A acusação de fraude nas eleições presidenciais de 2018, feita pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) não é a primeira vez em que ele questiona a confiabilidade da Justiça Eleitoral. Ainda em 2018, quando ainda era candidato à Presidência da República, ele chegou a dizer que não aceitaria resultado das eleições diferente da sua eleição.
>> Bolsonaro diz ter provas de que foi eleito em primeiro turno
"Pelas provas que tenho em minhas mãos, que vou mostrar brevemente, eu tinha sido, eu fui eleito, no primeiro turno, mas, no meu entender, teve fraude", afirmou Bolsonaro na última segunda-feira (9).
Segundo o advogado eleitoralista Emílio Duarte, as suas declarações repercutem de forma ampliada em comparação ao tempo em que ele ainda não tinha sido eleito. “Uma coisa é o deputado Bolsonaro, candidato, uma coisa é bolsonaro presidente em uma visita em missão oficial nos EUA, um dos parceiros comerciais, falar isso em uma entrevista aberta para todo mundo uvir. ”, afirmou Emílio.
Nesta terça-feira (10), em Miami, ao seu questionado por sua fala no dia anterior, o presidente disse que desafiava quem encontrasse um brasileiro “que confie no sistema eleitoral brasileiro”, disse.
Bolsonaro obteve 46,03% dos votos no 1º. Já no 2º turno, quando venceu o pleito contra Fernando Haddad (PT), foi eleito com 55,13% dos votos.
Apesar de ter afirmado que tinha provas de que seria eleito no 1º turno, Bolsonaro até então não apresentou nenhuma documentação ou denúncia.
“É dever de todo funcionário público, isso está no Código Penal, quando sabe da prática de um crime, ele tem a obrigação de comunicar as autoridades competentes. Eu acho que se ele tem provas que houve uma irregularidade, ele não pode não comunicar”, afirmou o advogado constitucionalista Marcelo Labanca.
Para o advogado eleitoral Bruno Brennand, caso o presidente tivesse certeza da existência de crime, ele deveria judicializar o caso, acionando o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) ou o Ministério Público Federal (MPF). “Quem pode anular a eleição é a Justiça eleitoral, mas isso não beneficiaria ninguém, até porque ele ganhou no segundo turno. Para que convocar uma nova eleição?” questiona.
Ele conta que, como o Código Eleitoral é antigo, existe apenas a previsão legal para o caso de fraude em urnas de lona, extintas totalmente no ano de 2000. Desde a implementação do voto eletrônico, não foi verificada nenhuma ocorrência de fraude.
“A fraude que o Código eleitoral fala seria se você trocasse os votos da urna de lona. Ocorrendo essa fraude, comprovando essa, a Justiça poderia anular a eleição toda se a fraude fosse muito grande ou se fosse menor, anulava só naquela eleição ou zona eleitoral”, disse o advogado.
Bruno considera que a fala de Bolsonaro pode ter ocorrido para provocar o debate sobre o voto impresso, defendido por ele desde a época em que era deputado federal, “Voto impresso é sinal de clareza para o Brasil”, disse ele em novembro de 2019 após o então presidente da Bolívia Evo Morales renunciar o cargo.
Em 2018, o Supremo Tribunal Federal (STF) derrubou a determinação de uso do voto impresso nas eleições, ao considerar que a prática ameaçaria o sigilo do voto.
Já Emílio Duarte questiona a efetividade de uma eventual anulação nas eleições, uma vez que Bolsonaro terminou sendo eleito. “Qual o efeito prático disso? A eficácia da medida judicial seria inócua. Em nenhum momento ele teve um dia de prejuízo do exercicio do seu mandato. Talvez algumas apurações na seara do próprio tribunal para supostas infrações disciplinares envolvidos na suposta fraude”, afirmou Emílio.
“Isso pode até gerar um dano ao erário por ter custeado o segundo turno, ai o estado vai cobrar para quem fraudou. do ponto de vista eleitoral, não tem praticidade”, complementa Bruno.