A empresa que recebeu do Governo do Estado a doação de 8.200m² do Espaço Ciência quebrou o silêncio pela primeira vez nesta terça-feira (6). Ao JC, o CEO da Recife CO, João Pedro Flecha de Lima, negou falta de diálogo com o museu e defendeu a importância da instalação dos cabos submarinos e do data center em Pernambuco - assim como da localização prevista.
O assunto começou a ganhar o debate público há pouco mais de três semanas, quando a direção do Espaço Ciência afirmou ter recebido um e-mail da empresa indicada pedindo pela retirada dos equipamentos de uma área de 8.200m² do museu. Então, foi iniciada uma mobilização para evitar que o equipamento fosse desmembrado.
Pedro afirmou que, de fato, o e-mail foi enviado, mas de forma “cordial”, com o intuito de preparar o terreno e iniciar a instalação do centro tecnológico - que vem sendo estudado desde 2017, com o apoio do Governo do Estado e da Prefeitura do Recife, com o intuito de melhorar a capacidade de internet disponível em Pernambuco.
Em diversas entrevistas, o diretor do Espaço Ciência, Antonio Carlos Pavão, afirmou ter concordado com a utilização de parte do terreno para a saída dos cabos, que seria incorporado à dinâmica educacional sem prejuízo ao museu. Ele pede pela anulação da doação, argumentando que isso afetaria o projeto.
A comunidade científica vem apoiando Pavão, enquanto órgãos fiscalizadores apuram a doação. Na última semana, por exemplo, o Ministério Público de Contas (MPC-PE) pediu pela suspensão temporária da lei que cedeu a área, enquanto fez diversos questionamentos ao Governo do Estado - muitos dos quais Flecha responde abaixo, em entrevista exclusiva ao JC.
Entrevista com João Pedro Flecha de Lima:
Jornal do Commercio: Qual é a importância da tecnologia que se pretende instalar no terreno doado e quais benefícios ela traria para Pernambuco?
João Pedro Flecha de Lima: Os cabos submarinos são responsáveis por 98% da capacidade de tráfego de internet no mundo. Então, ao se instalar uma estação de chegada de cabo de submarino, acoplada a um datacenter, todos os usuários de internet, de telecomunicações vão se beneficiar.
Jornal do Commercio: Pode explicar melhor como funcionam os cabos submarinos?
João Pedro Flecha de Lima: Assim funciona a conectividade mundial. São cabos lançados no leito do mar, customizados, projetados para cada rota, com uma fibra óptica - ou algumas fibras ópticas dentro - é um cabo de dois centímetros de diâmetro, que transporta grande capacidade, interligando os datacenters mundiais. Então quando você faz uma busca, muitas vezes você não sabe, mas está acessando um datacenter nos Estados Unidos, na Europa; enfim, assim funciona a indústria.
JC: Por que a escolha pelo terreno justamente dentro do Espaço Ciência?
João Pedro Flecha de Lima: Aquele espaço foi indicado através de profundas pesquisas que levavam em conta rotas de navegação e lançamentos de âncoras de navios, através de mapear a indústria da pesca, onde se usa pesca de arrastão ou não, através de pesquisas ambientais do leito do mar, onde tinha arrecifes. Nós não identificamos outra possibilidade.
A orla do Recife é uma orla muito construída e também tem desafios naturais para serem contornados. Então, levando tudo isso em consideração, aquele espaço, que era um espaço da união, e o projeto pleiteou o destacamento daquele pequeno pedaço de 6% (do museu) para que a estação fosse feita lá.
JC: Nessa segunda-feira (5), o Iphan informou que não aprovou qualquer projeto e que a área indicada para construção do data center é “não edificante”, porque prejudicaria a paisagem. Como vocês recebem isso?
João Pedro Flecha de Lima: Não há essa possibilidade (quanto às alegações do Iphan) porque é um empreendimento térreo. Ele está abaixo de um viaduto vizinho, a altura máxima dele. Não há com o que se preocupar em relação a isso. Terá cerca de cinco metros, cinco metros e meio.
JC: Um dos principais questionamentos do Ministério Público de Contas em Pernambuco (MPC-PE) foi como duas empresas com capital social de R$ 10 mil, cada, poderiam investir 50 milhões de dólares no centro tecnológico. Também o fazemos esse questionamento: como é possível?
João Pedro Flecha de Lima: A empresa só foi criada para essa finalidade. Então, foi criada com capital baixo, e à medida em que vão transcorrendo investimentos, vão sendo integrados ao capital. Hoje, está integrada à holding, a empresa que ocorre duas. Isso é normal, porque quando se faz projetos dessa natureza, os investidores e a comunidade financeira não estão preocupados com os ativos da empresa, mas com o fluxo de caixa que vai gerar.
JC: O MPC indicou que o Governo do Estado já havia indicado um outro terreno. Onde era e por que foi alterado?
João Pedro Flecha de Lima: Ouvi falar sobre isso, mas desconheço o que possa ter havido. Estou há um ano e meio no projeto, mas ele já tem quase cinco anos. Desde que entrei, já era esse terreno, que foi escolhido tecnicamente, porque os cabos não podem ficar fazendo curvas, além de ter questões ambientais. O local que os técnicos, inclusive ingleses, americanos e brasileiros, apontaram era nesse terreno; da União, que foi destacado por ser onde daria para os cabos chegarem.
JC: A área do Memorial Arcoverde, no entanto, é imensa; e há várias partes subutilizadas. Não seria possível trazer o projeto para uma dessas partes?
João Pedro Flecha de Lima: Ele praticamente não atinge o museu, é um pedaço segregado, existe um córrego, uma ponte, e que estava muito pouco utilizado; com um avião xavante em ruínas, bem estragado. Não é o que falaram na mídia. Entendo que o espaço de Olinda é bem imponente, mas esse espaço está no Recife: e precisava ser, porque está vinculado ao Recife.
JC: O que o diretor do Espaço Ciência aponta é que nunca foi contrário à instalação dos cabos submarinos e que os incorporaria à dinâmica do museu, mas que não concordou com uma interferência no espaço, como a retirada dos equipamentos na área doada. Houve uma discussão nesse sentido com a direção?
João Pedro Flecha de Lima: Qual o problema em mudar a visitação? A vida é feita de mudanças. Nós estendemos a mão para o Espaço Ciência incorporar o data center como uma atração no museu. Projetamos um mezanino para receber visitantes, com espaço para que eles vissem como funcionava, assim como uma parede de vidro para que os jovens vissem o centro de gerência de redes, que são salas com vários monitores. Nos propusemos a fazer tudo isso, o que já demandaria um pequeno ajuste na roda do museu. Mas há entidades mais resistentes a qualquer adaptação.
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