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CPI da Covid cita Pernambuco para acusar Bolsonaro de crime contra humanidade

Segundo juristas, presidente permitiu que pandemia se alastrasse nas comunidades indígenas

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Paulo Veras

Publicado em 20/10/2021 às 14:03 | Atualizado em 20/10/2021 às 23:10
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Atualizada às 18h53

Dentre os vários argumentos usados pela CPI da Covid para acusar o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) de crime contra humanidade está o efeito da pandemia sobre indígenas pernambucanos.

A menção ocorre na página 594 do relatório, lido nesta quarta-feira (20) pelo senador Renan Calheiros (MDB-AL). O argumento foi trazido pela comissão de juristas liderada pelo professor Miguel Reale Júnior.

"Resta claro, portanto, que o Presidente da República, pessoalmente e por meio da estrutura organizada e hierárquica de poder, através de diversos Ministérios e órgãos de controle ligados à proteção constitucional dos povos originários, na forma prevista do artigo 231 da Constituição Federal, deliberadamente planejou, incentivou, autorizou e permitiu que a epidemia invadisse e se alastrasse nas comunidades indígenas, em especial nos territórios do Amazonas, Pará, Roraima, Rondônia, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Maranhão, Ceará e Pernambuco, causando um número inaceitável de mortes, lesões graves, desnutrição, deslocamentos forçados, ataques por grupos armados, contaminação por mercúrio, entre outros atos desumanos de igual gravidade", afirmam os juristas, em texto reproduzido pela CPI.

De acordo com o boletim da Secretaria Estadual de Saúde dessa terça-feira (19), 1249 indígenas contraíram a covid-19 em Pernambuco. As principais etnias atingidas foram a Xucuru (421 infectados); Fulni-Ô (283 infectados); e Pankararu (200 infectados).

Ao longo da pandemia, 24 indígenas morreram no Estado, de nove diferentes etnias. As que concentram mais óbitos são a Fulni-Ô (seis mortes) e a Xucuru (cinco mortes).

Os povos indígenas são considerados grupo de risco para a covid por uma série de fatores; sendo os principais deles a distância de unidades de saúde e o sistema imunológico mais suscetível às doenças dos brancos.

De acordo com a CPI, o governo federal foi negligente com os povos tradicionais durante a pandemia, com medidas mitigatórias do efeito da doença sendo "deliberadamente recusadas" até que o Supremo Tribunal Federal (STF) obrigasse a União a agir. Segundo o documento, a "assistência prestada foi insuficiente e descontínua".

Os senadores criticam também o efeito da desinformação sobre os indígenas. "Paralelamente à campanha oficial de imunização, o Presidente da República continua a sabotar a vacinação. Sua intenção nesse sentido é notória. Os boatos que espalha publicamente sobre jacarés, lobisomense mudança de sexo chegam aos indígenas por aplicativos de mensagens, redes sociais e por transmissões de rádio dos missionários bolsonaristas. Relatos de servidores dos Dseis que chegaram à CPI no bojo dos documentos nºs 653 e 1.426 registram que alguns indígenas que deram crédito à retórica antivacina receberam as equipes de saúde com hostilidade, até mesmo armados", descreve.

Segundo o último balanço do governo estadual, 26.192 indígenas aldeados receberam ao menos a primeira dose da vacina contra o novo coronavírus. Desses, pelo menos 26.057 já estão com a imunização completa.

Inicialmente, o plano do relator da CPI, Renan Calheiros, era indiciar o presidente da República por genocídio indígena. Mas houve divisão no grupo majoritário da comissão se havia elementos suficientes para sustentar essas alegações; o que poderia enfraquecer o relatório. Por isso, optou-se por tentar enquadrá-lo no crime contra a humanidade, que também permite denunciar Bolsonaro às cortes internacionais.

No total, Bolsonaro foi acusado formalmente de ter cometido nove crimes: prevaricação; charlatanismo; epidemia com resultado morte; infração a medidas sanitárias preventivas; emprego irregular de verba pública; incitação ao crime; falsificação de documentos particulares; crime de responsabilidade e crimes contra a humanidade. O texto também pede o indiciamento de duas empresas e outras 65 pessoas, incluindo ministros e ex-ministros e os filhos políticos do presidente: o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ), o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) e o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ).

Leia a íntegra do relatório final

 

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