A fala, a voz, o desejo. Pode ser uma frase, um sorriso, não importa. Todo detalhe faz diferença. Foi assim para Tatiane quando viu a foto de Ana Beatriz. “É a minha filha”, ela sentiu. Tatiane diz que o sorriso dela era especial, não tem muito como explicar. Havia 4 anos, Ana Beatriz esperava por esse encontro. Estava desde os 3 anos em um abrigo de Petrolina, no Sertão de Pernambuco, sem nunca ter tido a chance de ser adotada. Foi a foto da menina no Facebook do Projeto Família, do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE), que mudou o rumo dessa história. Em São Paulo, a enfermeira Tatiane Almeida, 38 anos, viu a imagem na internet e teve certeza que sua busca tinha chegado ao fim. Hoje, Dia Nacional da Adoção, o encontro de mãe e filha mostra que a decisão de dar um rosto a quem precisa ser visto tem dado certo.
O maior trunfo do Projeto Família se chama protagonismo. A ideia é dar visibilidade às crianças e jovens que sonham com a adoção e, dessa forma, assegurar que sejam, de fato, sujeitos de direito. Por expor a imagem de meninos e meninas, o projeto enfrentou críticas, mas, em seis meses nas redes sociais, já ajudou a realizar sonhos. Pelo menos sete crianças, que tiveram suas fotos divulgadas no Facebook do programa, já encontraram um lar. E todas com um perfil que costuma ser difícil de ser adotado.
Vítima de violência doméstica, Ana Beatriz apresentava sequelas motoras, na fala e cognitivas. Dificuldades que, em nada, reduziram a certeza de Tatiane quando viu a foto da menina. “Quando a gente tem um filho, não importa o estado de saúde. O que importa é o amor que guardamos para ele”, diz Tatiane, que é casada com a técnica de Enfermagem Lucy Castro. Ela diz que o programa é muito importante porque aproxima a criança de seus possíveis pais. “A gente vê a foto, o vídeo e se identifica. Não são apenas iniciais. Se a criança fica escondida no abrigo, perde a chance de encontrar sua família.”
Para a juíza Hélia Viegas, esse é o argumento mais forte para o sucesso do Projeto Família. Secretária-executiva da Comissão Estadual Judiciária de Adoção (Ceja), responsável pela iniciativa, a magistrada afirma que é preciso mostrar que as crianças têm rostos, carregam uma história de vida. “Apesar de parecer uma violação do direito de preservação da imagem, o objetivo é justamente o contrário. É garantir o direito maior da criança a ter uma convivência familiar.”
No fim do ano passado, o projeto ganhou um reforço de peso. O Conselho da Magistratura, que reúne os desembargadores do TJPE, aprovou o programa por unanimidade. Era o respaldo legal que faltava.