STF

Entenda as consequências do julgamento que declarou Sergio Moro parcial contra Lula

Especialistas consultados pelo JC apontam que a decisão do STF deve trazer impactos sobre outros processos do ex-presidente e até mesmo de outros réus. Além disso, acredita-se que a legitimidade da Operação Lava Jato será atingida

Renata Monteiro
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Publicado em 23/03/2021 às 21:09
RICARDO STUCKERT/INSTITUTO LULA
TRIPLEX Caso contra o ex-presidente Lula volta à estaca zero com possível anulação de provas e depoimentos - FOTO: RICARDO STUCKERT/INSTITUTO LULA
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Por um placar de 3 a 2, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta terça-feira (23) que o ex-juiz Sergio Moro foi parcial ao julgar o ex-presidente Lula (PT) na ação em que o petista foi condenado por ter supostamente recebido um triplex no Guarujá como propina. Segundo especialistas consultados pelo JC, a decisão da Segunda Turma da corte, além de impactar diretamente este caso, tem potencial para influenciar outros processos que contaram com a participação do ex-magistrado, inclusive situações que envolvem outros réus.

“Agora, todas as decisões que foram proferidas pelo juiz declarado imparcial são anuladas, porque o magistrado, para julgar uma causa, precisa manter a equidistância das partes. Ele não pode beneficiar nenhuma delas. E o que estava acontecendo naquele caso é que o juiz estava aconselhando o Ministério Público, e o Código de Processo Penal veda isso. Por conta disso, todas as decisões que ele deu nesse processo serão anuladas e terão que ser refeitas, o processo vai começar do início, da fase de inquérito", observou Matheus Falivene, advogado especialista em direito penal.

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Ao mencionar o aconselhamento de Moro a membros do Ministério Público, Falivene se refere às conversas do ex-juiz com procuradores da Lava Jato no Telegram que foram obtidas por hackers e divulgadas pelo site The Intercept em 2019. O material, anexado ao habeas corpus que estava em julgamento desde 2018 e teve a votação finalizada hoje, mostra que houve colaboração de Moro com a força-tarefa, o que comprometeria a paridade que deveria existir entre acusação e defesa.

Como o ex-presidente Lula não é o único acusado citado nas mensagens trocadas entre Moro e os procuradores, é possível que réus em outros processos da Lava Jato acionem o STF para solicitar a suspeição do ex-juiz também nos seus casos. “O ministro Gilmar Mendes fez questão de ressaltar que neste habeas corpus eles estão julgando estritamente as questões relativas ao ex-juiz Sergio Moro com relação ao ex-presidente Lula. O julgamento não vai se estender aos demais investigados na Lava Jato. Mas é claro que as defesas dos acusados que também foram condenados pelo ex-magistrado vão requerer que haja a extensão desses efeitos para outros julgamentos”, afirmou Maurício Bezerra, advogado criminalista e conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil seccional Pernambuco (OAB-PE).

Bezerra também explicou que, como Moro não é parte do julgamento do habeas corpus, não caberia ao ex-juiz apresentar defesa nesta situação. Justamente por não poder se defender, uma multa que chegou a ser cogitada por Gilmar Mendes contra ele não deve chegar a ser aplicada. “Essa multa está prevista no artigo 101 do código de processo penal, mas essa é uma previsão tão distante que fala em uma penalidade de 200 mil réis a 2 contos de réis. Eu penso que, da forma como foi conduzido esse julgamento, essa multa é inaplicável porque aí ele teria que ter a possibilidade de defesa, o que não ocorreu”, disse.

A decisão do STF traz, ainda, consequências para o futuro da operação Lava Jato, de acordo com João Paulo Martinelli, advogado e professor de direito penal. Para o docente, o modo como o julgamento se encaminhou e como os ministros votaram, contribuiu para que a Lava Jato, que já sofreu uma série de derrotas nos últimos meses - como o encerramento da força-tarefa do Paraná ou a anulação das condenações de Lula na operação por Fachin -, perdesse ainda mais legitimidade.

“Eu acho que, a partir de agora, a operação perde a sua legitimidade, porque não se está mais falando sobre uma possível falta de provas, não é só o jogo político, é o Supremo Tribunal Federal que decidiu que o ex-juiz foi parcial. E considerando que a gente tem uma Segunda Turma em que o ministro que não foi indicado pelo PT, que é o Gilmar Mendes, votou pela suspeição, e o Edson Fachin, que foi indicado pelo PT, votou contra, isso ganha um outro peso. E ainda teve a Cármem Lúcia, que já havia decidido pelo não reconhecimento da suspeição, mas reverteu a decisão em virtude de novas mensagens que mostraram que houve um conluio, um orquestramento entre o Ministério Público e o Judiciário, ação que é vedada pelas dinâmicas da magistratura, do Ministério Público e até por tratados internacionais”, detalhou Martinelli.

MARCELLO CASAL JR/AGÊNCIA BRASIL
Fachada do Supremo Tribunal Federal - FOTO:MARCELLO CASAL JR/AGÊNCIA BRASIL

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