Com Estadão Conteúdo e AFP
O PSOL e o PT vão acionar o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) apontando abuso de poder econômico e político por parte do presidente Jair Bolsonaro (PL) nos atos comemorativos do 7 de setembro, realizados nesta quarta-feira.
O presidente, candidato à reeleição, transformou atos públicos financiados com dinheiro público em atos de campanha.
"Bolsonaro fez uso indiscutível de um evento oficial para discursar como candidato. Há abuso de poder econômico e político acachapante, com o uso de recursos públicos, de uma grande estrutura pública, para fazer campanha. Os discursos desse comício escancarado foram transmitidos ao vivo para toda a nação, inclusive por meio da TV Brasil, uma TV estatal", afirmam os advogados que representam a Coligação Brasil da Esperança, que tem o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) como candidato.
Lula publicou um vídeo nas redes sociais afirmando que Bolsonaro "utilizou a data para fazer campanha eleitoral e para ofender seus adversários".
"Nós nunca usamos o dia da pátria, um dia que é do povo brasileiro, como instrumento político. Nosso país precisa de amor, não de ódio", acrescentou o petista.
"Bolsonaro convocou os manifestantes às urnas, usou o slogan de campanha e usou as Forças Armadas para construir um comício", disse Sâmia Bomfim, líder da bancada do PSOL na Câmara, ao Broadcast Político.
Atos de Bolsonaro no 7 de setembro
Bolsonaro discursou em Copacabana, no Rio de Janeiro, horas depois de um pronunciamento similar em Brasília, onde também foi aplaudido por uma multidão reunida para assistir ao desfile cívico-militar do 7 de setembro.
"Não sou muito bem educado, falo palavrões, mas não sou ladrão", disse, em alusão a seu principal adversário, Lula.
O presidente disse que o Brasil trava uma "luta do bem contra o mal" e que a esquerda "não vai voltar à cena do crime", referindo-se aos escândalos de corrupção que sacudiram os governos de Lula e Dilma Rousseff entre 2003 e 2016.
"Esse tipo de gente tem que ser extirpada da vida pública", acrescentou, criticando também os governos de esquerda de Argentina, Nicarágua e Venezuela.
Bolsonaro usou a grande afluência dos atos em Brasília, Rio e São Paulo para atacar as pesquisas de intenção de voto, que o colocam em desvantagem para o primeiro turno das eleições em 2 de outubro.
"Aqui não tem a mentirosa Datafolha, aqui é o nosso 'Datapovo'", disse, em alusão ao instituto de pesquisas que lhe atribui 32% das intenções de voto contra 45% para Lula.
Essa ideia ecoou no público.
"Aqui dá para ver quanta gente o está apoiando. Acredito em sua vitória, se é que não vai haver fraude", disse à AFP Luiz García, instrutor de tiro de 34 anos.
Em um tom menos belicoso do que no 7 de setembro do ano passado, quando assegurou que "apenas Deus" o tiraria do poder, Bolsonaro recomendou aos solteiros que procurassem uma "princesa". Em seguida, beijou a primeira-dama, Michelle, e puxou um coro de "imbrochável", sendo festejado por seus apoiadores.
Tradicionalmente, a parada militar do Rio acontecia na Av. Presidente Vargas, no centro da cidade, mas o presidente insistiu em que este ano os militares marchariam no local que costuma concentrar manifestações bolsonaristas, o que ajudou a misturar a festa nacional com uma manifestação política em seu apoio.
Antes do evento militar em Copacabana, Bolsonaro participou de uma motociata por bairros da zona sul.
"Bolsonaro claramente usou uma data simbólica e muito importante para a História do Brasil, os 200 anos da Independência, de uma forma eleitoral", disse à AFP Adriano Laureno, analista político da consultoria Prospectiva.
Longe de tentar agradar os eleitores de centro ou indecisos, analistas coincidem em que dirigiu seu discurso para seus seguidores mais fiéis, muitos dos quais defenderam lemas golpistas, pedindo intervenção das Forças Armadas e o fechamento do Supremo Tribunal Federal, ao qual acusam de "ativismo judicial" contra Bolsonaro.
O presidente "não fez ataques tão pesados e diretos às instituições, às urnas eletrônicas, nem a ministros do STF [como ocorreu em 2021]. Agora, ele estava presente e dando seu aval a uma manifestação na qual esse era o principal tema", afirma Laureno.
"Bolsonaro lida muito com esse dualismo entre autorizar a base dele a fazer ataques mais pesados, enquanto ele próprio adota um tom mais moderado para não ser tão criticado", avalia Laureno.
Suely Ferreira, de 64 anos, uma das participantes do ato, pedia intervenção militar. "O que está estragando esse país é a ditadura dos nossos togados, da nossa Corte, uma Corte totalmente omissa para o povo", disse à AFP.
O STF abriu várias investigações contra Bolsonaro, especialmente por divulgação de notícias falsas, transformando a Suprema Corte em um dos alvos habituais do presidente e de seus seguidores mais fervorosos.
Para o cientista político Maurício Santoro, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), os atos desta quarta-feira "mostram que Bolsonaro mantém grande capacidade de mobilização entre seus apoiadores mais fieis, e que esse pode ser o núcleo a partir do qual o presidente seria capaz de contestar o resultado das eleições".