Usuários da rede de urgência e emergência de saúde do Estado já sofrem os efeitos da restrição de serviços. Madrugar, disputar fichas limitadas e guardar a dor para o dia seguinte passou a ser realidade para quem depende das Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) do Grande Recife, uma rede implantada a partir de 2010 e que sofre os efeitos da crise financeira do Estado, agravada no último mês. “Cheguei às 5h10 para conseguir uma ficha. Desde o dia anterior (quinta-feira) que sinto dor, mas tive que esperar pois não há ortopedista de plantão”, contou ontem a artesã Rita de Cássia Correia de Sales, 43 anos, ao buscar pelo segundo dia atendimento na UPA Solano Trindade, em Nova Descoberta, Zona Norte do Recife.
Para suportar os repasses financeiros atrasados e sem correção, as organizações sociais responsáveis pela gerência dos serviços começaram a cortar gastos, ajustando escala médica, demitindo profissionais e passando a ser mais restritivas no horário noturno. As UPAs continuam abertas 24 horas, mas já não é certeza encontrar atendimento para todas as especialidades inicialmente oferecidas. O presidente da Federação dos Hospitais Filantrópicos de Pernambuco, Gil Brasileiro, alega que toda a readequação das escalas está sendo feita em negociação com a Secretaria Estadual de Saúde, diminuindo plantonistas apenas nos horários de menor demanda. Algumas, por exemplo, já tinham limitado até as 22h o horário de ortopedistas. Agora, começam a diminuir a disponibilidade também de clínicos, pediatras e dentistas. O problema é que não se sabe até onde vão os cortes. “Não fizemos mudança na escala ainda. À noite temos três clínicos e dois pediatras, que ficam até às 7h do dia seguinte, além de um ortopedista até às 22h. Uma opção pode ser reduzir os clínicos de três para dois”, explica o superintendente da Santa Casa de Misericórdia, Fernando Costa. A organização responde pela UPA dos Torrões, Zona Oeste do Recife. Há promessa de que o pagamento de julho, das UPAs, comece a sair depois do feriadão de 7 de setembro. Mas se esse clima de incertezas se alongar pelo semestre, o superintendente da Santa Casa prevê dificuldades maiores na prestação do serviço. “Não sei por quanto tempo os funcionários vão suportar os atrasos de salário”, observa.
Nas redes sociais circulam informações sobre redução de serviços em várias unidades da rede terceirizada e da administração direta. Relatam mais de 30 leitos fechados no Hospital Miguel Arraes, 15 no Barão de Lucena e suspensão de atendimento na UPAE de Garanhuns, no Agreste, e na Unidade Coronariana do Agamenon Magalhães, no Recife. O modelo de gestão e o grande volume de recursos empregado na rede terceirizada, no entanto, vem sendo questionado por membros do Conselho Estadual de Saúde. O Sindicato dos Médicos (Simepe), por sua vez, também vê falhas no formato e critica sobretudo os cortes de atendimento pediátrico nas urgências. “É preciso rediscutir esse modelo de UPAs e Upinhas do Recife, além do papel dos hospitais regionais”, afirma Mário Jorge Lobo, presidente do Simepe. Neste fim de semana a entidade deve lançar nota sobre a crise na rede de saúde e a falta de recursos estaduais e federais no SUS.
ESTADO
A Secretaria Estadual de Saúde garante que não irá fechar serviços, “mesmo diante das dificuldades por que passa todo o País”. Sem detalhar o que de fato está acontecendo em cada uma das 15 Unidades de Pronto Atendimento, 13 delas no Grande Recife, informa que “vem realizando estudos e dialogando com as Organizações Sociais para readequar escalas de plantões de acordo com a demanda da população e o desenho da rede de assistência”. Só adianta que “algumas unidades estão reduzido serviços em horários onde não havia demanda suficiente para justificar a manutenção e custeio da equipe, principalmente em plantões noturnos.” E que a restrição só ocorre “com a garantia de serviços que absorvam eventuais necessidades”.
Defende a construção das UPAs como fundamental e afirma que o custo médio por produção nas unidades administradas por organização social chega a ser 36% menor que nas de administração direta. Esclarece que a visita recente do governador Paulo Câmara (PSB) ao Ministério da Saúde foi para solicitar apoio ao custeio das UPAEs já em funcionamento. Sobre as denúncias que circulam nas redes sociais, informa que a UTI 2 do Hospital Getúlio Vargas está fechada para reforma e recuperação do espaço, a UTI Coronariana do Agamenon Magalhães está funcionando com 12 leitos e que o Barão de Lucena teve leitos reduzidos temporariamente por dificuldades na contratação de pessoal. Sobre o fechamento temporário de serviços no Hospital Miguel Arraes, no Maria Lucinda e na UPAE de Garanhuns, a SES alega esforços para regularizar repasses financeiros.