Denúncia de negligência no caso Remís será levada à SDS

Amigos da universitária garantiram que ela foi assassinada sem nunca ter recebido a medida protetiva solicitada em novembro, após prestar queixa contra o ex-namorado
Da editoria de Cidades
Publicado em 26/12/2017 às 20:17
Amigos da universitária garantiram que ela foi assassinada sem nunca ter recebido a medida protetiva solicitada em novembro, após prestar queixa contra o ex-namorado Foto: Foto: Ashlley Melo/JC Imagem


Como prometido, os amigos da estudante de pedagogia da UFPE Remís Carla Costa, 24 anos, asfixiada e enterrada pelo ex-namorado, o ajudante de pedreiro Paulo César de Oliveira, 25, voltaram a denunciar a negligência da Polícia Civil em relação ao caso. Disseram, mais uma vez, que Remís Carla foi morta pelo mesmo homem que havia denunciado, exatamente um mês antes de seu corpo ser encontrado enterrado e já em avançado estado de decomposição. Um grupo esteve na 1º Delegacia da Mulher, em Santo Amaro, área central do Recife, e garantiu que a universitária foi assassinada sem nunca ter recebido a medida protetiva solicitada no dia 23/11, quando prestou queixa de agressão contra o ex-namorado naquela unidade. Diante da situação, os amigos de Remís prometem levar, em breve, o que chamam de omissão à Corregedoria da Secretaria de Defesa Social (SDS).

A Polícia Civil nega qualquer negligência e garante que a medida protetiva foi solicitada pela 1ª Delegacia da Mulher no prazo legal de 48 horas e deferida pela Justiça na sequência. E que, pelas informações repassadas pelo Judiciário, a universitária teria sido notificada no dia 6 de dezembro. “Remís não foi notificada dessa medida. Caso tivesse sido, teria me dito. Estive com ela na delegacia quando prestou a queixa contra Paulo César e por diversas vezes perguntei sobre a medida e ela dizia não saber de nada”, garante Jéssika Alves, amiga próxima de Remís Carla. Medidas protetivas são previstas na Lei Maria da Penha, devem ser solicitadas pela polícia, cabendo à Justiça atender ou não à solicitação. Tudo isso no prazo de 48 horas depois da queixa prestada.

Para aumentar ainda mais a polêmica, a Justiça silenciou sobre o episódio. Por nota, o Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) informou que o processo de Remís Carla tramita em segredo de Justiça na 1ª Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Capital e, por isso, nada pode ser dito. Nem mesmo se a notificação a Remís e a Paulo César foram feitas. “Se a atenção que Remís pediu ao Estado tivesse sido dada desde o começo essa história poderia ter tido um desfecho completamente diferente. Acharam o corpo da minha amiga exatamente um mês depois de ela pedir proteção à polícia, ao Estado. Desde o início do desaparecimento colocamos para o delegado do DHPP Elder Tavares que um vasto boletim de ocorrência tinha sido prestado na Delegacia da Mulher e ele ignorou. Houve negligência do início ao fim. Negligenciaram a denúncia de Remís e as que fizemos no DHPP. É tanto que o delegado chegou a afirmar que Paulo César não era suspeito do crime”, criticou Jéssika Alves.

Para aumentar ainda mais a polêmica, a Justiça silenciou sobre o episódio. Por nota, o TJPE informou que o processo de Remís Carla tramita em segredo de Justiça e, por isso, nada pode ser dito

Os amigos também fizeram críticas ao atendimento recebido na 1ª Delegacia da Mulher. “Estivemos na delegacia no dia 23/11, um dia depois de Remís ter sido agredida por Paulo César, e desde o começo o atendimento foi horrível, totalmente negligenciado. O tempo inteiro os policiais a incentivaram a desistir da denúncia fazendo perguntas sobre a intimidade dela, que não condiziam com o que o objetivo da queixa. Em nenhum momento ela foi acolhida nem orientada com clareza sobre os procedimentos futuros. Fomos para o IML e lá chegaram a perguntar se a mancha no braço que Remís tinha da agressão não teria sido feita com uma caneta. Imaginem? E ela só queria a proteção da polícia, do Estado”, lamentou.

Também não faltaram críticas ao chefe da Polícia Civil, Joselito do Amaral. “Quando ele afirmou que Remís foi ao encontro de Paulo César transferiu a responsabilidade para a vítima. Não, ela não tem culpa. Ela foi assassinada pelo homem que denunciou e que a polícia nada fez para prender. O delegado Elder Tavares sequer considerou Paulo César como principal suspeito do crime, apesar de nossas denúncias e apelos. Por isso a instituição tem que ser responsabilizada por todo o processo. Por isso vamos à Corregedoria. Porque são mentirosas as declarações de que Remís foi notificada da medida protetiva”, afirmou outra amiga de Remís Carla e integrante do Movimento Feminino Popular, Tainá Peixoto.

LOCALIZAÇÃO DO CORPO

Além do descaso com a queixa-crime de agressão prestada por Remís Carla, os amigos da universitária denunciaram a falta de empenho da Polícia Civil para investigar o então desaparecimento da jovem e usaram a localização do corpo como argumento. Contestaram a informação divulgada pela polícia pernambucana de que o corpo da estudante de pedagogia estava enterrado a 400 metros da casa do ex-namorado, garantido que o local fica a apenas 15 metros da residência de Paulo César, no Loteamento Nova Morada, na Caxangá, bairro da Zona Oeste. E mais: que a a jovem só foi encontrada porque moradores descobriram e denunciaram a exata localização à polícia.

“É mais uma prova de que o caso foi tratado com descaso desde o começo. O corpo de Remís poderia ter sido achado ainda na quarta-feira (20/12), quando os primeiros depoimentos foram tomados e um dia depois de a queixa do desaparecimento ter sido feita. Se os cães levados pelos policiais para averiguar a casa de Paulo César tivessem sido usados de fato ela teria sido encontrada porque estava bem perto. Mas nada disso aconteceu”, criticou Tainá Peixoto, amiga de Remís Carla.

O corpo da universitária só foi localizado, segundo afirmam, porque o ex-namorado fingiu estar queimando lixo no local e um morador viu, desconfiando na hora. Essa pessoa teria informado a um policial reformado, que avisou ao Grupo de Operações Especiais (GOE). “Caso contrário, era capaz de Remís estar enterrada até agora e o assassino solto. Pedimos, desde o começo, que a polícia quebrasse o sigilo do celular dele, rastreasse o uso do VEM e buscasse câmeras na comunidade. Mas nada foi feito. Ao contrário, Paulo César fez acusações contra os amigos e o ex-namorado de Remís e a polícia começou a acreditar”, acrescentou a jovem.

DEFESA

Quem fez a defesa das ações da Polícia Civil foi a delegada Julieta Japiassu, gestora interina da 1ª Delegacia da Mulher. Ela rebateu a acusação de negligência em relação ao caso. “A polícia agiu imediatamente em todos os crimes, tanto no desaparecimento da vítima quanto em relação à queixa prestada na Delegacia da Mulher. Não houve negligência”, garantiu. Segundo a delegada, as medidas protetivas solicitadas por Remís Carla foram encaminhadas à Justiça imediatamente após a queixa ser prestada. “E a informação que nós temos é que todas foram deferidas. A vítima foi notificada no dia 6/12”, disse. Quando questionada sobre a notificação de Paulo César, entretanto, a delegada afirmou que a resposta deveria ser dada pelo Judiciário.

Em relação à denúncia de que a vítima foi mal atendida na Delegacia da Mulher, Julieta Japiassu disse que as pessoas que procuram a unidade devem receber um atendimento qualificado. “Nós vamos apurar o que houve”, afirmou, adiantando que Paulo César será indiciado, também, pelos crimes de lesão corporal, ameaça, dano e injúria, denunciados por Remís em novembro.

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