A Suíça decidirá no próximo domingo (13) sobre o fim dos experimentos com animais e humanos, uma proposta radical que gera forte rejeição em um país com uma indústria farmacêutica muito poderosa.
A iniciativa popular foi apresentada pela associação Sentience, com sede em Basileia (norte), e apela a que os primatas não humanos tenham direito à vida e à integridade física e mental, para "se defenderem das intervenções nas suas vidas".
Se o 'sim' vencer - algo que as pesquisas descartam - "a Suíça se tornaria o único país com tal proibição", disse o presidente do grupo de lobby das universidades suíças, Yves Flükiger.
De acordo com a associação Sentience, os primatas "se caracterizam por seu grande cérebro, complexas estruturas sociais e grande capacidade de sofrer física e psicologicamente".
O Tribunal Federal Suíço julgou em 2020 que a iniciativa era válida, porque não só pede que os direitos fundamentais aplicáveis aos humanos se apliquem também aos animais, "mas exige a introdução de direitos específicos para os primatas não humanos".
Mas o tribunal considerou que o texto se aplicaria apenas "a órgãos cantonais e comunais" e não diretamente a pessoas físicas.
A proposta visa proibir experimentos com animais e humanos, bem como a importação de medicamentos obtidos por esses meios.
"Experiências com animais devem ser consideradas crime", explicou à AFP Renato Werndli, médico que lançou a iniciativa, que é contestada por todos os partidos.
Ratos e camundongos
Segundo o governo, tal proibição teria "graves consequências para a saúde" e repercussões na economia, já que os setores químico e farmacêutico respondem por muito das exportações da Suíça.
Interpharma, o grupo de lobby farmacêutico, alertou que, se o texto for adiante, "as instituições e empresas afetadas serão obrigadas a realocar suas atividades" e levá-las "para o exterior".
Na Suíça, no início dos anos 1980, cerca de 2 milhões de animais eram usados anualmente para fins científicos. Este número é atualmente de cerca de 560 mil.
Patrycia Nowak-Slivwinska, diretora do laboratório de farmacologia molecular da Universidade de Genebra, explica que "com o modelo 'in vitro', tentamos encontrar candidatos promissores". Apenas estes últimos são testados em animais, observa.
Para a especialista, é impossível parar completamente de recorrer a experimentos com animais e ensaios clínicos. Por esse motivo, a Faculdade de Medicina de Genebra abriga em seus porões cerca de 25 mil animais, principalmente ratos e camundongos.
Com eles, Doron Merkler investiga um tratamento contra uma forma de esclerose múltipla, algo que, diz, não poderia fazer sem os camundongos nos quais injeta células modificadas para observar os efeitos da doença no sistema nervoso.
Experimentos regulamentados realizados por especialistas treinados para detectar quando um animal não está bem.
"Se você não pode aplicar nenhum cuidado veterinário ao animal, pode decidir, juntamente com o pesquisador, sacrificá-lo", disse à AFP Pierre Bonnaventure, chefe do centro de animais da Faculdade de Medicina.
Esta votação é "mais uma declaração de intenções para garantir que os primatas vivam em melhores condições", disse à AFP Pedro Pozas, diretor na Espanha do "Great Ape Project", um movimento internacional que exige um conjunto de direitos para os primatas.
"Tentamos quebrar a barreira do discurso que diz que todos os animais não humanos não são pessoas, mas bens", aponta Steven Wise, advogado americano especializado em direitos animais, que luta há anos em seu país para que os chimpanzés sejam reconhecido como humanos.
Os suíços rejeitaram três iniciativas sobre esta questão, em 1985 (70% votaram contra), 1992 (56%) e 1993 (72%). Espera-se que o mesmo aconteça desta vez, mas resta saber se a rejeição será tão grande, em uma sociedade em que o bem-estar animal se tornou incontornável.