Mais um caso suspeito de reinfecção pelo novo coronavírus foi notificado à Secretaria Estadual de Saúde (SES). O paciente é da Ilha de Fernando de Noronha. Já são 11 casos informados no Estado. O número crescente de registros suspeitos tem fortalecido o consenso da comunidade médica em torno da reincidência do vírus. Especialistas ouvidos pela reportagem afirmam não ter dúvidas da ocorrência de reinfecção da covid-19. Mas ainda há muitas incertezas sobre a dimensão dos casos, como identificá-los com precisão, o tempo de imunidade do paciente infectado e se ele é capaz de transmitir a doença, em um novo contágio.
Dos 11 casos relatados em Pernambuco, cinco já foram encaminhados para o Instituto Evandro Chagas (IEC), no Pará, referência nacional para o estudo de casos de reinfecção. Os outros seis, incluindo o de Noronha, ainda estão em análise pela secretaria. Para investigar um caso, é preciso que o paciente tenha duas amostras de biologia molecular (RT-PCR) positivas com um intervalo entre elas de, no mínimo, 90 dias, além de estarem adequadas para análise.
No mundo, já existem seis casos de reinfecção confirmados, considerando todos os critérios discutidos para documentação científica, incluindo o sequenciamento genético. No Brasil ainda não há confirmação de casos, seguindo todos esses parâmetros. Mas é cada vez maior a quantidade de relatos de pacientes que testaram positivo duas vezes no exame de PCR, considerado padrão-ouro. Há casos investigados em vários Estados brasileiros.
"Não tenho mais dúvidas de que pode haver uma segunda infecção. Mas para a gente ter certeza teria que o exame PCR indicar positividade, negatividade e, novamente, depois de algumas semanas ou meses, nova positividade. Além disso, teríamos que ter o sequenciamento genético do vírus para observar que tratou-se de uma nova variante, e não apenas uma reativação viral", explica a infectologista e professora da Universidade Federal de Pernambuco Vera Magalhães.
Ela observa que uma das questões mais importantes para a qual ainda não há uma resposta conclusiva é quanto ao grau de imunidade desenvolvido por um paciente que já foi infectado. "O fato de uma pessoa apresentar IGG positivo não dá a certeza de que ela está imune, nem tão pouco há garantias sobre o tempo de duração dessa imunidade. Ela pode ser apenas temporária. É fundamental estudar melhor os casos para esclarecer todos esses pontos", ressalta.
A infectologista chama a atenção para a necessidade de reforçar a vigilância em torno das medidas de distanciamento social, não só pelos relatos de casos de reinfecção, como do recrudescimento de novos casos. "Nós ainda não ultrapassamos sequer a primeira onda. E já estamos observando a chegada de uma segunda onda ou o repique da primeira. O mais relevante agora é que a população tenha consciência de que é preciso continuar se protegendo, porque isso significa salvar vidas", pontua Vera Magalhães.
O pneumologista Murilo Guimarães também afirma não ter mais dúvidas quanto à possibilidade de reinfecção do paciente, apesar de todas as lacunas que existem para identificar o segundo contágio, detalhar suas causas e as circunstâncias que permitem a reincidência do vírus. Ele diz, no entanto, que uma coisa é certa: a reinfecção mostrou a importância de manter as recomendações sanitárias, como distanciamento, uso de máscara e lavagem das mãos. "É um alerta. A desculpa que as pessoas usavam para relaxar nos cuidados, por já ter tido a doença, não funciona mais. Porque ela pode voltar e ainda não sabemos com que grau de intensidade e o quanto a nova carga viral pode infectar outras pessoas."
Justamente por ser um campo ainda cheio de incertezas, o médico Carlos Brito, professor da Universidade Federal de Pernambuco, defende que haja uma ampliação da investigação dos casos, com a flexibilização dos critérios hoje considerados pela Secretaria Estadual de Saúde, como o período acima de 90 dias de intervalo entre os dois episódios da covid. "Quando você está começando a investigar doenças novas, tem que ser o mais sensível possível, para não perder a janela de oportunidades que permite analisar o maior número de casos. Entender essa dinâmica da reinfecção tem repercussões não só na resposta sobre imunidade, como nas próprias vacinas que estão sendo testadas", avalia Carlos Brito.