rua. A interação com a informação e com a sociabilidade também se dá no ambiente mundial, por meio de jogos, aplicativos e uma profusão de imagens que dificultam a atenção. Nessa realidade cultural, como manter o interesse pelo processo de aprendizado? Como atrair estudantes para a importância do conhecimento, sem disseminar a impressão mal formulada de que estudar é algo chato e entediante, porque precisa de foco e paciência para a compreensão, ao contrário dos apetrechos tecnológicos?
Sancionada recentemente, a Política Nacional de Educação Digital (PNED) tem o objetivo de ampliar o uso da tecnologia nas escolas, levando a realidade virtual do lado de fora para dentro do ambiente escolar. Tal política é oportuna e importante, pois não há como separar as crianças e adolescentes do modo digital de aquisição de informações, ao qual muitas têm acesso em casa, ou no meio da rua. O problema é atropelar tecnologias anteriores básicas – como a leitura e a escrita – em detrimento de uma suposta atualização dos métodos de transmissão do conhecimento. A cultura digital, incluindo seu viés lúdico, pode servir para melhorar o desempenho dos alunos e alunas com as palavras e os números, mas não deve ser oferecida em substituição ao manuseio dos livros, por exemplo. Isso já foi tentado – e reprovado – em outros países. E até no Brasil, o governo de São Paulo chegou a anunciar o fim dos livros de papel, voltando atrás diante das evidências da ineficácia dessa medida em outros lugares do mundo.
É inegável a necessidade de preparação dos jovens para as interações digitais, e as novas formas, velozes, de contato com a informação. Mas se põe igualmente necessária a preservação de habilidades essenciais para o desenvolvimento da ciência que fornece a tecnologia. O cérebro humano vai perdendo rapidamente a capacidade de memória e abstração, quando a lembrança é tratada como informação acessória, acessível em bancos de dados externos à mente. A imaginação também se compromete, quando as novas gerações demonstram impaciência para ficar cinco minutos sem uma tela na frente. Tal dependência não é desejável para ser universalizada – pelo contrário, é possível limites à tecnologia nas salas de aula, direcionando o insumo tecnológico para o aprendizado, adotando precauções contra a dispersão.
No Brasil, para variar, o debate está defasado, devido ao atraso na infraestrutura das redes de ensino. Os instrumentos disponíveis, desde a internet, e a adaptação pedagógica à tecnologia contemporânea, enfrentam a disparidade de condições no vasto universo da educação nacional. O sofrível desempenho de estudantes brasileiros em matemática e compreensão de textos não vai ser superado apenas com a incorporação da cultura digital nas escolas. A educação digital, por outro lado, pode ser um caminho de inclusão, desde que trilhado em paralelo ao conhecimento prévio, mais amplo e profundo, que permitiu o advento da cultura tecnológica.