Uma cidade sitiada, uma polícia acuada e uma população inteira em pânico, refém em suas próprias casas, assustada com quase uma hora e meia de tiroteio ininterrupto. Assim foi a madrugada de terça-feira no município de Surubim, cidade-polo do Agreste Setentrional, de comércio farto e detentora do título de capital pernambucana da vaquejada, distante 119 quilômetros do Recife. Em mais uma ação estrategicamente planejada, aproximadamente 50 homens fortemente armados e encapuzados, usando dez veículos e algumas motocicletas, cercaram a cidade e explodiram os cofres de quatro dos cinco bancos instalados no local. Não buscavam mais os caixas-eletrônicos, alvo preferido das quadrilhas de assaltantes até então. Queriam os cofres das agências bancárias. Incendiaram dois veículos, trancaram a Polícia Militar em seu próprio batalhão e fizeram pelo menos seis cidadãos reféns, um deles ferido por um golpe de fuzil nas nádegas. Depois, fugiram sem dificuldade, com uma quantia em dinheiro não-revelada, deixando para trás um rastro de destruição e medo, na direção do Estado da Paraíba, distante a pouco mais de dez quilômetros.
Foi desesperador. A gente não sabia o que fazer. Ficamos trancados dentro de casa, escondidos como podíamos. Foi a primeira vez que Surubim sofre um crime nessas proporções. Humilharam a polícia", diz o morador Carlos Henrique da
A ação meticulosamente planejada pelos homens armados com fuzis 762 e 556, além de metralhadoras .50 (aquelas utilizada sobre um tripé), começou à 0h30. O grupo entrou na cidade e rapidamente se dividiu para bairros e locais estratégicos do município. O objetivo era um só: assustar a população para que ficasse trancada em casa e impedir qualquer possível reação da polícia. A primeira ação foi contra a Polícia Militar. Parte da quadrilha, utilizando três veículos, encurralou os sete policiais que estavam no 22º Batalhão, localizado no bairro de Cabaceiras. Destruíram o portão da unidade com uma caminhonete Ranger e, depois de incendiá-la, iniciaram uma troca de tiros com os PMs para impedi-los de sair da unidade. Enquanto isso, outro grupo espalhava o terror na Rua João Batista, localizada no Centro e conhecida como a rua dos bancos porque nela estão instaladas, lado a lado, as agências do Bradesco, Santander, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal e Banco do Nordeste, este último o único que não foi alvo dos criminosos.
Enquanto explosivos eram instalados, simultaneamente, nos cofres dos bancos, parte do grupo atirava sem parar em todas as direções e para o alto. Em alguns prédios localizados em frente às agências era possível identificar perfurações de fuzil no quinto pavimento. “Foi nesse momento em que fizeram os reféns. Pegaram pelo menos seis pessoas que bebiam na região e começaram a utilizá-las como escudo para que a polícia não agisse”, contou o subcomandante do 22º BPM, major Emanoel Soares. Um dos reféns foi Alanderson Pedro da Silva, de 27 anos, morador que, alcoolizado, se negou a entregar a chave do carro aos assaltantes. Por isso, foi agredido com um golpe de fuzil nas nádegas. Devido à violência do ferimento, depois que foi liberado pelos assaltantes teve que ser transferido para o Hospital Otávio de Freitas (HOF), na Zona Oeste do Recife, para avaliação de uma possível cirurgia reparadora.
Em suas casas, as pessoas entraram em pânico com o barulho ensurdecedor dos tiros. A duração e a intensidade do tiroteio foram tantas que os tiros chegaram a moradores residentes a nove quilômetros do Centro. “Foi desesperador. A gente não sabia o que fazer. Ficamos trancados dentro de casa, escondidos como podíamos. Foi a primeira vez que Surubim sofreu uma explosão de banco e um crime nessas proporções. Humilharam a polícia e agora não sabemos como será daqui para frente. Pela facilidade que tiveram para ficar mais de uma hora explodindo os bancos, sem reação dos policiais, acredito que vão voltar”, previu o comerciante Carlos Henrique da Silva, que mora a poucas quadras da rua dos bancos. “Foi mais de uma hora de tiros. O barulho foi tanto que ouvi da minha casa, distante nove quilômetros do Centro. Quando ouvi a confusão, já imaginei que era assalto aos bancos. Depois, quando sai de casa, furei os quatro pneus da Toyota com os grampos que os ladrões espalharam pela estrada”, contou o agricultor Oscar Martins. Os grampos foram jogados ao longo da rodovia PE-090, que dá acesso a Surubim, numa extensão de mais de dois quilômetros.
A polícia não foi acuada pela quadrilha fortemente preparada e armada que dominou a cidade de Surubim por quase 1h30 na madrugada desta terça-feira. A reação da Polícia Militar não aconteceu por estratégia. Não foi falta de efetivo ou armamento. Foi cuidado em preservar a vida dos reféns feitos pelos assaltantes de bancos. Esses são os argumentos apresentados pelo subcomandante do 22º Batalhão da PM, major Emanoel Soares, a quem coube a responsabilidade de dar algum tipo de satisfação à sociedade e à imprensa diante do cenário de pânico criado no município. Para ele, o fato de o município ter cinco agências bancárias numa mesma rua, praticamente lado a lado, foi o grande atrativo para a investida.
“Não reagimos à altura dos assaltantes porque eles estavam com reféns. A nossa prioridade era a vida das pessoas. Não podíamos correr o risco de ver uma daquelas pessoas ser morta durante um confronto. Pelos relatos que temos, os assaltantes eram violentos e chegaram a fugir levando alguns dos reféns. Além dos homens que estavam no quartel, tínhamos três equipes fazendo a ronda na cidade e que foram para o local, mas não entraram em confronto para evitar mortes”, afirmou Emanoel Soares. Embora a Secretaria de Defesa Social (SDS) tenha se negado a informar qual a quantidade de homens, armamento e de veículos existente em Surubim, para o major o poder de fogo da polícia era suficiente para enfrentar a quadrilha se assim quisessem.