Eleição

Cientistas políticos comentam o que está em jogo na eleição para a presidência da Câmara dos Deputados

Além do cargo mais alto da mesa diretora, a possibilidade de ditar a agenda da Casa e ter o poder de tomar decisões que podem afetar até o Executivo estão entre os principais focos da votação

Mirella Araújo Renata Monteiro
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Mirella Araújo
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Publicado em 31/01/2021 às 8:00
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O presidente da República, Jair Bolsonaro, e o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP). - FOTO: REPRODUÇÃO/REDES SOCIAIS
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Desde o fim de 2020, grande parte da atenção dos principais atores políticos do País se voltou para a escolha do novo presidente da Câmara dos Deputados. Em geral, a mudança no comando da Casa Baixa é sempre motivo para agitação em Brasília, porque, entre outros motivos, o presidente da Câmara é o segundo na linha de sucessão presidencial e tem o poder de ditar o que será ou não discutido e votado pelos parlamentares. Esse poderio, no entanto, não é a única coisa em jogo nesta votação. Partidos, lideranças políticas e até o chefe do Executivo dedicam tempo, influência e algumas vezes dinheiro nas articulações para a disputa, tudo isso para conquistar muito mais do que um posto na mesa diretora, cada qual com a sua prioridade.

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Sob o ponto de vista interno, há que se considerar que além do presidente da Câmara, serão escolhidos dois novos vice-presidentes e os titulares e suplentes de quatro secretarias, totalizando 11 cargos da mesa diretora. A ocupação desses cargos e a alocação das legendas em comissões e em outros espaços da Casa também estão no radar dos parlamentares. “Essa eleição traz não somente uma disputa pela presidência da Câmara, mas também pela composição das comissões e relatorias de futuras CPIs (Comissões Parlamentares de Inquérito). Ela tem importância porque o presidente da Câmara é quem abre e fecha as portas para pedidos de impeachment e é por isso que há tanto interesse do governo em ter um aliado na presidência”, explicou Ernani Carvalho, cientista político da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).

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Com popularidade em queda, soterrado por mais de 60 pedidos de impedimento e com o desafio de tocar agendas nos seus últimos anos de mandato que o ajudem a se reeleger em 2022, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) está engajado na campanha dos seus candidatos na Câmara, Arthur Lira (PP), e no Senado, Rodrigo Pacheco (DEM). Segundo reportagem publicada pelo Estadão na última semana, o militar da reserva destinou R$ 3 bilhões em emendas para 250 deputados e 35 senadores aplicarem em obras em seus redutos eleitorais, isso para citar apenas um dos movimentos do presidente pela eleição dos seus aliados.

“Essa votação ocorre no segundo biênio do mandato do presidente, então ela tem um grau de visibilidade muito grande, o impacto que essa condução pode ter é muito significativo tanto para a renovação dos mandatos daqueles que estão no Legislativo, quanto para impactar diretamente no Poder Executivo. Se o presidente da República passar a ter muita dificuldade na aprovação da sua agenda no Legislativo neste momento, isso terá mais relevância, porque é dos últimos dois anos que o eleitor vai se lembrar na hora do voto, a avaliação que ele vai fazer será baseada nisso”, observou a cientista política Priscila Lapa, da Faculdade de Ciências Humanas de Olinda (Facho).

A docente pontua, ainda, que atualmente o Parlamento possui um papel diferente do que tinha no passado, com mais atribuições, por isso as eleições para a mesa diretora se tornaram cada vez mais importantes. “O Poder Legislativo tem, hoje, a responsabilidade inclusive de cobrir os espaços que o Executivo não está conseguindo ocupar. Por exemplo, quando se começou a discutir a política de vacinação no Brasil, em meio a uma verdadeira inércia do governo federal, o Legislativo ensaiou desenhar um plano de vacinação e apresentá-lo ao Planalto. O Parlamento começou a ocupar espaços que antes não eram seus mediante uma inoperância do governo em temas em que ele deveria atuar com fluidez, dando respostas às demandas da sociedade. Além disso, o Legislativo precisa dar respostas à sociedade sobre o enfrentamento da pandemia por parte do Executivo. Se isso vai desencadear um processo de impeachment ou não, não há como saber no momento”, considerou Lapa.

Para Ernani Carvalho, independentemente de quem vença a eleição na segunda, muito dificilmente Lira ou Baleia Rossi (MDB) - este último candidato de Rodrigo Maia (DEM) -, com base nos elementos que existem hoje, darão prosseguimento a um pedido de impedimento. “Eu acho que pelo perfil dos dois candidatos, nem o Lira nem o Baleia Rossi teriam incentivos fortes a caminhar para uma propositura de impeachment, pelo menos não agora. O impeachment, como sabemos, é um retrato do momento. E nesse momento não se configuram ainda as condições políticas, que não são só evidências ou circunstâncias, para a abertura do processo, elas precisam de um convencimento da classe política, um apoio forte do setor produtivo industrial, comercial, o apoio forte da mídia e mobilização forte nas ruas”, declarou o professor.

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