O Brasil vive as eleições mais difíceis da sua história desde a redemocratização, em 1988. Jair Messias Bolsonaro (PL) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT) dividem o País como se disputassem um clássico de futebol, defendidos por suas torcidas exaltadas.
Os dois candidatos à presidência da República se colocam em campos opostos, rachando o País entre o Lulismo e o Bolsonarismo, entre o vermelho e o verde-amarelo. Os que restam são votos a conquistar por um dos dois lados.
Em meio a esse antagonismo cego, há espaço para refletir sobre quem vai conduzir o futuro do Brasil nos próximos 4 anos? O eleitor conhece seu candidato, sua visão de mundo e sua proposta de governo ou está apenas escolhendo um lado do front, de olhos vendados? Essas perguntas precisam ser feitas.
O cientista político Ricardo Ismael acredita que a rivalidade entre os adversários vai se intensificar no segundo turno. "Vamos torcer para que não haja violência e que não se aprofunde essa polarização e esse racha no Brasil. O País não pode se dar o luxo, diante de tantos problemas que tem para resolver, de prosseguir com essa tendência de racha nas famílias, nos grupos sociais e no ambiente de trabalho. Isso não é desejável", alerta.
FAMÍLIA E INFÂNCIA
Ao longo de suas trajetórias, Lula e Bolsonaro têm pontos convergentes. A infância talvez seja o principal elo entre eles. Os dois são de família pobre, numerosa e migrante. Também foram crianças em cidades periféricas do interior do País.
O inusitado de um operário chegar à presidência da República, em 2002, e de um deputado do baixo-clero, praticamente desconhecido no País, vencer as eleições em 2018 e ocupar o Palácio do Planalto, também aproxima a trajetória dos dois sob perspectivas diferentes.
Filho de imigrantes italianos, que vieram para o Brasil depois da Segunda Guerra Mundial, Bolsonaro nasceu na pequeníssima cidade de Glicério, no interior de São Paulo, em 1955. Terceiro dos seis filhos de Percy Geraldo Bolsonaro e Olinda Bonturi passou parte da infância e adolescência em Eldorado (SP), onde formou a visão de mundo que demonstra hoje. Permaneceu na cidade dos 10 aos 18 anos, onde teve uma vida pobre.
A família de Lula também fugia das adversidades quando deixou Garanhuns, no interior de Pernambuco, para arriscar a vida em São Paulo. Dona Lindu (Eurídice Ferreira de Melo) e seus sete filhos tentavam escapar da guerra contra a pobreza e a fome, em um Semiárido devastado pela seca. "Pendurados" em um pau-de-arara, foram atrás do pai de Lula, Aristides Inácio da Silva, que tinha seguido antes, em busca de trabalho. Nascido em 1945, Lula é o caçula da família.
DIREITA, VOLVER
Na política, os candidatos tomaram direções opostas. Se tivesse seguido os passos do pai, talvez Bolsonaro tivesse 'dobrado à esquerda'. Logo ele, que abomina o 'comunismo' e exalta a ditadura militar, teve um pai filiado ao MDB (partido que fazia oposição à ditadura) e fichado pelo regime.
A passagem do guerrilheiro Carlos Lamarca pela região onde Bolsonaro morava, originou o ódio do presidente pela esquerda. Ele passa a apoiar o Exército e segue carreira militar, o que acabou induzindo sua entrada na política, candidatando-se a vereador pelo Rio para defender a melhoria dos salários dos militares.
Lula começa a trabalhar desde criança para sustentar a família. Aos 8 anos foi ambulante, aos 9 foi engraxate e aos 14 conseguiu emprego em uma metalúrgica. Fez o curso técnico de torneiro mecânico no Sebrae e trabalhou nas montadoras do ABC Paulista, região mais industrializada do País durante o governo Juscelino Kubitschek. Com um talento nato, acabou entrando para a política sindical e depois fundou o Partido dos Trabalhadores (PT).
Ao longo de sua trajetória política, Lula passou de uma esquerda radical para uma esquerda moderada. Um negociador, que sabe a importância do diálogo e de juntar pessoas para garantir a governabilidade. Bolsonaro foi se dirigindo à extrema direita, defendendo pautas morais e de costume, que acabou tendo mais aderência entre a população conservadora do que a discussão sócio econômica.
Diante de posicionamentos tão diversos, cabe ao eleitor decidir quem teria melhores condições de comandar um País com uma população de 212 milhões de habitantes, que ainda está saindo da crise da covid-19, que tem 33,1 milhões de famintos, que precisa enfrentar o desemprego, a queda na renda, a alta dos juros, a disparada da inflação, a crise fiscal e um cenário internacional adverso.
Por tudo isso é preciso calcular bem o voto, sem fanatismo de torcidas. Isso, deixamos para a Copa do Mundo do Catar, em novembro, quando estaremos todos do mesmo lado do campo e os adversários serão os outros.