No auge da crise pandêmica que abalou a humanidade em todos os quadrantes do planeta Terra, ficou evidente a distância entre os países ricos e pobres. Por mais que a Organização Mundial de Saúde (OMS) e a Organização das Nações Unidas (ONU) tenham demonstrado atenção para o problema, e solicitado acesso igualitário às vacinas então em produção para enfrentar a Covid, a compra antecipada dos mais ricos privilegiou algumas nações, em detrimento de outras. O que não é surpresa num lugar como o Brasil, onde diariamente milhões de cidadãos que não podem ser melhor atendidos por planos de saúde e médicos particulares, passam por filas de horas, são submetidos a estruturas precárias e agendamentos que podem levar meses para a realização de exames e procedimentos necessários para o bem-estar no presente. O Sistema Único de Saúde (SUS) é um avanço institucional e uma vantagem prática na hora de entregar imunizações, por exemplo, mas ainda falta muito para oferecer condições igualitárias às disponíveis para quem pode pagar mais.
A desigualdade mundial tem escalas diferentes para a mesma realidade. Nações desiguais apresentam regiões desiguais, como no Brasil, onde o Nordeste continua exibindo indicadores piores de desenvolvimento humano, há décadas. E onde Pernambuco se situa na parte inferior da qualidade de vida, com índices assustadores de miséria, pobreza, desemprego e violência – para ficar nos mais conhecidos. Num estado pobre como o nosso, as diferenças também são gritantes e escancaradas, com gente mal tendo o que comer diante de governos de todos os níveis com outras prioridades.
Esta semana, ao publicar o relatório de 2023, a UNCTAD (Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento) sinalizou para a constatação da obviedade: a desigualdade crescente impõe uma demanda aquém da necessária para gerar fluxos de investimentos capazes de promover o crescimento global. Ou seja, enquanto houver tamanha desigualdade no planeta, a globalização seguirá sendo boa para uns, e péssima para outros. Na média, isso limita o crescimento de todos, inclusive dos ricos, numa economia interligada e interdependente. Por outro lado, a sugestão da afirmação é que, uma vez que a desigualdade é reduzida, oportunidades aparecem no horizonte global, abertas pela melhoria da situação dos mais pobres. Uma lógica que poderia valer, também para o Brasil, ou para o Recife, mas não vale – do mesmo modo que não é observada no mundo.
Embora o foco do documento seja o que chama de sustentabilidade financeira para alavancar o crescimento econômico global – e assim, também nos países ricos – o relatório da UNCTAD é argumento adicional para se buscar, em conjunto, a redução da desigualdade no mundo, no país, nas cidades. Repete-se o óbvio nas recomendações que servem para todos: reconhecer e combater a desigualdade precisa ser uma prioridade política em todas as nações, e dentro delas, como no Brasil, pelos gestores públicos de qualquer instância. Mas o que se vê, em suas diversas escalas, é que a desigualdade é útil para os discursos, muito pouco sendo feito para, de fato, combatê-la.