A superintendência do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) em Pernambuco informou, na manhã desta segunda-feira (5), que não aprovou a construção de um centro tecnológico na área do Espaço Ciência, doada pelo Governo do Estado para a iniciativa privada.
Isso porque, como especialistas já haviam pontuado ao JC, a área é considerada de entorno e de proteção da paisagem do Sítio Histórico de Olinda e “non aedificandi” - ou seja, não podem ser construídas edificações, "devendo ser preservada como área verde e de lazer", segundo o órgão.
O arquiteto e urbanista Antônio Borsoi - que adaptou o projeto do Memorial Arcoverde do pai, Acácio Gil Borsoi, para transformá-lo no Espaço Ciência - contou que, à época, o Iphan deu uma autorização em caráter excepcional para a construção de pequenas edificações , pela “causa nobre” que teriam.
“Fizemos um conjunto que lembra uma grande coberta para desenvolver atividades de ensino e de reflexões, simples e vazadas. Qualquer ameaça de outras construções nessa área vai desfigurar o espaço”, apontou.
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A doação de 8.200m² inscritos no museu foi firmada por meio da lei de nº 17.940, sancionada em outubro deste ano. O Iphan, todavia, informou só ter tomado conhecimento da doação e do fato "por meio de repercussão midiática".
O órgão encaminhou um ofício ao governo de Pernambuco alegando que quaisquer intervenções na localidade devem ser "precedidas de análise técnica e anuência" da autarquia" e que intervenções feitas sem anuência do órgão estão sujeitas a sanções previstas em lei.
Na última terça-feira (29), o Ministério Público de Contas de Pernambuco (MPC-PE) protocolou no Tribunal de Contas do Estado (TCE) um pedido de suspensão temporária da doação, alegando que o processo apresentava erros, falta de transparência e risco ao patrimônio.
Segundo o MPC-PE, o terreno que vale R$ 16 milhões foi cedido para as empresas Seacable Serviços de Telecom LTDA e Sea Datacenter Tratamento de Dados LTDA - que têm capital social de R$ 10 mil cada, mas prometem um investimento de 50 milhões de dólares.
A procuradora Germana Laureano argumentou que "a alienação de bens imóveis públicos para a iniciativa privada depende de prévia licitação, não podendo haver doação de imóvel público a pessoa que não integre a Administração Pública".
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Outro questionamento de Germana Laureano é sobre o argumento do atual Governo do Estado, em nota oficial, de que o terreno do Museu é "o único" no Estado capaz de atender a instalação do datacenter e do cabo submarino para Internet. Isso porque o O MPC-PE apurou que, em 2021, o Governo do Estado tinha indicado outro terreno para o mesmo empreendimento - indicando que pode não ser a única apta a recebê-lo.
O órgão fiscalizador também pontuou a mesma preocupação do Iphan, já que a região do museu tem projeto do paisagista renomado Roberto Burle Marx e está na influência do Sítio Histórico de Olinda, patrimônio mundial da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO).
Então, o conselheiro Valdecir Pascoal, do TCE, pediu para que o Secretário de Ciência, Tecnologia e Inovação de Pernambuco, Fernando Jucá, apresentasse argumentos contrários ao pedido de suspensão. A resposta da Secretaria está em análise pelo TCE.
A equipe de transição da governadora eleita, Raquel Lyra (PSDB), também questionou a atual gestão, do governador Paulo Câmara (PSB), sobre a doação do terreno. A vice-governadora eleita, Priscila Krause (Cidadania), coordenadora da equipe de transição, assinou um ofício solicitando detalhes ao governo estadual sobre a doação de parte do Espaço Ciência, em Olinda, à iniciativa privada.
O caso só tomou repercussão quando uma das empresas enviou um e-mail que o governo chamou de "indevido" ao Espaço Ciência, questionando quando os equipamentos presentes nos hectares doados seriam removidos para início das obras. A direção, então, começou um movimento para reverter a doação.
Após dias de pressão da comunidade científica e da sociedade em geral, a gestão estadual informou que cederia 10 mil m² do lado pertencente a Olinda do Memorial Arcoverde, onde o museu está instalado, para realocação dos equipamentos presentes na área afetada. A direção, todavia, rebateu que isso alteraria o fluxo no museu, e não aceitou a proposta.
O diretor do museu, Antonio Carlos Pavão, afirmou ter concordado com a utilização de parte do terreno para a saída dos cabos, que seria incorporado à dinâmica educacional sem prejuízo ao museu, mas não com o desmembramento do equipamento para construção de um "data center".
“Não somos contra a chegada dos cabos submarinos em Pernambuco. Muito pelo contrário. O que não aceitamos é que haja qualquer interferência ou destruição de um projeto museológico de interesse público, que atende gratuitamente mais de 120 mil visitantes todos os anos”, disse Pavão.
Uma audiência pública será realizada em 23 de janeiro de 2023 pelo Ministério Público de Pernambuco (MPPE) a fim de ouvir representantes da sociedade, do poder público e demais interessados no assunto. Enquanto isso, a 3ª Promotoria de Justiça de Defesa da Cidadania de Olinda (Defesa do Meio Ambiente, Urbanismo e Patrimônio Histórico e Cultural) do órgão apura a doação.
A reportagem do JC entrou em contato com o Governo do Estado para obter um posicionamento diante das afirmações do Iphan.
Em nota, o governo de Pernambuco disse que "estranha o fato do IPHAN emitir uma opinião sobre a instalação de um Data Center de recepção de um cabo submarino de Internet sem conhecer as informações sobre o empreendimento".
"Seria interessante o referido órgão também apresentar as autorizações de construção das diversas edificações já existentes no Espaço Ciência. Além disso, ressaltamos que o Governo já informou que nada será feito no local sem o devido respaldo legal", afirma a gestão estadual.
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