Com Estadão Conteúdo
A Polícia Civil cumpriu, na tarde desta quarta-feira (20), um mandado de busca e apreensão em uma mansão degradada em Higienópolis, bairro nobre de São Paulo.
O objetivo foi averiguar o possível abandono de incapaz da moradora, Margarida Bonetti, de 63 anos, e outras denúncias de irregularidades na residência.
A história de Margarida Bonetti e sua "casa abandonada" estão repercutindo por causa do podcast "A Mulher da Casa Abandonada", da Folha de S.Paulo, apresentado e escrito pelo jornalista Chico Felitti.
Conforme o podcast, Margarida Bonetti é suspeita de manter uma faxineira brasileira em trabalho análogo à escravidão por cerca de 20 anos nos Estados Unidos. Uma investigação do FBI indicou que a vítima não ganhava salário e era agredida.
Margarida e o marido, o engenheiro Renê Bonetti, se mudaram para o país norte-americano, levando a empregada doméstica, no final da década de 1970.
Renê foi condenado pelo crime no começo dos anos 2000, cumpriu pena e foi solto, mas Margarida retornou ao Brasil, fugindo da Justiça norte-americana.
"É uma história que dá várias cambalhotas. Comecei achando que seria um perfil delicado de uma pessoa marginalizada pela sociedade, uma mulher vítima de misoginia, mas acabei me deparando com uma história de crime e de crueldade como eu nunca havia investigado", diz Felitti.
Por que a polícia entrou na "casa abandonada"?
A Secretaria de Segurança Pública informou que policiais civis do 4º Distrito Policial (Consolação) cumpriram um mandado de busca e apreensão para averiguação de crime de abandono de incapaz na tarde desta quarta na casa, que fica na Rua Piauí. "Diligências prosseguem visando ao esclarecimento dos fatos", informou a pasta.
Uma das primeiras a entrar na casa na ação desta quarta, a delegada de Polícia Assistente da 1ª Delegacia Seccional Centro Vanesa Guimarães explicou ao Estadão que os agentes de polícia chegaram a ir até a casa de Margarida Bonetti na semana passada. Porém, Margarida não autorizou a entrada. "A ordem judicial foi concedida e hoje nós fomos cumprir."
Ao chegar no local, por volta de 15h, a delegada explica que a mulher foi "muito resistente" com os policiais e não queria deixar que o mandado fosse cumprido.
"Em um primeiro momento, por ser idosa, respeitamos essa condição", diz Vanesa. "Mas ela começou a argumentar que não ia abrir e começou a falar frases desconexas."
A delegada conta que os policiais, então, começaram a enfatizar que se tratava de um mandado judicial e que teriam de entrar na casa para apurar a situação.
"Quando viu que não tinha jeito, ela autorizou minha entrada e de uma escrivã de polícia que estava comigo, por sermos mulheres. Entramos pela janela da quarta dela", relata a delegada. "Tinha muita coisa na casa, um odor insuportável."
Após esse momento inicial, Vanesa conta ter liberado a entrada de equipes de perícia da Polícia Civil e da Prefeitura de São Paulo para o cumprimento do mandado.
"Dentro do porão, foi encontrado um cachorrinho com indícios de maus-tratos, que não estava nem conseguindo andar. Ele foi resgatado por uma ONG", disse ela, relatando que o animal tinha dificuldade de locomoção
Por conta da repercussão do caso, a apresentadora de TV Luisa Mell participou da ação junto à polícia e transmitiu nas redes sociais. Dezenas de pessoas, além disso, se aglomeraram na frente da residência para acompanhar a incursão da polícia. O imóvel de Margarida Bonetti teve de ser isolado pelos agentes.
"Alguns policiais seguem por lá para garantir a segurança dela. Tem muita gente, então acabou criando um certo tumulto", contou Vanesa. "A gente deixou o interior da casa e equipes de Saúde e Assistência ficaram conversando com ela, para ver se tem condições dela ficar na casa. O objetivo é apurar se há indícios de abandono de incapaz da família em relação a ela, mas isso são os médicos que vão dizer."
Durante a ação, a delegada conta ainda que os policiais averiguaram outros cômodos da casa abandonada, mas não encontraram irregularidades aparentes.
Segundo ela, havia relatos de que Margarida Bonetti mantinha gatos de estimação em condições insalubres e de que a moradora desviaria energia elétrica de prédios vizinhos.
No entanto, nenhuma dessas denúncias se concretizou. "Hoje, até uma equipe da Enel foi até o local para acompanhar a situação, mas verificaram que não havia "gato" (desvio de energia elétrica)", disse Vanesa.
"As contas são todas pagas e não há nenhum gato de energia e de água. O que não feito era a leitura do padrão de luz desde 2010. Agora conseguiram efetuar a leitura para fazer o cálculo correto."