Um punhado de dedicação, um toque de disciplina, conhecimento a gosto e uma dose enorme de amor. Afinal, qual a receita perfeita para formar um bom chefe de cozinha? Há cinco meses, o projeto Açúcar em Todos os Sentidos descobriu um ingrediente que promete deixar as receitas muito mais saborosas: a adição de um cromossomo 21 extra na mistura. A iniciativa já mostrou para cerca de 20 jovens com síndrome de Down que cozinhar é para todos.
A história começou há 10 anos, quando a professora de gastronomia Nina Burkhardt teve a ideia de ensinar confeitaria para portadores de deficiência visual. “Projetei tudo na minha cabeça, mas a instituição onde eu ensinava não oferecia o suporte necessário”, conta. O sonho se tornou realidade ano passado, quando já estava trabalhando na Faculdade Boa Viagem (FBV), no Ipsep, Zona Sul do Recife. “Procurei o Instituto de Cegos para uma orientação. Foi uma emoção muito grande quando me disseram que era possível”, lembra.
Durante seis semanas, seis deficientes visuais aprenderam a preparar e confeitar bolos, a partir de maquetes com o passo a passo do trabalho. “Eles foram espetaculares. Alguns saíram prontos para trabalhar em uma padaria”, elogia Nina.
Após a primeira experiência, a professora buscou novos desafios. Em parceria com o grupo Down+, uma turma de 12 alunos portadores de síndrome de Down foi formada. O primeiro módulo, que começou no início do ano letivo, ensinou técnicas de confeitaria. O interesse foi tanto que uma nova turma foi criada. Hoje, oito jovens participam da oficina de doces e salgados, junto com os estudantes do curso de gastronomia do primeiro período da FBV. Os certificados serão entregues na próxima terça-feira.
Miguel de Sousa Cabral, de 20 anos, gostou tanto da rotina entre panelas, que quer se tornar cozinheiro profissional. “Meu ídolo é o chefe Wellington (da TV Jornal), assisto ele todos os dias. O segredo de cozinhar é amor e carinho”, afirma. Rafaela Moura, 28, mudou as concepções que tinha a respeito de suas limitações. “Eu achava que não era capaz, mas agora sei que sou.”
Nina não duvida nem por um instante do potencial dos alunos. “Não escolho nenhuma receita mais fácil, porque sei que eles conseguem fazer qualquer coisa. A única diferença está no ritmo do aprendizado. Os outros alunos ajudam, mas não fazem nada no lugar deles.” Estudante do primeiro período de gastronomia, Vitória Rodrigues, 19 anos, aprova a inclusão dos colegas especiais. “Eles são maravilhosos, muito carinhosos. Ganho uns 50 abraços por dia. Todos são adultos e independentes e têm muito a ensinar pra gente.”
Quem convive diariamente com os jovens, já consegue notar a diferença no comportamento. “Meu filho pede para cozinhar em casa. Sinto ele muito mais livre depois desta interação com os colegas”, conta Josineide Leandro, mãe de um dos alunos. O curso é gratuito e a próxima turma a frequentar a cozinha de Nina será formada por deficientes auditivos.