Com informações da Folha de S.Paulo e do O Globo
Um dia após as declarações de Jair Bolsonaro (sem partido) que colocaram em xeque a confiabilidade da Justiça Eleitoral brasileira, ao dizer que houve “fraude” na eleição de 2018 – na qual foi eleito presidente da República em segundo turno –, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) reagiu. Em nota, a Corte reafirmou “absoluta confiabilidade e segurança do sistema eletrônico de votação”. Além do comunicado oficial, a presidente do TSE, ministra Rosa Weber, fez um raro pronunciamento à imprensa e disse que a Justiça Eleitoral “não compactua com fraude”.
Nesta terça-feira (10), Bolsonaro voltou a criticar o sistema, dando continuidade a sua escalada contra diversas instituições do País. Ainda nos Estados Unidos – onde deu a primeira declaração – ele afirmou a jornalistas que não há ninguém no País que confie no sistema eleitoral. “Eu quero que você me ache um brasileiro que confie no sistema eleitoral brasileiro”, declarou, em Miami.
O presidente tem escalado seus embates e minado uma a uma suas relações com o Congresso Nacional, imprensa, Supremo Tribunal Federal (STF) e, desta vez, com a Justiça Eleitoral. Mas essa foi a primeira vez que ele fala em ter provas desde que chegou ao Planalto. Apesar de repetir que tem indícios sobre o que está falando, o presidente não apresentou nenhum material, mesmo após ser questionado pelos jornalistas.
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Em outubro de 2018, quando era o candidato presidencial do PSL, Bolsonaro fez um pronunciamento na internet no qual disse suspeitar que só não havia vencido Fernando Haddad (PT) no primeiro turno devido a fraudes nas urnas eletrônicas. Antes do segundo turno de 2018, o TSE mandou fazer uma auditoria externa que comprovava a segurança do sistema de urna eletrônica no Brasil. O então candidato do PSL à Presidência venceu a eleição no segundo turno, com 55,13% dos votos. No primeiro turno, conseguiu 46,03% dos votos válidos.
“A minha nota, em nome do Tribunal Superior Eleitoral, é muito clara. Eu mantenho a minha convicção quanto à absoluta confiabilidade do nosso sistema eletrônico de votação. E essa confiabilidade e essa segurança, ela advém, em especial, da auditabilidade dessas urnas eletrônicas. Isso foi um verdadeiro mantra durante as eleições de 2018. Tanto que, ao longo de mais de 20 anos de utilização do sistema, jamais foi comprovada qualquer fraude”, disse a presidente do TSE, a ministra Rosa Weber a jornalistas nesta terça.
“Embora possa ser aperfeiçoado, cabe ao tribunal zelar por sua credibilidade, que até hoje não foi abalada por nenhuma impugnação consistente, baseada em evidências. Eleições sem fraudes foram uma conquista da democracia no Brasil e o TSE garantirá que continue a ser assim”, diz a nota do TSE.
Os ministros Luís Roberto Barroso, vice-presidente do TSE, e Marco Aurélio Mello defenderam a urna eletrônica. Para Barroso, o sistema é “totalmente confiável”. “Agora, se alguém trouxer alguma prova, alguma evidência, a gente tem sempre espaço para aperfeiçoamento. Agora, não pode ser uma coisa retórica, tem que ser uma coisa fundada em elementos objetivamente aferíveis. Não pode ser ‘eu acho’, é preciso que haja elementos”.
Marco Aurélio reforçou o discurso. “Capitaneei as primeiras eleições informatizadas, em 1996, nos municípios com mais de 100 mil eleitores. De lá para cá não houve uma única impugnação ao sistema minimamente séria. Daí se preserva a vontade do eleitor. E ninguém coloca em dúvida a lisura da Justiça. Tempos estranhos”, disparou.
Coordenador da campanha de Bolsonaro e hoje adversário do presidente, o ex-ministro e advogado Gustavo Bebianno (PSDB-RJ) criticou o ex-aliado. “Acho uma atitude irresponsável o presidente eleito fazer uma afirmação de que tem provas contra o TSE. Se ele tem, é obrigação apresentá-las. Eu me questiono. Quem teve competência para fraudar o primeiro turno, não teve para fazê-lo no segundo turno?”, perguntou Bebianno.
Ex-ministro do TSE e atual secretário-geral do Aliança pelo Brasil, partido que Bolsonaro pretende fundar, o advogado Admar Gonzaga disse à reportagem desconhecer as “provas” mencionadas pelo presidente. “Não conheço essas provas, não conversei com o presidente. Mas o presidente não falaria algo dessa ordem levianamente sem ter efetivamente provas do que está dizendo”, afirmou Gonzaga. “É importante que essas provas sejam apresentadas, se ele assim desejar. É de interesse da Justiça Eleitoral”, disse o advogado, um dos ministros titulares do TSE durante o último pleito, alvo de suspeitas lançadas por Bolsonaro.
O procurador-geral da República, Augusto Aras, afirmou à reportagem que não recebeu provas relativas à acusação feita por Bolsonaro. Questionado se caberia abertura de investigação, Aras disse que só poderia fazer isso caso lhe fossem apresentados elementos concretos. O PGR afirmou ainda que não recebeu nenhuma denúncia formal de Bolsonaro sobre o tema.
O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), evitou comentar. “Vamos tratar do que é sério e urgente”, afirmou.