PATRIMÔNIO

Fundarpe vai contra o Iphan e diz que zeppelin é incompatível à preservação do Marco Zero do Recife

Parecer técnico do órgão afirma que a ocupação da cobertura de imóveis precisa ser feita em consonância e harmonia com as características valoradas do conjunto acautelado

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Katarina Moraes

Publicado em 12/03/2024 às 12:41 | Atualizado em 12/03/2024 às 16:03
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A Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco (Fundarpe) se posicionou contra o projeto que pretende instalar um zeppelin na cobertura de dois prédios tombados no Marco Zero do Recife — indo, assim, de encontro à decisão do superintendente estadual do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), que o aprovou na última semana.

O parecer técnico publicado nessa segunda-feira (11) pelo órgão apontou que a proposta de inserir novos pavimentos nas lajes das edificações “altera significativamente a forma e a volumetria dos bens, assim como a relação de escala e gabarito”, não sendo “compatíveis com a preservação dos atributos reconhecidos no Conjunto Arquitetônico, Urbanístico e Paisagístico do Antigo Bairro do Recife”.

Contudo, deixa claro o entendimento de que “é viável a aprovação de uma proposta de ocupação da cobertura dos imóveis, desde que em consonância e harmonia com as características valoradas do conjunto acautelado”.

A resposta veio após provocação dos arquitetos e urbanistas Natália Vieira e Rodrigo Cantarelli, coordenadores do Núcleo Pernambuco do Conselho Internacional de Monumentos e Sítios (Icomos), e de Augusto Ferrer, presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil no Estado (IAB-PE), que pressionam para que a proposta seja revista.

A Fundarpe tem prerrogativa legal para opinar sobre projetos de conservação, reparação e restauração desses patrimônios, já que todos os bens tombados pela União são automaticamente também tombados pelo Estado. Contudo, normalmente segue a decisão do órgão superior — o que faz do parecer contrário uma raridade.

TÉCNICOS NEGARAM PROJETO

O projeto, chamado de “REC”, tem como intenção criar um centro cultural no Bairro do Recife em dois prédios: nº 23 da Av. Rio Branco e o de n° 58 da Av. Marquês de Olinda. Nele, está prevista a restauração dos dois imóveis e a criação de espaços para a exibição pública de quadros e esculturas, loja, restaurante, café, auditório, biblioteca, laboratório e sala de aula.

Fora isso, estão previstas a demolição e construção de alvenarias internas em todos os pavimentos, construção de mezaninos, demolição de uma casa de máquinas do elevador e a construção de escadas e rampas. Mas o principal ponto criticado por especialistas é a previsão de construir um novo volume com altura máxima de até 11 metros na cobertura dos imóveis, conectando os prédios, no formato do dirigível.

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Iphan argumentou que construção descaracterizaria imóvel - REPRODUÇÃO

O primeiro pedido de aprovação pelo Iphan foi feito em setembro de 2023, mas foi negado com unanimidade em outubro do mesmo ano, quando técnicos apontaram duas vezes que a construção contrariava as leis de tombamento e desconfiguraria a paisagem do principal cartão postal da cidade.

Em janeiro, foi novamente protocolado: dessa vez junto a um ofício da Secretaria de Política Urbana e Licenciamento do Recife (Sepul) recomendando a aprovação, afirmando que a estrutura seria temporária. Mais uma vez, todos os técnicos negaram, alegando que a estrutura não tem caráter provisório — opinião ratificada pela Fundarpe.

APROVAÇÃO DO SUPERINTENDENTE

Contudo, o superintendente do Iphan, Jacques Ribemboim, aprovou o REC sob a justificativa de que ele seria um "investimento privado de interesse público, que reforçaria a vocação do bairro como um “importante cluster turístico e cultural, com geração de renda e emprego.”

“As instalações previstas no projeto do REC Cultural de loja, café/lanchonete e o restaurante no formato de Zeppelin configuram a intenção do particular em obter suporte, ainda que parcial, aos encargos financeiros do investimento e às despesas operacionais e de manutenção”, escreveu.

Agora, o Iphan tem um período de 60 meses para revisar o projeto e eventualmente revalidar a autorização dada.

EMPRESA JUSTIFICA

Após ampla repercussão da notícia, a EBrasil, empresa do setor de energia do país que comprou os edifícios, então desocupados e sem uso, veio a público defender o REC como um espaço "totalmente inclusivo e interativo", por meio do diretor-geral do empreendimento, Roberto Souza Leão.

Segundo o comunicado, o projeto foi elaborado por uma equipe de especialistas em instalações prediais (elétrica, hidráulica, lógica, incêndio, climatização), estrutura e restauro que, em conjunto com o escritório de arquitetura, "conceberam um projeto que respeita integralmente as características e valores históricos dos imóveis".

"Ao mesmo tempo, visa revitalizar, adaptar e racionalizar o espaço para atender às necessidades contemporâneas do equipamento e do usuário. É o caso da instalação provisória, que se trata de uma estrutura totalmente desmontável e independente estruturalmente, confeccionada com perfis metálicos, paredes removíveis e lona tensionada, conectando os dois prédios e criando um ambiente de contemplação para uma das mais belas vistas do Recife, hoje sonegada pela inacessibilidade dos edifícios, além da obstrução visual proporcionada pela própria arquitetura de um dos edifícios que apresenta um terraço cercado por paredes superiores a dois metros de altura, impossibilitando a utilização do espaço como mirante", reforça.

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