Merlot está consagrada no Sul

A uva rende vinhos macios e reconhecidos com selo de Denominação do Origem no Vale dos Vinhedos
Bruno Albertim
Publicado em 11/10/2013 às 7:00
A uva rende vinhos macios e reconhecidos com selo de Denominação do Origem no Vale dos Vinhedos Foto: Foto: Divulgação


BENTO GONÇALVES – Sua vinícola foi criada há apenas cinco anos. Mas Márcio Brandelli, dono da prestigiosa Almaúnica, não pode ser considerado um aventureiro em matéria de vinhos. Quarta geração de uma família de imigrantes italianos que chegou, com salames e uvas, à Serra Gaúcha ainda em 1887, o enólogo já acumula uma série de prêmios e uma certeza: outrora obrigatória, sinônimo de vinho tinto, a cabernet sauvignon perde cada vez mais prestígio. "É uma uva que jamais usarei para fazer um vinho varietal (com um único tipo de uva). Serve apenas para compor o corte (com outras uvas) de alguns vinhos", diz ele, informando que a varietal de origem francesa, a mais popular do mundo, nem sempre se adequa bem ao terroir do Vale dos Vinhedos. "Se chove fora da época, ela perde açúcar, concentração e apodrece"

Se a cabernet vai assumindo papel secundário (embora, não radicalizemos, ainda apresente grandes vinhos), a merlot já não é uma aposta. A única uva tinta hoje passível de compor um vinho varietal com a Denominação de Origem do Vale dos Vinhedos, a cepa de origem bordalesa, menos tânica e mais macia, é a zona de conforto no trabalho dos enólogos do Vale dos Vinhedos. Resulta em vinhos redondos, honestos, de várias faixas de preço, pouco carvalho e muita concentração de fruta.



Tanto que, depois do Lote 43, o vinho de maior prestígio da gigante Miolo, líder nacional com produção anual de 570 mil garrafas, é um de merlot. Prova de sua qualidade e já episódio obrigatório na história do vinho no Brasil, o Miolo Merlot Terroir venceu, em 2010, um painel em Londres com 40 amostras da variedade de todo o mundo com preço máximo (na época) de R$ 45.

"A merlot se dá bem no Vale dos Vinhedos porque amadurece mais cedo e corre menos riscos associados às chuvas no final do período de maturação", diz Dirceu Vianna Junior, único dono de um título de Master of Wine no Brasil. Ele conduziu, naquele ano, a prova. "Há mais de 20 anos que a merlot está presente no Vale dos Vinhedos, o que nos dá segurança", comenta o empresário e enólogo Adriano Miolo. Hoje, nos sites e lojas virtuais, o Merlot Terroir Miolo é vendido a R$ 91, o que o situa no patamar das bebidas de consumo especial.

A explicação para a qualidade tem a ver com a conjunção de clima e solo que, grosso modo, recebe o nome de terroir. Na Serra Gaúcha, costuma chover entre janeiro e fevereiro, véspera de vindima. Com pouca drenagem, o solo encharca as parreiras. "Como tem um ciclo mais curto, a merlot pode atingir a maturidade e ser colhida antes das chuvas", diz o enólogo Mário Brandelli. Seu Almaúnica Merlot, vendido a cerca de R$ 40 na vinícola, é uma das melhores expressões que a merlot já conseguiu no País. Muito concentrado, fruta em compota, ameixa e algo de couro nos aromas, é elegante e concentrado. Um vinho marcante.

A merlot também oferece resultados de grandeza exemplar em pequenos terroirs próximos ao Vale dos Vinhedos. No município de Flores da Cunha, vizinho a Bento Gonçalves, está a vinícola Luiz Argenta, deliberadamente dedicada à produção de vinhos de luxo. Fornecedora do Palácio do Planalto e do vinho com o qual a presidenta Dilma presenteou o roqueiro Bono Vox, a vinícola batiza com seu nome os vinhos mais bem elaborados (os mais jovens pertencem à linha L.A. Jovem).

Feito apenas nas safras especiais, o Luiz Argenta Merlot (R$ 74) tem grande volume na boca, bom corpo e, como de costume, aromas intensos de frutas e outros, como especiarias, derivados do contato de 12 meses em barrica. O merlot jovem (R$ 49) é ricamente mais frutado.

Nem só de vinhos de luxo vive a merlot na Serra Gaúcha. Também no Vale dos Vinhedos, a familiar vinícola Larentis faz um incrível merlot de apenas R$ 23 (preço de saída). Aroma, frutas vermelhas, especiarias sutis, generoso no paladar. "Temos vinhedos com merlot de 25 anos", diz o jovem enólogo André Larentis, herdeiro e renovador da tradição de sua família. Mais um a provar que, se o vinho é gaúcho – e tem merlot no conteúdo – o risco de erro na taça é mínimo.

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