Educação

Educação pode ser caminho para formar nova geração de políticos

Política e educação estão intrinsecamente ligados a medida em que a educação impulsiona o ingresso na política e a política pode ser instrumento de estímulo à educação

Mirella Araújo Luisa Farias
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Mirella Araújo
Luisa Farias
Publicado em 03/04/2021 às 8:05
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OPORTUNIDADE Em Bezerros, a prefeita Lucielle Laurentino (à esq), e a vice, Socôrro Silva, são ambas professoras - FOTO: FOTO ARQUIVO
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Foi durante a sua vivência escolar, que Lucielle Laurentino encontrou inspiração para querer mudar a realidade a sua volta. Filha de agricultores da zona rural de Bezerros, no Agreste, ela teve a oportunidade de estudar na segunda escola de tempo integral de Pernambuco, atualmente Escola de Referência em Ensino Médio (Erem) Bezerros. Hoje, é prefeita do município.

"Não só a minha vinda para a política mas toda a minha ascensão profissional, tudo que eu alcancei na vida veio através da educação. Eu sou resultado da educação pública desse estado", resumiu Lucielle (DEM), formada em Geografia pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e mestre em Engenharia Florestal pela Universidade de Valladolid, na Espanha.

A escolha do curso foi motivada pelo exemplo dos professores dessa disciplina, considerados os melhores por ela. O espírito de liderança foi estimulado pelo conceito do "jovem protagonista", metodologia das escolas em tempo integral. Não à toa, ela foi líder de turma, presidente do grêmio estudantil e até mesmo líder da cooperativa de ex-alunos.

"O que é ser um jovem protagonista? Passa por três esferas. A primeira é ter competência para executar tarefas, conseguir realizar um projeto de vida, e para isso eu preciso saber ler, escrever, fazer conta. A segunda é ter autonomia, ou seja, conseguir uma estabilidade mínima para tomar decisões. E o outro elemento é solidariedade, que tem a ver com a minha vinda para a política. A gente estuda como devolver para o mundo aquilo que o mundo nos dá", disse Lucielle.

Para a professora do Centro de Educação da UFPE, Adriana Maria Paulo da Silva, não é a educação que pode transformar a política, mas as pessoas. "O indivíduo, na medida que é colocado para refletir suas ações, sobre o que as ciências produzem, pode mudar a sua vida e ajudar a mudar a vida dos que estão a sua volta", explica.

Para a cientista política e professora da Faculdade de Ciências Humanas de Olinda (Facho), Priscila Lapa, usar a educação como porta de acesso para a política é positivo. Ela aponta que lideranças jovens podem trazer novos pontos de vista, o que é importante para fazer com que as políticas públicas avançem. Isso reforça a importância da formação política nas escolas.

"A questão da formação política no Brasil ganhou muito esse caráter ideologizado de que isso deve ser um risco para educação, para que não vire militância de direita e de esquerda. No Brasil, nós temos dificuldade de trazer isso, diante a deturpação conceitual que existe", declara Lapa.

Adriana Maria afirma que "ninguém precisa ir para a escola ter formação política", mas que a escola pode ter um papel importante nesse processo. "Quando aprendemos a ouvir o colega, a deixá-lo falar até o fim, a criticá-lo sem precisar xingá-lo, a propor soluções ao nosso problema e nos solidarizamos com o problema dos outros, isso nos ajuda a sabermos que somos seres políticos e que a gestão da nossa vida depende de nós mesmos", afirma.

Após passar por uma série de formações no Renova BR, Fundação Lemann e na Rede de Ação Política pela Sustentabilidade (Raps), Lucielle se candidatou a deputada estadual em 2018 e não foi eleita. Mas em 2020, chegou à Prefeitura de Bezerros, ao lado da vice Socôrro Silva; uma chapa formada por duas professoras.

Com a pandemia, o foco inicial tem sido a saúde mental dos professores. "Eles não estavam acostumados a lidar com tecnologia, aparecer em um vídeo gravando aula. Nós montamos internamente um núcleo de gravação de aulas, com os professores que lidam melhor com as telas, pegando o currículo do ano passado que não foi dado. E os outros professores ficavam como mediadores das aulas, sem precisar se expor", disse Lucielle.

Apesar de avanços, pautas básicas do País envolvendo a educação ainda enfrentam entraves históricos. A escolarização pública, desde o ensino infantil até o último grau do ensino superior, por exemplo, ainda precisam de acesso igualitário. Segundo Adriana Maria, isso ocorre porque o País não coloca a educação como prioridade.

"A educação deficiente é algo histórico e que foi naturalizado no país como algo que não funciona. Se problematizou essa pauta ideológica, de trazer questões de gênero, mas sem ter resolvido questões fundamentais. Não lembro do IDEB ter sinalizado que estávamos prontos para partir para outras discussões na educação", lembra Priscila Lapa.

Legislativo

A deputada estadual Teresa Leitão (PT) é outro exemplo de ator político que vem da educação e encontrou na política uma ferramenta para lutar por essa pauta. Teresa é professora de formação e ofício. Ela conta que foi dentro da sala de aula que conheceu a política.

"Os professores lidam com a política educacional de uma forma muito proativa e eu nunca fui aquele tipo de professora que recebia o planejamento, as leis, as diretrizes sem me aprofundar e sempre tive ambientes escolares muito propícios ao diálogo, ao debate e à construção coletiva", conta.

Ela também desempenhou os cargos de coordenadora pedagógica e orientadora educacional, duas funções que exigem a tomada de decisões.

O próximo passo foi a política sindical, que começou através da associação de orientadores educacionais e, depois, com a presidência do Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Estado de Pernambuco (Sintepe), na época em que se discutia o Plano de Cargos e Carreiras da categoria. "Eu comecei a me inteirar da política educacional em outro patamar, não apenas para o meu espaço de sala de aula, mas para uma categoria", disse.

Em seguida, veio a intenção de ocupar outros espaços, como a Assembleia Legislativa de Pernambuco. "Nunca chegou um projeto de lei, seja do Executivo, seja do Legislativo que eu não faça uma leitura atenta", disse. Ao longo dos seus mandatos, Teresa participou de pautas como a discussão sobre a Lei da Escola Integral e a implementação da Lei da Responsabilidade Educacional, e presidiu a Comissão de Educação.

"A gente não consegue fazer tudo como também não consegue tudo no sindicato. Mas eu acho que a gente conseguiu dar uma visibilidade muito boa para algumas iniciativas. Sobretudo na defesa intransigente da minha categoria e da minha causa, que é a educação", finaliza.

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ESCOLHAS Teresa Leitão queria disputara a Câmara, PSB desejava que ela fosse vice, mas PT indicou ao Senado - FOTO:ROBERTO SOARES/ALEPE
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ESCOLAS Priscila Lapa vê deturpação do debate sobre formação política - FOTO:FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM

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